Corte IDH

Corte IDH condena Equador por atraso em cumprimento de sentença de ex-jogador do Emelec

Juízas Nancy Hernández López e Patricia Pérez Goldberg apresentaram voto conjunto dissidente sobre caso ocorrido em 1991

jogador argentino emelec
O jogador argentino Juan José Meza, ao lado de Maradona / Crédito: Reprodução/Instagram/@JuanJMeza60

A Corte Interamericana de Direitos Humanos (Corte IDH) declarou que o Equador é responsável pela violação de direitos às garantias judiciais e à proteção judicial em uma ação trabalhista ajuizada há 33 anos por um jogador argentino de futebol. 

Em sentença notificada no fim de dezembro sobre o caso Juan José Meza Vs. Equador, o Tribunal analisou supostas violações derivadas do incumprimento de uma decisão judicial que determinava o pagamento de salários e compensações ao ex-jogador argentino Juan José Meza por parte do Club Sport Emelec, do Equador. 

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Meza assinou contrato com o clube no dia 4 de março de 1991. Em 16 de julho do mesmo ano, o clube retirou sua inscrição da Federação Equatoriana de Futebol e inscreveu outro jogador em seu lugar. 

Em novembro de 1991, Meza ajuizou uma ação contra o clube por demissão intempestiva. Na ação, afirmava que a inscrição de outro jogador representava o término unilateral do contrato pelo empregador, o que impedia que exercesse a atividade para a qual tinha sido contratado. 

Um juiz julgou improcedente a demanda de Meza, que recorreu ao Superior Tribunal de Justiça de Guayaquil e obteve decisão favorável em 24 de abril de 1996. A decisão determinava que a 4ª Vara do Trabalho de Guayas efetuasse o pagamento dos valores devidos.

Em 20 de setembro de 1996, a 4ª Vara aprovou uma quantia que foi contestada por Meza. Em 19 de junho de 1997, o Superior Tribunal de Justiça determinou que a 4ª Vara calculasse um novo acerto, que só foi feito em 28 de junho de 1999, mas, em 19 de julho de 1999, a 4ª Vara reduziu o valor.

Em 30 de junho de 2004, o Superior Tribunal de Justiça declarou nulas as ações anteriores, ressaltando que a determinação de 19 de julho de 1999 não foi objeto de qualquer recurso e exigiu que a 4ª Vara executasse a sentença. 

Em 24 de janeiro de 2005, a 4ª Vara liberou um novo valor ao jogador. Porém, no dia 10 março de 2005, decidiu reduzir substancialmente o valor fixado anteriormente. Os recursos interpostos por Meza foram rejeitados. Em 31 de agosto de 2006, a 4ª Vara ordenou que Meza retirasse a quantia fixada, o que foi feito em 2 de outubro de 2006 por ordem judicial.

O Conselho Judiciário impôs uma sanção disciplinar aos responsáveis da 4ª Vara, com base no fato de não terem cumprido a decisão do Superior Tribunal de Justiça de Guayaquil emitida em 24 de abril de 1996. A punição, porém, não se traduziu em nenhum tipo de reparação para Meza, cujo processo acabou arquivado após as contestações.

Equador nega responsabilidade

Meza apresentou a petição inicial sobre seu caso à Comissão Interamericana de Direitos Humanos em 15 de fevereiro de 2001. A Comissão, por sua vez, submeteu o caso mais de 20 anos depois à Corte, que mostrou preocupação com o tempo transcorrido ao notificar a sentença. 

Para a Comissão Interamericana de Direitos Humanos, dois obstáculos principais dificultaram o cumprimento da sentença favorável a Meza: a tomada de decisões que contradisseram a ordem de cumprimento da sentença de abril de 1996, com o valor de ressarcimento estipulado nela, e a concessão de “ilimitadas possibilidades de recursos na etapa de execução”. Neste caso, afirmou que a “constante mudança nos pagamentos (…) gerou uma cadeia de apelações”. 

