A velocidade da ofensiva de uma ala do governo para enfraquecer o poder do presidente da Câmara, Arthur Lira, pode atrapalhar as negociações sobre o novo arcabouço fiscal no Congresso, na visão de parte da equipe econômica.
O ministro Fernando Haddad tem tido interlocução direta com Lira para tentar viabilizar, no curto prazo, a aprovação da medida, que será complementada com um pacote para ampliar a elevação de receitas.
Mas essa estratégia de aproximação com a principal liderança do centrão não é consensual dentro da ala política do governo. Parte desse grupo vem trabalhando para esvaziar a influência de Lira no rumo das discussões calculando que, dessa forma, pode consolidar uma base aliada menos dependente das vontades do alagoano.
Na Fazenda, a avaliação é a de que Arthur Lira ainda é sinônimo de governabilidade e que é preciso lidar pragmaticamente com essa realidade. Por isso, seria preciso cuidar dos gestos no curto prazo, para que, durante discussões estratégicas, o deputado alagoano não se sinta pressionado a buscar saídas que agradem deputados de oposição a Lula.
É pelo interesse em manter sua centralidade de poder que o presidente da Câmara vem trabalhando para emplacar um aliado na relatoria do novo arcabouço. Entre os mais cotados estão os nomes dos deputados Fernando Monteiro e Cláudio Cajado, ambos do PP.
Entre integrantes da área econômica, a leitura é que não importa quem seja o escolhido, pois a digital definidora sobre o relatório será do presidente da Câmara. Por isso, qualquer revés na ideia de apresentada pela Fazenda vai ser interpretado como um ruído na relação entre os poderes.
“O maior advogado de Lira no governo é a Fazenda. Temos uma relação boa e queremos preservar”, sintetizou ao JOTA uma das fontes que acompanham de perto as negociações.
Depois de obter a reeleição pelo maior placar da história, Arthur Lira assistiu a fragmentação do eixo de partidos de centro que costuma influenciar no plenário com a consolidação do bloco partidário de 142 deputados formado por MDB, PSD, Republicanos e Podemos.
Parlamentares que participaram das negociações ressaltam que o bloco não pretende confrontar a atuação de Lira, mas, é tratado nos bastidores como uma alternativa para o governo viabilizar uma base aliada na Câmara sem tanta dependência do atual mandatário, que conta com a aliança mais próxima das bancadas de União Brasil e PL, além do próprio partido, o PP. A Fazenda também vê o novo bloco como sendo mais um canal de interlocução, o que é saudável, porém quer cuidar para que essa relação não gere melindres no chefe da Câmara.
Na lógica da articulação política do Planalto, o movimento interessa por dois motivos. No curto prazo, pelo reequilíbrio das prerrogativas do Executivo na relação com as bancadas, que durante o governo Bolsonaro se acostumaram a ir a Lira, e não à Esplanada, negociar o envio de recursos para as bases por meio de emendas. No longo prazo, pela possibilidade de emplacar um nome para suceder Lira, em 2025, que seja mais próximo dos interesses do governo.
Em paralelo ao movimento, o governo vem travando outro desgaste com o político alagoano em meio ao impasse com o Senado sobre o rito de Medidas Provisórias.
Lira tem indicado em conversas reservadas que avalia ter cedido ao concordar com a retomada das comissões mistas para a análise de entre ou quatro MPs relevantes ao Executivo. Agora, aguarda a conversão do restante das medidas em projetos de lei para tramitar em regime de urgência. Se isso não ocorrer, o entorno político de Lira aposta em um cenário de paralisia das votações de interesse do Planalto no plenário da Câmara.