O ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou rito abreviado para julgar a constitucionalidade da lei goiana antiaborto. A Corte analisa os pedidos do Partido Socialismo e Liberdade (PSOL) e da Associação Brasileira de Mulheres de Carreira Jurídica (ABMCJ) para declarar a inconstitucionalidade da campanha estadual de “conscientização” antiaborto. Após a decisão do ministro, a Assembleia Legislativa e o governo de Goiás devem se pronunciar num prazo de até 10 dias.
A Lei estadual 22.537 foi promulgada em janeiro 2024 e institui a Campanha de Conscientização contra o Aborto em Goiás. O objetivo do dispositivo é oferecer diretrizes para uma série de atividades antiaborto, como o fornecimento de ultrassom para que gestantes ouçam os batimentos cardíacos do feto e palestras sobre as implicações penais do aborto ilegal.
Sob a relatoria do ministro Fachin, o Supremo deve julgar a manutenção do dispositivo por meio da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 7597 e 7594, ajuizadas, respectivamente, pelo PSOL e pela ABMCJ. Os pedidos alegam que a lei goiana desrespeita o aborto legal, nos casos de anencefalia fetal; gravidez que coloca em risco a vida da gestante; e gravidez que resulta de estupro.
Segundo o PSOL, o dispositivo estadual busca dificultar o acesso de pessoas gestantes ao procedimento seguro e as submete a “tortura” mediante a visualização do exame de ultrassonografia. “A visualização de ultrassonografia é absolutamente desnecessária para o acesso ao procedimento. Achados da literatura científica em saúde demonstram que a medida é, inclusive, tomada de decisão das mulheres. Em alguns casos, o único efeito é causar impactos emocionais”, argumenta na petição.
Além disso, o partido defende que a competência do estado para legislar sobre defesa da saúde não o permite restringir direitos definidos em leis federais. “Ainda que se trate de caso de mulher que não se enquadra nas hipóteses de aborto legal, o sistema público de saúde jamais poderia utilizar suposições morais para produzir culpa e sofrimento. Nesses casos, o dever dos serviços de saúde seria acolhê-la, certificar-se de que não se enquadra nas hipóteses legais de aborto e atuar para reduzir danos”, explica.
No mesmo sentido, a ABMCJ afirma que não cabe ao Estado criar políticas públicas que aumentem a vulnerabilidade social e jurídica das pessoas que desejam realizar o aborto legal e seguro. A entidade argumenta que a interrupção segura, nos termos da lei, já sofre resistência de instituições e profissionais da saúde.
A ABMCJ defende que “cabe ao Estado só amparar e acolher a mulher que procura serviços de aborto legal e seguro e não encampar a posição ideológica de quem se opõe a ele, sob pena de negar a condição à mulher de sujeito de direitos e trata-la como ‘coisa’ ou meio à efetivação de ideias ideológicos antiaborto”.
Além da declaração de inconstitucionalidade, as duas ações pedem a concessão de medida cautelar monocrática para suspender a eficácia da lei estadual.
Em nota, a Procuradoria-Geral de Goiás afirmou o seguinte:
“O dispositivo oferece diretrizes gerais para ações informativas acerca do tema, sem interferência em procedimentos médicos atualmente realizados no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS) ou da rede privada, que seguem atos regulamentares editados pelos órgãos e entes dotados de competência regulatória, como Ministério da Saúde e Conselho Federal de Medicina.
O inciso VI do art. 3º, que menciona o fornecimento de exame de ultrassom à gestante, não estabelece a obrigatoriedade de que a gestante seja submetida, nos casos de aborto legal, a qualquer exigência adicional como condição para a realização do procedimento médico.
Dessa forma, não poderão os agentes públicos estaduais impor à gestante quaisquer medidas relacionadas à visualização do feto (antes ou depois do procedimento de interrupção), oitiva de batimentos cardíacos e medidas assemelhadas, sob pena de responsabilização pessoal.
A PGE expediu orientação à SES e à SEDUC sobre a adequada interpretação e aplicação da Lei estadual nº 22.537/2024, bem como prestou esclarecimentos à Defensoria Pública”.