

O tributo sobre a propriedade urbana remonta ao período colonial. Em 1808, com a chegada da Família Real Portuguesa ao Brasil, foi criado o imposto predial, que recebeu a denominação de “Décima Urbana”1.
Os contribuintes eram os proprietários de prédios localizados na Corte, nas cidades, vilas e povoados do litoral do Rio de Janeiro. Na ocasião, a tributação foi utilizada como instrumento de arrecadação da Coroa Real, que procurava aumentar suas receitas.
Em 1881, houve a alteração da nomenclatura do imposto, que passou a ser chamado de Imposto Predial. Dez anos mais tarde, a Constituição Republicana determinou a competência exclusiva dos estados para tributar imóveis rurais e urbanos2.
Apenas em 1934, com a instauração de uma nova Constituição, é que o Imposto Predial passou a ser de competência dos municípios. O Código Tributário Nacional, instituído em 1966, trouxe as disposições sobre o IPTU nos artigos 32, 33 e 34, e reiterou a previsão constitucional de municipalidade do tributo.
A atribuição de competência permaneceu nas Constituições posteriores. A atual Constituição Federal, promulgada em 1988, prevê, em seu artigo 156, inciso I, a competência municipal para instituição de imposto sobre propriedade predial e territorial urbana3.
Assim, cabe a cada município instituir o IPTU por meio de legislação municipal. No município de São Paulo a Lei nº 6.989, de 1966, instituiu a cobrança do IPTU em solo paulistano4.
Como funciona
O fato gerador do IPTU consiste na propriedade, no domínio útil ou na posse de bem imóvel localizado em zona urbana municipal.
A definição da zona urbana se dá em lei municipal. Entretanto, de acordo com o Código Tributário Nacional, para que determinado local possa ser entendido como tal, deverá conter pelo menos dois dos seguintes melhoramentos: (i) meio-fio ou calçamento, com canalização de águas pluviais; (ii) abastecimento de água; (iii) sistema de esgotos sanitários; (iv) rede de iluminação pública; (v) escola primária ou posto de saúde a uma distância máxima de três quilômetros do imóvel considerado.
Os Contribuintes do tributo são: o proprietário do imóvel, o titular do seu domínio útil ou o seu possuidor a qualquer título.
A Base de Cálculo do imposto, ao seu turno, é o valor venal do imóvel. Essa definição se mostra vaga, uma vez que o CTN não estabelece o conceito de valor venal. De forma simplificada, é possível entendê-lo como valor que determinado bem alcançaria (segundo apuração do poder público) para compra e venda à vista, segundo as condições do mercado.
Trata-se, portanto, de uma estimativa que o Poder Público realiza sobre o preço de determinados bens, sendo que cada prefeitura define seus critérios.
Na cidade de São Paulo, por exemplo, a apuração desse montante ocorre de acordo com os dados do imóvel constantes do cadastro da Secretaria da Fazenda5. Alguns dos fatores considerados para a determinação do valor são: a localização do imóvel, a área do terreno, a área construída e a idade da construção. A prefeitura da cidade disponibiliza sítio eletrônico institucional pelo qual há a possibilidade de se consultar o Valor Venal de Referência a partir da inserção do número do IPTU e da data6.
A título de demonstração da amplitude que a expressão permite, em São Carlos, “Capital Nacional daTecnologia”, para a apuração do valor venal do imóvel, além do tamanho do terreno, área construída e localização na Planta Genérica de Valores, a prefeitura ainda adota a qualificação da construção, isto é, o tipo de acabamento da construção7.
Fato é que, uma vez apurado o valor venal do imóvel, o cálculo do IPTU a ser pago pelo contribuinte é realizado pela aplicação das alíquotas definidas em lei municipal. Como o tributo é municipal, cada prefeitura define a alíquota a ser cobrada em sede de legislação municipal.
As legislações municipais costumam diferenciar as alíquotas que deverão ser pagas sobre imóveis construídos e não construídos. No Rio de Janeiro, por exemplo, é cobrada uma alíquota mais alta sobre imóveis não edificados:
IPTU no Rio de Janeiro | |
Tipo de imóvel | Alíquota |
Imóvel edificado residencial | 1% |
Imóvel edificado não residencial | 2,50% |
Imóvel não edificado | 3,00% |
São Paulo também segue o mesmo racional. Em relação aos imóveis não construídos, a disposição do município ainda estabelece uma discriminação baseada na localização do imóvel dentro da zona urbana, que é subdividida em duas regiões principais.
Nesse cenário, a alíquota incidente sobre um imóvel não edificado localizado na 1ª subdivisão da zona urbana é maior do que a alíquota sobre um imóvel localizado na 2ª. Vejamos:
IPTU em São Paulo | |
Tipo de imóvel | Alíquota |
Imóvel edificado | 1,20% |
Imóvel não edificado na 1ª subdivisão da zona urbana |
4,20% |
Imóvel não edificado na 2ª subdivisão da zona urbana |
3,00% |
Imóvel não edificado além do perímetro 2ª subdivisão |
2,40% |
Após a aplicação da alíquota sobre o valor venal do imóvel, chega-se ao montante devido a título de tributação. O valor é cobrado anualmente por meio de boleto e poderá ser pago à vista, no início do ano, ou parcelado ao longo do ano8. No município de São Paulo, por exemplo, o IPTU pode ser dividido em até 10 parcelas, desde que cada parcela seja maior do que R$ 50,009.
