
O projeto de lei orçamentária (PLOA) de 2024 enviado ao Congresso mostra a situação do governo mais confortável em termos de despesas discricionárias do que a gestão anterior. Mas ainda assim, esses gastos teoricamente de livre alocação pelo governo estarão em nível ligeiramente inferior à média histórica, quando se calcula em relação ao Produto Interno Bruto (PIB).
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A peça remetida em 31 de agosto prevê um volume de R$ 211,9 bilhões nas discricionárias, o correspondente a 1,9% do PIB estimado para 2024. Nesse dado, estão incluídos R$ 37 bilhões em emendas parlamentares, que em grande medida são de execução impositiva, mas são classificadas no grupo dos gastos livres. Em 2023, o relatório bimestral mais recente indica que as discricionárias devem encerrar o ano em R$ 193,9 bilhões, ou 1,8% do PIB, ligeiramente menor do que o reservado para o ano que vem.
No período de vigência do teto de gastos, a partir de 2017, a compressão desse grupo de despesas foi uma das questões mais importantes. Esse componente largou de um nível de 2,3% do PIB em 2016, caindo gradualmente, ainda que em alguns anos tenha tido repiques na execução a partir de mudanças de meta fiscal e suplementação ao teto de gastos. Na média do período Bolsonaro, a discricionária ficou em 1,6% do PIB. Na média histórica, 2,1% do tamanho da economia. Os dados se referem a gastos executados.
O ponto mais baixo ocorreu em 2020 e 2021, com 1,4% do PIB. Nesse período de dois anos, é bom lembrar, houve forte expansão fiscal, mas como eram gastos voltados para a pandemia, a maior parte deles foi classificada como despesa obrigatória.
Dentro das discricionárias do orçamento, estão os investimentos federais. Em 2024, de acordo com o PLOA, poderão ser executados R$ 69,7 bilhões nessa rubrica, volume relativo ao piso de 0,6% do PIB definido no novo arcabouço fiscal, aprovado no mês passado. Nesse número também estão inversões financeiras, no caso, subsídios pagos ao programa Minha Casa Minha Vida. O volume é 15% superior aos R$ 60,7 bilhões projetados para 2023.
No caso dos investimentos, a situação é pior do que a vista na média dos quatro anos do governo Bolsonaro (0,8% do PIB), embora o dado esteja inflado por gastos feitos na pandemia. Olhando, porém, apenas o último ano da gestão anterior, o volume está ligeiramente melhor do que os 0,5% do PIB vistos em 2022. Já se considerando a média histórica, o investimento público ainda está bem abaixo dos 1% do PIB verificados entre 2008 e 2022 — gastos executados, não orçados.
É importante destacar que o volume orçado para o próximo ano não significa que o governo executará esse nível. A recomposição orçamentária é um passo relevante, mas o próprio presidente Lula vetou um dos dispositivos do novo marco fiscal que exigia que os investimentos tivessem cortes proporcionais a outras despesas, caso seja necessário algum bloqueio para cumprir a meta fiscal de zerar o déficit.
Dessa forma, eventual ajuste no lado da despesa poderá se concentrar majoritariamente nessa rubrica, como tem ocorrido historicamente. O Planalto, contudo, sancionou o piso de 75% das despesas discricionárias para ser cumprido, caso seja necessário contingenciamento.
Fica claro que o governo conseguiu, com a PEC da transição aprovada no ano passado e agora o novo arcabouço fiscal, recuperar margem de manobra para trabalhar e se distanciar de uma paralisia da máquina, risco aventado diversas vezes na era do teto de gastos.
Ainda assim, o cenário é menos confortável do que gostariam as forças políticas atuais, especialmente da esquerda, tanto porque olhando historicamente essas rubricas já foram maiores como porque, dado o risco fiscal, a execução de gastos pode ser bem menor do que o previsto. Não à toa, nas últimas semanas se discutiu rever a meta fiscal, temendo-se que sequer o orçado seja totalmente executado em 2024. Podemos esperar que no fim do ano essa inquietação voltará a crescer.