Os novos membros da Corte Interamericana de Direitos Humanos (Corte IDH) tomaram posse nesta segunda-feira (7/2), em São José, na Costa Rica, onde fica a sede da instituição.
Foram empossados o presidente da Corte, Ricardo Pérez Manrique, o vice-presidente, Humberto Sierra Porto, e os quatro nomes para a mesa diretora: três juízas (uma costarriquenha, uma argentina e uma chilena) e o brasileiro Rodrigo Mudrovitsch.
Mudrovitsch é advogado, tem 36 anos e preside a Comissão Especial de Direito Penal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Ele se tornou o segundo mais jovem a assumir uma cadeira na Corte IDH após ser o mais votado para o cargo, com 19 dos 24 votos possíveis. Ele não discursou na posse.
A cerimônia foi aberta com discurso da agora ex-presidente Elizabeth Odio Benito, que assumiu a Corte em fevereiro de 2020 e deixou o cargo em 31 de dezembro de 2021. Ela falou sobre os desafios de trabalhar com direitos humanos em tempos “revoltos, confusos e de instabilidade”, especialmente a partir da pandemia de Covid-19.
“Em 3 de fevereiro de 2020, estávamos muito distantes de adivinhar que, poucas semanas depois, uma pandemia assolaria o planeta, levando milhões de vidas, aprofundando uma imensa desigualdade que caracteriza nossos povos e acrescentando uma violência social que se insurge contra as mulheres, especialmente, em todos os âmbitos”, disse ela.
Elizabeth destacou que o coronavírus impôs à Corte um “desafio abissal”, mas que, com a ajuda de profissionais de todas as áreas, especialmente aqueles ligados a tecnologia, foi possível avançar e adotar medidas para não afetar o direito das vítimas. Ela citou como exemplo a publicação inédita de uma declaração sobre a Covid-19 e os desafios colocados pela pandemia.
“Obrigada, amigos e colegas, pela paciência e apoio, porque, graças a isso, pude cumprir meu trabalho na presidência, mesmo com essa estranha maneira de nos vermos e trabalharmos. Graças ao trabalho responsável e de altíssima qualidade profissional de vocês, podemos emitir sentenças e opiniões consultivas que marcaram novos marcos na jurisprudência da Corte. Sinto-me muito orgulhosa de ter contribuído com este modesto grão de areia na construção do Direito Internacional de Direitos Humanos deste Corte”, declarou a ex-presidente.
Benito foi apenas a segunda mulher a presidir a Corte em 40 anos de história da instituição – antes, apenas a jurista chilena Cecília Medina havia ocupado o cargo. Diante do cenário, ela exaltou a nomeação de três mulheres para a nova mesa diretora. “Hoje, 7 de fevereiro de 2022, a história começa a mudar. A integração à Corte de três muito distintas juristas do continente nos marca um caminho ao futuro de igualdade que aspiramos. Pessoalmente, quero dizer que estou muito feliz que vocês estejam integrando a Corte a partir de agora”.
Após a fala da ex-presidente, os juízes do colegiado fizeram um juramento rápido e foram oficialmente empossados pelo novo presidente. Em seguida, discursou o chanceler da Costa Rica, Rodolfo Solano Quirós.
“Temos muitíssimo orgulho e esperança, porque, por mais de quatro décadas, a Costa Rica tem sido testemunha próxima do trabalho de um tribunal cuja atuação, tanto na dimensão contenciosa quanto na consultiva, tem avançado, tem sido efetivo e pleno no reconhecimento da independência entre democracia, estado de direito e proteção dos direitos humanos”, bradou o costarriquenho. [O tribunal] consolidou um importante acúmulo de decisões e medidas de reparação que, sem medo de errar, constitui um dos maiores patrimônios jurídicos do continente”, acrescentou Quirós.
Por último, falou o novo presidente da Corte IDH, o uruguaio Ricardo Pérez Manrique. Ele inaugurou o ano de trabalho rendendo tributos às vítimas da Covid-19 e se solidarizando com familiares e pessoas que tiveram sequelas da doença.
Ele ressaltou que a pandemia é um dos maiores desafios da sua presidência na Corte, especialmente diante de discursos autoritários e que, segundo ele, só servem para desinformam a população e aprofundar o medo.
“Houve um aumento, em nossa sociedade, de discursos autoritários, que preconizam remédios simplistas, falsas soluções, teorias conspiratórias e que buscam polarizar em vez de construir consenso. Querem transformar adversários políticos em inimigos da sociedade, com discursos de xenofobia contra imigrantes ou grupos historicamente discriminados. Penso que a democracia e o Estado de Direito devem enfrentar esses desafios, incorporando as vozes das pessoas que demandam seus direitos”, sugeriu.
Manrique disse assumir o cargo com “total humildade e o compromisso de dar o melhor”. “Queremos fazer da Corte Interamericana um tribunal aberto e próximo do povo e de seus diversos atores, com ouvidos e olhos bem atentos, para conhecer e interpretar a complexa situação da região, para ouvir aqueles que não têm a possibilidade de ser escutados – as pessoas em situação de vulnerabilidade que são, como sabemos, milhões”, afirmou.
Para o uruguaio, a internet e as novas tecnologias serão grandes objetos de reflexão e trabalho dos membros que assumem a Corte. “O desenvolvimento tecnológico, particularmente a internet e novas tecnologias de informação, trouxeram grandes vantagens. A questão é como abordar esse mundo de transformação e mudanças no ecossistema digital ajustando nossa concepção de estado de direito e direitos humanos a essa nova realidade”.
O presidente garantiu que reforçará, à frente da Corte, a luta por dignidade e por direitos básicos, como o direito à saúde, trabalho, água, meio ambiente sustentável, direitos das mulheres e dos povos tradicionais.
“Somos encarregados de atuar juridicamente para efetivar o valor da dignidade humana, conforme os direitos reconhecidos na convenção [Convenção Americana de Direitos Humanos] e por outros instrumentos do sistema interamericano. Essa missão nos foi confiada porque mais de 600 milhões dependem que atuemos de maneira justa e rápida. Estamos comprometidos, como a Corte tem feito por mais de 40 anos, a seguir cumprindo esta alta função”, declarou Manrique.