Problemas
Uma das dificuldades diz respeito a base de cálculo do IPTU, ou seja, ao valor venal dos imóveis. A Planta Genérica de Valores (PGV) é o suporte para se estabelecer o referido montante. Entretanto, a existência da PGV não é uma obrigação legal imposta aos municípios. Assim, em algumas localidades, ela pode estar desatualizada ou sequer existir10.
A ausência da atualização constante da PGV impede que o valor venal dos imóveis se adeque às mudanças ocorridas nos municípios no decorrer do tempo. No Rio de Janeiro, por exemplo, apenas em 2017, com a promulgação da é que houve a atualização da PGV, que se mantinha a mesma desde 1997. Os valores venais então utilizados para cálculo do IPTU dos imóveis residenciais, representavam, em média, 1/6 do valor real de mercado do imóvel11.
Outro problema é a dificuldade de se elaborar uma Planta que seja integralmente fiel à realidade. A multiplicidade de coeficientes que incidem sobre a determinação quantitativa é um obstáculo para uma avaliação adequada.
A função extrafiscal: o IPTU progressivo
A função social da propriedade é uma garantia prevista no inciso XXIII do Artigo 5º da Constituição Federal de 1988. Em linhas gerais, esse instituto procura garantir que as propriedades atendam não apenas os interesses dos proprietários, como também os interesses da coletividade.
Existem proprietários que mantêm imóveis / terrenos urbanos inertes, isto por diversos motivos, inclusive a espera de uma valorização imobiliária da região para posterior negociação. Nesses casos, por exemplo, o imóvel atende exclusivamente aos interesses privados, descumprindo a função social da propriedade.
Dentro deste cenário é que a Emenda Constitucional 29/2000 instituiu o chamado IPTU progressivo, que auxilia os municípios a desestimularem proprietários que mantêm imóveis subutilizados ou ociosos12.
Ao identificar esses imóveis, o poder local, a exemplo de como feito na cidade de São Paulo, pode notificar os proprietários a apresentarem projetos de destinação da propriedade. Assim, o dono de um determinado terreno sem construção poderá apresentar um projeto de edificação, por exemplo. Caso o proprietário não cumpra a determinação em um ano, tem início a cobrança desse tipo de IPTU, caracterizado pela progressividade da alíquota.
Consideremos um imóvel ocioso cujo valor venal seja de R$ 100.000,00 e cuja alíquota incidente seja de 1%. O valor devido a título de IPTU seria, portanto, de R$ 1.000,00. Entretanto, caso o proprietário seja notificado e não cumpra a função social do imóvel, a alíquota incidente no ano subsequente sofrerá uma progressão e equivalerá a 2%. Assim:
IPTU regular:
1% de R$ 100.000,00 = R$
1.000,00
IPTU progressivo no 1º ano após notificação:
2% de R$ 100.000,00 =
R$ 2.000,00
IPTU progressivo no 2º ano após notificação:
3% de R$ 100.000,00 =
R$ 3.000,00
A progressividade também possui suas limitações: a alíquota máxima é de 15% e só poderá ser aplicada pelo prazo de 5 anos. Caso haja a decorrência do período sem a edificação ou utilização, o Município poderá desapropriar do imóvel.
Isenções
Ainda é possível que determinado imóvel seja isento da tributação de IPTU pelo município em que localizado. Cada município determina suas próprias regras de isenção. Em São Paulo, as agremiações desportivas, as propriedades de entidades religiosas, as garagens coletivas para estacionamento e guarda de automóveis e as sedes de consulados de governos estrangeiros são exemplos de patrimônios que não pagam o tributo.
Já na capital fluminense há isenção aos imóveis residenciais, não residenciais e territoriais que tenham valor venal que não seja superior a: R$58.802,00, R$ 25.660,00 e R$39.558,00, respectivamente.
É fundamental consultar a legislação local para verificar se há e quais são eventuais outras hipóteses que autorizam a isenção, bem como os procedimentos para a comprovação da situação junto ao fisco municipal e manutenção da isenção.
