A 8ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) confirmou sentença de primeira instância que condenou o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) a pagar uma indenização, no valor de R$ 10 mil, à jornalista Bianca Maria Santana de Brito. Durante uma live, em 2020, o presidente a acusou de ter veiculado “fake news”. Leia a íntegra.
No dia 28 de maio de 2020, durante a “Live da Semana com o Presidente Jair Bolsonaro”, transmitida pelo YouTube, Bolsonaro apresentou notícias falsas e afirmou que eram de autoria da jornalista. Diante disso, Santana ajuizou uma ação solicitando indenização por danos morais no valor de R$ 50 mil, com obrigação de retratação e exclusão do conteúdo.
Assim, o presidente foi condenado, em dezembro do ano passado, a indenizar a jornalista no valor de R$ 10 mil. A decisão foi proferida pelo juiz Cesar Augusto Vieira Machado, da 31ª Vara Cível de São Paulo. Bolsonaro não havia apresentado contestação e foi considerado revel. Porém, depois ele se retratou por transmissão na internet, em que diz:
“Eu quero ler uma nota porque eu erro também. Não vou culpar a minha assessoria, mas eu erro. Lamento o ocorrido na live de 28 de maio. Peço desculpas à jornalista Bianca Santana. Eu fiz a referência a várias reportagens de fake news, e uma falei que era dela. Não era dela, tinha o nome dela lá embaixo. Houve equívoco da minha parte. Não era da jornalista Bianca Santana, minhas desculpas a Bianca Santana por esse equívoco nosso. Inclusive, já mandei retirar toda a live do ar. Da nossa parte, não tem problema se desculpar quando erra”.
Diante da condenação, Bolsonaro entrou com uma apelação cível, em que alega que não deveria alcançar o dano discutido já que houve “mero erro material por parte dele ao falar o nome da autora, o que fez sem dolo”. Afirma que excluiu a live da plataforma e que se pronunciou publicamente para se retratar.
Ele alegou ainda que tais fatos descaracterizariam os danos morais e que isso “poderia ter ocorrido com qualquer pessoa que diariamente transmitisse vídeos ao vivo”.
Dias antes da live em que Bolsonaro acusa a jornalista, ela havia publicado uma matéria intitulada “Por que querem federalizar as investigações do assassinato de Marielle?”, veiculada no portal UOL, que abordava o possível envolvimento da família Bolsonaro com os investigados no caso do assassinato de Marielle Franco, ex-vereadora pelo PSOL.
O relator do caso, desembargador Alexandre Coelho, da 8ª Câmara de Direito Privado do TJSP, lembrou que a petição inicial do processo ajuizada pela vítima alega que a conduta de Bolsonaro visava “deslegitimar o conteúdo do artigo publicado” sobre o caso Marielle e destacou também que ele faz constantes ataques à liberdade de expressão dos jornalistas, que passam a ser perseguidos e atacados digitalmente por seus apoiadores, “o que de fato também passou a acontecer com ela [Bianca]”, diz.
“Dizer em rede nacional que determinada jornalista divulga fake news é tirar dela o bem mais valioso ao exercício de sua profissão: a credibilidade. Sendo o autor da ofensa o Presidente da República, mandatário do Estado, o impacto moral é inegável e dispensa prova, máxime tratando-se de inverdade lançada em desfavor de profissional que goza de boa reputação”, acrescentou Coelho.
Para ele, dizer que se trata de ato corriqueiro da vida ofender a honra alheia apenas reforça o “desprezo” à mesma, o que viola um dos principais fundamentos dispostos na Constituição Federal, em seu artigo 1º, que dispõe sobre a dignidade da pessoa humana.