

Representando o presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva, no evento da Febraban, o ex-ministro e ex-prefeito Fernando Haddad, cotado para liderar o Ministério da Fazenda, foi misterioso sobre a trajetória fiscal a partir de 2023, fonte de inquietação para o mercado financeiro.
Não houve, em seu pronunciamento, recados claros sobre a trajetória das contas públicas e nem informações relevantes sobre a PEC da Transição, tema que tem dominado os debates neste período entre o fechamento das urnas e a posse do presidente eleito.
Mensagem forte mesmo foi dada pelo presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, que em seu discurso no mesmo evento, no qual chegou a chamar Haddad de ministro, ressaltou os riscos de uma expansão fiscal para a trajetória de inflação. Com o representante de Lula na plateia, Campos Neto salientou a necessidade de coordenação entre políticas fiscal e monetária e que a situação de oferta na economia não permite grandes estímulos, sob pena de aumentar a volatilidade de preços.
Haddad não entrou na conversa. Foi bastante genérico ao falar de fiscal. Defendeu processo de revisão de despesas e a “reconfiguração do orçamento”. Também cutucou o atual governo ao criticar a PEC Kamikaze, que elevou o Auxílio Brasil para R$ 600 às vésperas da eleição, dizendo que ela “deseducou” o Brasil. Curioso comentário em um contexto no qual o governo eleito agora tenta em tempo recorde também aprovar uma mudança constitucional para arrumar o orçamento para 2023.
Ele também fez uma menção ao uso de estatais para financiar investimentos em ciência e tecnologia, em mais um sinal claro do petismo sobre a retomada de um papel mais ativo das empresas públicas como instrumento de política econômica. Houve até, nesse tópico, uma crítica aos elevados lucros dessas companhias.
O possível chefe da economia foi incisivo em deixar clara a prioridade para a reforma tributária e deu um sinal mais favorável à PEC 45, que cria o IVA Nacional e está na Câmara, ao citar que entre seus autores intelectuais estão dois ex-funcionários do governo Lula: Bernard Appy e Nelson Machado. E disse que depois o novo governo deve fazer uma reforma da tributação da renda. E afirmou que a intenção é não elevar a carga tributária, o que parece difícil de acreditar com um cenário no qual o governo eleito pretende ampliar os gastos.
Haddad destacou os princípios democráticos de Lula e ressaltou sua característica de negociador e de pessoa que ouve diferentes atores, em uma mensagem cifrada que parece dizer ao mercado: estamos escutando a voz de vocês também. E também defendeu a pacificação federativa e institucional do país. Nesse sentido, também chama a atenção o fato de ele ressaltar a importância de transparência no orçamento, mas sem perda de protagonismo do Congresso — mensagem para Arthur Lira, o dono do chamado “orçamento secreto”.
Em entrevista à Globo News na sequência, o ex-ministro também evitou entrar em detalhes sobre as negociações da PEC da Transição e voltou a defender uma revisão de gastos.