O procurador-geral de Justiça do Estado de Minas Gerais, Jarbas Soares Júnior, defendeu que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) intervenha na repactuação do acordo de Mariana (MG) e convoque as partes para uma “reunião de batida de martelo”. O chefe do Ministério Público disse não saber se a medida será necessária, mas tem a expectativa de que o presidente entre em campo para o acerto final.
“Pode ser que seja o caso de o próprio presidente Lula sentar conosco para definir os valores finais com as empresas. As empresas reconhecem as suas responsabilidades, e a matéria é de tal relevância social, ambiental e econômica para o país, que talvez precisemos desse reforço final. Foi assim que fechamos Brumadinho [MG]”, contou Soares Júnior.
Em meio às negociações para aquele acordo, o governador do estado, Romeu Zema (Novo), recorreu a essa estratégia e interveio para o acordo ser fechado. O representante do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), Soares Júnior, o então procurador-geral da República, Augusto Aras, e os diretores da Vale foram convidados para uma reunião de modo a pôr um fim à questão. As partes apertaram as mãos em 2021.
No caso de Mariana, hoje o clima é de incerteza. Os trabalhos ganharam fôlego no ano passado, principalmente no final, com atividade e dedicação mais intensas pelo lado da Advocacia-Geral da União (AGU). O poder público até apresentou uma proposta às empresas Vale, BHP e Samarco, mas as partes não conseguiram se entender financeiramente.
Na prática, há um consenso quanto aos principais pontos do novo acordo. A proposta está em sigilo, mas prevê, em linhas gerais, a reparação aos atingidos pelo desastre, a recuperação mínima do meio ambiente, o ressarcimento dos estados e da União e um investimento no sistema de saúde. O poder público chegou com uma cifra de cerca de R$ 126 bilhões para as mineradoras e ouviu de volta R$ 42 bilhões. “Muito aquém das necessidades”, protestou Soares Júnior.
No Tribunal Regional Federal da 6ª Região (TRF6), onde está instalada a mesa de repactuação do acordo de Mariana, os trabalhos reiniciaram em janeiro. A coordenação está no colo do desembargador Ricardo Machado Rabelo, e as conversas devem seguir a partir de onde pararam: valores e prazos. O poder público quer um montante maior das empresas e prazos menores. Elas desejam o inverso, algo menor e com mais tempo.
De 0% a 100%, o procurador-geral de Justiça de Minas estimou haver uma probabilidade de cerca de 80% de a repactuação dar certo. Um empurrãozinho pode vir de uma condenação de R$ 47,6 bilhões imposta por um juiz de Belo Horizonte às mineradoras. Corrigido, esse valor pode bater R$ 94 bilhões, pelas suas contas.
As empresas pedem a correção do cálculo e argumentam que, seguindo a lógica da decisão, como o valor despendido em indenizações materiais foi de R$ 31,7 bilhões, a decisão relativa aos danos morais não poderia superar essa quantia. As empresas alegam ainda haver um erro aritmético na decisão judicial, que teria incorretamente somado valores despendidos na reparação dos danos.
A reportagem entrou em contato com a assessoria de imprensa do Tribunal para questionar o gabinete do magistrado sobre o valor atualizado da condenação, mas não obteve retorno até o momento. A comunicação social do TRF6 informou que já havia recebido uma demanda como essa, e na ocasião o magistrado disse que não responderia.
Independentemente, Soares Júnior ressaltou que “isso é só dano moral. Ainda tem ambiental, saúde, pesca, atingidos, municípios, estados e a União”. Para ele, “fica um alerta para as empresas de que a conta pode ser muito mais alta do que está sendo proposto [para a repactuação do acordo]”.
Uma consulta no sistema de Processo Judicial Eletrônico (PJe) mostra que já foram opostos embargos de declaração. Esse tipo de recurso serve para esclarecer obscuridades e corrigir erros da decisão. O pedido ainda não foi apreciado pelo magistrado.
O tempo é crucial. Um processo pode demorar anos para ser julgado quando se considera todas as etapas e instâncias pelas quais deve passar. “Por isso, insistimos que o acordo é melhor para todos”, afirmou o procurador.
Ele “torce” para que até o primeiro trimestre o novo acordo de Mariana esteja fechado. “Nós já cansamos dessas reuniões. Todo mundo já cansou”.