
A 27ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJSP), por maioria, decidiu, por maioria dos votos em sessão na última terça-feira (5/9), que a Taurus deve remover publicidade de armas de fogo de seu site e do perfil do Instagram, sob pena de multa de diária a ser fixada pelo juiz de primeira instância.
De acordo com o desembargador prolator do voto vencedor, Alfredo Attié, “o art. 33, II, da Lei n.º 10.826/2003 veda por completo a publicidade para venda de armamentos fora do estrito âmbito das publicações especializadas, o que, por consequência, resultaria em proibição legal à propaganda em perfil aberto na rede social Instagram e até mesmo no próprio website da agravante, plataformas nas quais não há restrição de acesso ao consumidor comum”.
Para ele, “parece claro desnecessário maior aprofundamento de pesquisa, em face da notoriedade e publicidade desse fato que a internet (e os sites, redes sociais e todos os elementos que compuseram, compõem e comporão o meio virtual de informação e comunicação), de acesso público e indiscriminado, figuram a realidade de publicações voltadas ao público, em geral, mas, sobretudo a crianças e jovens (o “público infanto-juvenil”), que se adaptou a tal meio e faz dele uso intensivo. Fica o público exposto em larga extensão e profundidade a essa propaganda, sobretudo ilegal, o que prejudica sua formação e o futuro da sociedade livre, igual e solidária desejada pela Constituição”.
A decisão do TJSP foi tomada em recurso movido pelas organizações não governamentais Comissão Arns, Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) e Coletivo Brasil de Comunicação Social (Intervozes) contra a fabricante de armas.
O desembargador Attié divergiu do relator originalmente sorteado, que entendia que a publicidade online era válida e deveria apenas observar a autorregulamentação do Conselho de Autorregulamentação Publicitária (Conar).
Para Attié, a publicidade viola a Constituição, o Estatuto do Desarmamento e o Estatuto de Crianças e Adolescentes (ECA). Segundo o desembargador, a “ordem normativa brasileira segue estritamente a configuração contemporânea do Estado como dotado do monopólio do uso legítimo da violência, sendo-lhe conferido o uso legal e absolutamente disciplinado das armas para a consecução de seu fim de garantir a segurança da cidadania”.
“É importante ressaltar que o conteúdo e o espírito da lei, em cumprimento à ordem pública constitucional, estão plenamente voltados à vedação da figuração de uma cultura armamentista: não há direito às armas, muito menos ao porte, ao comércio livre, ao uso”, pontua.
Ele ressalta que “não há direito a possuir, portar, comercializar ou fazer publicidade sobre armas, mas tão-somente uma autorização estatal nesse sentido, em hipóteses estritamente delimitadas”. E acrescenta que “não se trata de ser a favor ou contra as armas”, mas de cumprir o comando constitucional, que é no sentido de que “as armas são proibidas, coadunando-se com o ideal de paz preconizado pela Constituição da República Federativa do Brasil”.
Além de Attié, participaram do julgamento os desembargadores Rogério Murillo Pereira Cimino (presidente sem voto), Celina Dietrich Trigueiros e Dario Gayoso (vencido).
Procurada, a Taurus enviou a seguinte nota à redação:
“A Taurus faz uso da internet e das redes sociais em estrita obediência à legislação aplicável e à regulamentação do Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária (CONAR).
A Taurus é uma das empresas mais rigorosas no cumprimento dessa legislação e dessa regulamentação e não pode ter um tratamento mais desfavorecido nesse tema, em relação a outras fabricantes brasileiras e estrangeiras que com ela concorrem e fazem uso da internet para divulgação de seus produtos.
Há ainda grande irresponsabilidade na tentativa de proibir o uso da internet pela empresa, já que faz parte de sua comunicação a divulgação de avisos regulares sobre uso responsável e seguro de armas de fogo, nos termos da legislação.
A Taurus aguarda a publicação do acórdão no Diário Oficial para conhecer seus termos e tomar as medidas cabíveis.
Cabe ressaltar que junto com o voto do Relator Designado devem ser publicados os votos dos outros dois Desembargadores que compuseram a Turma Julgadora. O voto do Relator originário foi pelo desprovimento do recurso das Autoras, já que inexiste proibição legal ao uso das redes sociais e internet pelas fabricantes de armamento, o mesmo entendimento que foi adotado pelo Juiz de Primeira Instância nesse caso.
A Taurus interporá todos os recursos cabíveis para garantir seu direito constitucional e legal de uso da internet e divulgação de seus produtos, de acordo com as normas atualmente aplicáveis.”
O processo tramita com o número 2027635-19.2023.8.26.0000.