Lei 13.799/20

CNS aciona STF contra requisições de bens feitas a hospitais privados até por municípios

Para entidade, dispositivos da lei que trata do combate ao coronavírus no país interferem sobre direitos fundamentais

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Crédito: Pexels

A Confederação Nacional de Saúde (CNSaúde) ajuizou no Supremo Tribunal Federal (STF), nesta quinta-feira (2/4), ação direta de inconstitucionalidade com pedido urgente de liminar, para que seja fixada interpretação a dispositivos da “Lei da Quarentena” (Lei 13.979/20) a fim de que – no combate à pandemia do coronavírus – “todas as requisições administrativas projetadas para serem exercidas por gestores de saúde estaduais ou municipais sejam submetidas ao prévio exame e autorização do Ministério da Saúde para serem, só depois disso, implementadas”.

Na petição inicial da ADI 6.362, a entidade nacional dos hospitais privados assegura que a lei em questão “enumera um expressivo conjunto de medidas passíveis de serem adotadas, que interferem sobre direitos fundamentais e sobre regras habituais de comportamento da Administração Pública”.

Os dispositivos visados da “Lei da Quarentena” são os seguintes:

“Art. 3º – Para enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus, as autoridades poderão adotar, no âmbito de suas competências, dentre outras, as seguintes medidas:

(…) VII – requisição de bens e serviços de pessoas naturais e jurídicas, hipótese em que será garantido o pagamento posterior de indenização justa;

(…) parágrafo 7º – As medidas previstas neste artigo poderão ser adotadas:

(…) III – pelos gestores locais de saúde, nas hipóteses dos incisos III, IV e VII do caput deste artigo”.

Para o advogado da CNSaúde, Sergio Bermudes, “essa permissão, em termos genéricos, para que os gestores locais de saúde se valham da requisição administrativa de bens e serviços no combate à pandemia, sem condicionar sua adoção a medidas de coordenação e controle por autoridade da União Federal – e sem esgotar as alternativas menos gravosas disponíveis, e estabelecer requisitos mínimos para garantir que se dê em contexto afeito ao princípio da proporcionalidade, é apta a gerar interpretação que distorce a limitação ao direito de propriedade disposta no art. 5º, XXV, da Constituição”.

Na petição da ADI 6.362 destacam-se ainda as seguintes razões:

– “Atingindo a liberdade de contratar e de desempenho de atividades profissionais e econômicas, a interpretação isolada dessa competência entregue a autoridades de Estados-membros e Municípios, desguarnecida de balizas que assegurem a sua razoabilidade intrínseca e a conformidade com políticas públicas federais, contraria o comando constitucional que entroniza o valor da livre iniciativa (art. 170, caput, da Constituição).

– “Essa permissão, em termos genéricos, para que os gestores locais de saúde se valham da requisição administrativa de bens e serviços no combate à pandemia sem condicionar sua adoção a medidas de coordenação e controle por autoridade da União Federal, e sem esgotar as alternativas menos gravosas disponíveis e estabelecer requisitos mínimos para garantir que se dê em contexto afeito ao princípio da proporcionalidade – é apta a gerar interpretação que distorce a limitação ao direito de propriedade disposta no art. 5º, XXV, da Constituição (‘no caso de iminente perigo público, a autoridade competente poderá usar de propriedade particular, assegurada ao proprietário indenização ulterior, se houver’), abalando, dessa maneira, sem o consentimento do constituinte, o próprio inciso XX do mesmo artigo, que garante o direito de propriedade, nas suas clássicas faculdades de usar, gozar e dispor”.

– “Na contramão da indispensável cooperação exigida pelos tempos atuais, contudo, diversos fornecedores de equipamentos médicos e hospitais privados têm sido vítimas de ações desastradas, porque desordenadas e desproporcionais, de autoridades públicas de esferas distintas da Federação, que têm se valido, de forma confusa e desarranjada, de requisições administrativas, para se apoderar de equipamentos e insumos médicos existentes e até aqueles por serem ainda fabricados”.

O relator da ADI 6.362, por prevenção, é o ministro Ricardo Lewandowski. É que ele já é relator de arguição de descumprimento de preceito fundamental (ADPF 671), com base na qual o Partido Socialismo e Liberdade (PSOL) pretende que, enquanto durem os efeitos da pandemia do coronavírus, a União, o Distrito Federal, os estados e os municípios – em face da escassez de leitos em UTIs – “executem a requisição administrativa da totalidade dos bens e serviços de pessoas jurídicas e físicas relativos à assistência à saúde prestados em regime privado”.