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Lewandowski nega pedido de requisição de leitos particulares pelo poder público

Ministro destacou que Constituição já permite que governos requisitem bens e serviços privados em caso de calamidade

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Crédito: Pixabay

O ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal (STF), negou seguimento a uma ação na qual o PSOL pede que a administração de hospitais e leitos particulares, em especial os de UTI, sejam transferidas ao poder público durante a pandemia do coronavírus. Para Lewandowski, a arguição de descumprimento de preceito fundamental (ADPF) não é a via processual correta para esse tipo de requisição.

O ministro destaca, porém, que a Constituição e várias leis em vigor já permitem a requisição de bens e serviços privados pelo poder público no caso de iminente perigo público, pandemia e calamidade pública. Leia a íntegra da decisão, proferida nesta sexta-feira (3/4).

A decisão foi proferida na ADPF 671. Nesta ação, o PSOL pede que a União, estados e municípios executem a requisição administrativa da totalidade dos bens e serviços de pessoas jurídicas e físicas relativos à assistência à saúde prestados em regime privado enquanto durar a pandemia do coronavírus.

Para o partido, não atende aos princípios constitucionais que 56% dos leitos de Unidade de Tratamento Intensiva (UTI) disponíveis, destinados a 25% da população brasileira com convênios médicos, fiquem ociosos à espera de que os que tem dinheiro o utilizem, enquanto outros sem convênio médico já precisam utilizar estes leitos.

Em sua decisão, Lewandowski diz que a ADPF não deve ser conhecida por não preencher os requisitos da Lei 9.882/1999, que rege as ações de constitucionalidade e inconstitucionalidade no Supremo.

O ministro diz que “a ADPF é cabível para evitar ou reparar lesão a preceito fundamental, resultante de ato do Poder Público, e, também, quando for relevante o fundamento da controvérsia constitucional sobre lei ou ato normativo federal, estadual ou municipal, inclusive anteriores à Constituição”, e que só deve ser aceita quando não houver nenhum outro meio jurídico para sanar o conflito.

O ministro destaca, porém, que a requisição administrativa, pelo poder público,  de bens e serviços particulares, já é possível. Na Constituição, no artigo 170, está previsto que “no caso de iminente perigo público, a autoridade competente poderá usar de propriedade particular, assegurada ao proprietário indenização ulterior, se houver dano”.

“Essa medida pode ser desencadeada por qualquer dos entes federados, com base no art. 23, II, da Constituição, o qual estabelece que é da competência comum destes ‘cuidar da saúde e assistência pública'”, explica o ministro Lewandowski na decisão. O ministro ainda destaca que o artigo 24 da Constituição atribui competência à União, aos estados e ao Distrito Federal para legislar sobre proteção e defesa de saúde.

Já no âmbito das leis ordinárias, o ministro cita a Lei 8.080/1990, que regulamento o Sistema Único de Saúde (SUS). Tal lei, em seu artigo 15, consigna que “para atendimento de necessidade coletivas, urgentes e transitórias, decorrentes de situações de perigo iminente, de calamidade pública ou de irrupção de epidemias, a autoridade competente da esfera administrativa correspondente poderá requisitar bens e serviços, tanto de pessoas naturais como de jurídicas, sendo-lhes assegurada justa indenização”. Já o Código Civil prevê que “o proprietário pode ser
privado da coisa, nos casos de […] requisição, em caso de perigo público iminente”.

“Como se vê, os meios legais adequados para viabilizar a requisição administrativa de bens e serviços já estão postos, pois diversos são os textos normativos que autorizam os entes políticos a fazer uso desse instrumento”, diz Lewandowski. O ministro ainda ressalta que a recente Lei 13.979/2020, que dispõe sobre as medidas a serem tomadas para conter a pandemia da Covid-19, incluiu mais uma previsão de requisição administrativa. Com base nela, qualquer ente federado, como também a União, poderá requerer bens e serviços de pessoas naturais e jurídicas, sob o pagamento posterior de indenização.

Para o ministro, com o arcabouço normativa vigente, acolher a pretensão do partido significaria violar a separação dos poderes e usurpar a competência da União e dos entes federativos. Por isso, nega seguimento à ADPF ajuizada pelo PSOL.

“Vulneraria frontalmente o princípio da separação dos poderes a incursão do Judiciário numa seara de atuação, por todos os títulos, privativa do Executivo, substituindo-o na tomada de decisões de cunho político-administrativo, submetidas a critérios de conveniência e oportunidade, sobretudo tendo em conta a magnitude das providências pretendidas nesta ADPF, cujo escopo é nada mais nada menos do que a requisição compulsória e indiscriminada de todos os bens e serviços privados voltados à saúde, antes mesmo de esgotadas outras alternativas cogitáveis pelas autoridades federais, estaduais e municipais para enfrentar a pandemia”, diz Lewandowski.

Por outro lado

O ministro também proferiu decisão nesta sexta-feira em uma ação ajuizada pela Confederação Nacional de Saúde (CNSaúde). Nesta ação, a entidade requer que eventuais requisições de bens e serviços de hospitais e outras empresas privadas sejam coordenadas pelo Ministério da Saúde.

A CNSaúde pede, na prática, que as requisições previstas na lei que fixa as medidas a serem tomadas no combate à pandemia, não possam ser levadas a efeito pelos governadores e prefeitos antes de estudos e do consentimento do Ministério da Saúde.

O Ricardo Lewandowski pediu informações ao presidente da República e ao Ministério da Saúde para, posteriormente, julgar o mérito do pedido e não apenas sua liminar.