Já o Estado equatoriano negou ter violado o artigo 25 da Convenção Americana, sobre o direito à proteção judicial. Afirmou que Meza teve acesso a processos judiciais e que obteve decisão favorável. E alegou complexidade na execução da sentença por dois fatores: a determinação da metodologia de cálculo para o pagamento e os constantes desacordos entre as partes, assim como a exclusão de distintos peritos. Segundo o Estado equatoriano, “a atividade das partes dilatou o processo”. 

A Corte não se pronunciou sobre a correção das quantias nas sucessivas liquidações decididas pela 4ª Vara no processo. Avaliou, dentro de sua competência, a conduta estatal seguida no caso pelas autoridades judiciais no processo de execução da sentença de 24 de abril de 1996 e a razoabilidade do tempo transcorrido para execução da sentença. 

O Tribunal observou que, neste caso, passaram-se mais de 11 anos entre a decisão de 24 de abril de 1996 e a execução da referida sentença. Considerou ainda que o processo de execução não apresentava particular complexidade, à medida que requeria pagamento a uma só pessoa, com base em valores pré-fixados pela decisão, e que não era apropriado atribuir o atraso às partes envolvidas no processo. 

Na divulgação da sentença, a Corte afirmou que em um Estado de Direito todas as autoridades públicas devem atender as decisões judiciais, assim como impulsioná-las e executá-las sem obstáculos ao sentido e alcance dessas decisões, nem atrasar indevidamente sua execução. 

De acordo com o Tribunal, um dos componentes do direito à proteção judicial, estabelecido no artigo 25 da Convenção Americana, é que os Estados garantam os meios para executar as respectivas decisões e sentenças definitivas emitidas pelas autoridades competentes. Esse direito inclui que o cumprimento da decisão se concretize sem obstáculos nem demoras indevidas. 

Uma demora prolongada, observou a Corte, pode constituir, por si só, uma violação das garantias judiciais. Para o Tribunal, Meza não teve a garantia do cumprimento da decisão judicial a seu favor num prazo razoável.

Voto parcialmente dissidente 

As juízas Nancy Hernández López (Costa Rica) e Patricia Pérez Goldberg (Chile) fizeram um voto conjunto parcialmente dissidente. Para elas, a noção de prazo razoável “é indeterminada e flexível”, sem que exista a possibilidade de estabelecer um espaço de tempo específico que se aplique de maneira abstrata a todos os assuntos de uma mesma natureza. 

No caso em questão, elas discordam da responsabilidade do Estado equatoriano pela violação da garantia a um prazo razoável na execução da sentença trabalhista. Afirmam que, ao contrário do exposto na decisão majoritária da Corte, o caso, que parecia ser simples, tinha uma complexidade “que se materializou no desacordo entre as partes, principalmente em relação ao cálculo da quantia por parte dos peritos designados para tal efeito”. 

Além disso, afirmaram haver “insuficiência de antecedentes que permitissem precisar o pagamento adequado”, segundo indicado pela decisão na Justiça equatoriana. As duas juízas indicaram que no transcurso do processo de execução da sentença foram realizadas diversas ações por ambas as partes, que “claramente causaram um atraso no desenrolar do caso”. 

Para elas, a interposição de vários recursos prolongou consideravelmente o processo. “Porém, tal situação emanou exclusivamente da atividade processual das partes, contexto no qual o Estado garantiu de forma efetiva tanto o acesso à justiça das partes quanto o princípio dispositivo e de contrariedade.”

Participaram do julgamento os juízes Ricardo C. Pérez Manrique (Uruguai); Eduardo Ferrer Mac-Gregor Poisot (México); Humberto Antonio Sierra Porto (Colômbia); Nancy Hernández López (Costa Rica); Verónica Gómez (Argentina); Patrícia Pérez Goldberg (Chile) e Rodrigo Mudrovitsch (Brasil).