Integrantes do Ministério da Saúde sabem que têm um período difícil para atravessar. Confirmando as expectativas, os casos de dengue estão numa perigosa expansão. Somente nas primeiras duas semanas de 2024, os registros são três vezes superiores do que os apresentados no mesmo período do ano passado. Estados começam a decretar emergência em saúde pública.
A ministra Nísia Trindade tem agendada para esta quarta-feira (31) uma visita a uma tenda de acolhimento montada no Distrito Federal para pessoas com suspeita da infecção. Nesta terça (30), um encontro foi promovido na Sala Nacional de Arboviroses e na semana passada foi apresentada a estratégia de vacinação contra a doença, também com a presença de Nísia.
Essa movimentação não é à toa. Além do grave problema de saúde pública, há a percepção de que a escalada da doença pode servir como munição para reforçar os ataques contra a ministra.
O Ministério da Saúde sempre foi cobiçado por grupos políticos, em razão do orçamento e da possibilidade do uso de recursos de forma pulverizada. O controle da pasta é um trunfo político.
A primeira tentativa de enfraquecimento ocorreu no ano passado. Nísia saiu fortalecida com o recado dado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Novos chacoalhões surgiram no início de janeiro. A crítica feita pelo vice-presidente do PT, Washington Quaquá, de que ela não estaria “dando conta”, dá o mote do que vem pela frente, sobretudo em um ano eleitoral.
A incorporação da vacina contra a dengue reflete também essa preocupação do ministério. O imunizante, por mais eficiente que seja, terá uma contribuição limitada para redução de casos neste momento. O número de doses é reduzido. Tanto é que a distribuição das doses será feita para cerca de 10% dos municípios e para uma faixa etária de 10 a 14 anos.
As críticas de que a vacina foi incorporada de forma tardia já começam a ser feitas. Técnicos do ministério observam que a baixa disponibilidade de doses já estava posta no início da discussão. A indústria não tinha quantidade suficiente para atender a demanda. Teria, inclusive, sido um dos pontos que pesaram para a análise da incorporação.
O problema de saúde pública está claro. Há uma combinação perigosa de fatores: circulação de quatro sorotipos do vírus causador da doença (algo que é incomum), chuvas, calor e problemas históricos que tardam a ser enfrentados, como falta de abastecimento de água e acúmulo de lixo.
Sabe-se que a dengue tem em sua origem múltiplas causas. Em 2002, quando saía do Ministério da Saúde e depois de muitas discussões em torno da responsabilidade da epidemia de dengue, José Serra lembrou que o mosquito transmissor da doença não era federal, estadual ou municipal.
A frase é sempre lembrada. E o que se espera é a colaboração de todas as esferas de governo – e que vai muito além da saúde – para que indicadores da doença não dependam, como sempre dependeram, do nível de chuvas ou do tipo de vírus circulante. Para isso, são necessárias ações de curto, médio e longo prazo.
Com relação aos criadouros domiciliares – justificativa que é dada todos os anos –, basta uma reflexão: você teria reservatórios de água em casa se o abastecimento fosse constante? Se houvesse coleta eficiente de lixo, você deixaria acúmulos em seu quintal ou em frente à sua casa?