Imunidades
Atendidos os requisitos constitucionais, são imunes do Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU):
- Os imóveis integrantes do patrimônio da União, Estados, Municípios, Distrito Federal, autarquias e fundações instituídas e mantidas pelo Poder Público (CF, artigo 150, VI, a e 2º);
- Os templos de qualquer culto (CF, artigo 150, VI, b);
- Os imóveis integrantes do patrimônio dos partidos políticos, inclusive suas fundações; do patrimônio das entidades sindicais dos trabalhadores; das instituições de educação e assistência social, sem fins lucrativos e atendidos os requisitos da lei (CF, artigo 150, VI, c); e das instituições de Educação e de Assistência
Sobre o tema imunidade, importante conhecer também o teor da Súmula Vinculante do STF nº 52, que estabelece que: “Ainda quando alugado a terceiros, permanece imune ao IPTU o imóvel pertencente a qualquer das entidades referidas pelo art. 150, VI, “c”, da Constituição Federal, desde que o valor dos aluguéis seja aplicado nas atividades para as quais tais entidades foram constituídas.”
Vinculação constitucional do produto da arrecadação municipal com o IPTU
A receita proveniente da arrecadação do IPTU é integralmente destinada ao caixa do Tesouro Municipal, que a utilizará para atender as prioridades locais e cobrir as despesas decorrentes da administração pública.
Tais despesas são previamente definidas no plano orçamentário municipal e o montante arrecadado poderá ser aplicado na construção e manutenção de creches, escolas, postos de saúde, segurança pública e pagamento de salários de funcionários.
Nesse sentido, válido relembrar que a destinação da arrecadação ao caixa do Tesouro Municipal não significa dizer que ela é vinculada a um determinado propósito específico, tal como a órgãos, fundos ou despesas. Isso porque a vinculação da arrecadação de impostos é vedada, nos termos do art. 167, inc. IV, da Constituição Federal de 1988.
Aqui, é importante esclarecer que, embora não a haja a vinculação do IPTU determinada atividade, a Constituição Federal prevê a destinação de, no mínimo, 25% do recolhimento tributário municipal à educação e de 15% à saúde. Dessa forma, os setores mencionados concentram 40% da receita tributária do Município.
Discussões na Justiça
Ao longo dos anos tivemos importantes posicionamentos judiciários acerca do IPTU. Podemos citar alguns exemplos:
STJ:
- Súmula nº 160: “É defeso, ao Município, atualizar o IPTU, mediante decreto, em percentual superior ao índice oficial de correção monetária”. A Súmula em questão determina que é necessária a elaboração de lei municipal para que haja aumento na base de cálculo do tributo (valor venal). Eventual majoração não pode se dar por
- Súmula nº 397: O contribuinte do IPTU é notificado do lançamento pelo envio do carnê ao seu endereço. Firmado o entendimento de que basta a remessa do boleto ao endereço do contribuinte para notificá-lo do lançamento tributário.
- Súmula nº 399: Cabe à legislação municipal estabelecer o sujeito passivo do
- REsp 1641011 / REsp 1658517: início da contagem do prazo de prescrição da cobrança judicial de IPTU. Fixada a tese de que o marco inicial para contagem do prazo de prescrição da cobrança judicial do IPTU é o dia seguinte à data estipulada para o vencimento da cobrança do tributo. O prazo é de 5
STF:
-
- Tema nº 385: Reconhecimento de imunidade tributária recíproca a sociedade de economia mista ocupante de bem público. A discussão tratava da constitucionalidade da cobrança de IPTU sobre a empresa privada arrendatária de imóvel público e exploradora de atividade econômica com fins lucrativos. Entendeu-se pela constitucionalidade da cobrança nesses
- Tema nº 437: Reconhecimento de imunidade tributária recíproca a empresa privada ocupante debem público. A discussão tratava da constitucionalidade da cobrança de IPTU bem imóvel de propriedade da União cedido à empresa privada que explora atividade econômica. Entendeu-se pela constitucionalidade da cobrança nesses
1 http://dspace.bc.uepb.edu.br/jspui/bitstream/123456789/16357/1/PDF%20-%20Clevson%20Coutinho%20Soares.pdf
2 “Art 9º – É da competência exclusiva dos Estados decretar impostos: (…)
º ) sobre Imóveis rurais e urbanos;
º ) sobre transmissão de propriedade;”
3 “Art. 156. Compete aos Municípios instituir impostos sobre: I – propriedade predial e territorial urbana; (…)”
4 https://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/upload/arquivos/secretarias/financas/legislacao/Lei-6989-1966.pdf
5 https://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/fazenda/servicos/iptu/index.php?p=2456
6 https://www3.prefeitura.sp.gov.br/tvm/frm_tvm_consulta_valor.aspx
7 http://www.saocarlos.sp.gov.br/index.php/fazenda-seu-dinheiro/153316-iptu-perguntas-e-respostas.html
8 https://economia.uol.com.br/noticias/redacao/2020/02/03/iptu-imposto-duvidas.htm?cmpid=copiaecola
9 https://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/fazenda/servicos/iptu/index.php?p=25037#:~:text=Apesar%20de%20o%20IPTU%20poder,parcelas%20%C3%A9%20inferior%20a%2010.
10 http://revista.uepb.edu.br/index.php/qualitas/article/view/3637/pdf
11 http://www.rio.rj.gov.br/web/guest/exibeconteudo?id=7609140
12 https://gestaourbana.prefeitura.sp.gov.br/2179-2/