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Governo cria grupo de trabalho para ampliar debate sobre proteínas alternativas

Proposta é reunir representantes da sociedade civil, da cadeia produtiva e do agro para chegar a consensos sobre avanços na regulamentação do setor

Foto: Unsplash
  • Ministério da Agricultura e Pecuária forma grupo de trabalho para criar proposta de política pública sobre ingredientes contemporâneos; 
  • Movimento pode se somar à busca do setor por mais segurança jurídica e clareza regulatória, o que tem potencial de incrementar investimentos;
  • Recém-lançado, estudo do GFI Brasil e Instituto de Desenvolvimento Sustentável mostra potencial das proteínas alternativas para metas socioambientais globais.

O Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa) criou, no final de maio, um grupo técnico de trabalho (GTT) para discutir avanços e propostas regulatórias para os chamados novos sistemas alimentares e ingredientes contemporâneos, o que inclui as proteínas alternativas. Esse pode ser mais um passo no impulsionamento desses alimentos enquanto ferramentas na agenda de inovação do setor agropecuário em sua transição para uma economia de baixo carbono 

Segundo a pasta, a proposta será discutida dentro da câmara temática de transformação digital do agro e vem na esteira da criação de um novo marco regulatório, que vem sendo elaborado desde o ano passado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e pelo Mapa. 

O GTT pretende promover o alinhamento entre os diversos agentes reguladores e regulados, integrando o tema de proteínas alternativas à agenda do agronegócio em geral.

“O maior objetivo é aproveitar o potencial brasileiro, da nossa biodiversidade, e traduzir isso em novos mercados. Quando se fala dos desafios da cadeia de alimentos no futuro, isso se traduz em novos ingredientes, em proteínas alternativas”, comenta Paulo Silveira, coordenador do GTT, fundador do Food Tech Hub Latam. 

As proteínas alternativas são aquelas feitas à base de plantas, cultivadas a partir de células ou fermentação tradicional, biomassa ou precisão – técnica que utiliza microrganismos para produzir ingredientes específicos, que geram produtos análogos aos de origem animal, como carne, leite, laticínios, ovos e pescados. 

“O ramo de proteínas alternativas é parte do agro inovador e se apresenta como uma nova fonte de receita para o produtor rural, reforçando o protagonismo global que o Brasil já tem nesse setor” afirma Alysson Soares, especialista sênior do GFI.

O objetivo do grupo técnico de trabalho sobre o tema é formular uma sugestão de política pública em torno dos novos sistemas alimentares e ingredientes contemporâneos. A proposição deverá ser então avaliada pelo ministro da Agricultura e Pecuária, Carlos Fávaro – a perspectiva é que isso aconteça até o final de outubro. 

“O Brasil tem uma oportunidade única de se tornar um ator relevante nessa área. Não podemos deixar passar o ponto, de novo, de uma grande transformação e não participar dela. E sem plano, só participaríamos desorganizadamente”, afirma Silveira, que coordena o grupo. 

O plano já havia sido anunciado em primeira mão por Isabel Regina Carneiro, coordenadora de ambientes de inovação do Ministério da Agricultura, no evento “De Dubai a Belém: sistemas alimentares e ingredientes contemporâneos”, organizado pelo The Good Food Institute (GFI) Brasil e pela Universidade de Brasília (UnB) no início de abril. 

“Nós esperamos contar com representantes de todos os elos da cadeia produtiva. Estamos falando da agroindústria, dos pequenos aos grandes, do pessoal das universidades, institutos de ciência e tecnologia, do pessoal de fomento, como investidores e aceleradoras”, afirmou. 

Além da coordenadora, o encontro reuniu integrantes do governo para apresentar propostas e discussões envolvendo o mercado de proteínas alternativas e sua contribuição para a agenda verde da agricultura, dentro dos esforços para revisão dos compromissos brasileiros a serem apresentados na COP30 em 2025.

Segurança regulatória para as proteínas alternativas

Quando se trata de fomentar o segmento de proteínas alternativas – tanto por conta de seu potencial ambiental quanto econômico – um dos pontos frequentemente reiterados é justamente a necessidade de uma regulamentação que garanta mais segurança regulatória e jurídica ao setor. 

Isso porque, com regras melhor definidas, torna-se mais fácil investir e aperfeiçoar o mercado, garantindo alternativas ao consumidor que busca proteínas alternativas às de origem animal. Da mesma forma, a definição clara das regras a serem seguidas pelas empresas do setor em seus produtos – na composição nutricional e na rotulagem, por exemplo – ajudam a melhor informar o consumidor.

De acordo com Hugo Caruso, diretor da Divisão de Inspeção de Produtos de Origem Vegetal do Mapa, há a busca por conciliar os interesses do setor de proteína animal com o das proteínas alternativas – já que, em grande medida, eles não precisam ser opostos, mas coexistir. 

Um exemplo é a nomenclatura dos produtos. Segundo Caruso, se o hambúrguer de soja, por exemplo, fosse chamado de “disco de soja”, a regulamentação seria mais simples, mas poderia confundir os consumidores. Por isso, as embalagens constam que se trata de um “hambúrguer” de soja, mas que não substitui o hambúrguer de carne – um meio-termo para agradar aos dois lados.

“Se eu não utilizo o nome hambúrguer, eu tiro esse produto do mercado e as pessoas não sabem se aquilo é para ser utilizado como hambúrguer. Dentro dessa percepção, é que nossa proposta vem como uma tentativa de conciliar, uma coexistência desses produtos”, afirmou ele no evento organizado pelo GFI em abril.

Nesse sentido, a Anvisa aprovou, em dezembro, uma resolução para disciplinar o processo de comprovação de segurança e de autorização de novos alimentos e ingredientes. O marco regulatório garante diretrizes basilares para nortear a produção de proteínas alternativas, como a carne cultivada, garantindo mais segurança jurídica à indústria. As proteínas plant-based já possuíam regras anteriores.

Desenvolvimento sustentável

Para manter o passo e apontar com evidências o potencial da indústria de ingredientes contemporâneos, o GFI Brasil e o Instituto de Desenvolvimento Sustentável elaboraram o estudo “Proteínas Alternativas, Indicadores do Agronegócio e Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS)”.

A pesquisa mostrou a sinergia entre o modelo de ingredientes contemporâneos, como as proteínas de origem animal, e os indicadores de desenvolvimento sustentável, como a redução do desperdício e a alimentação saudável. Fomentar o setor é central para que o Brasil consiga avançar no cumprimento dessas metas de desenvolvimento sustentável. 

Um dos motivos é a pressão sofrida pela indústria tradicional de alimentos. O estudo menciona que a Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO) estima o crescimento da população mundial para 9,7 bilhões em 2050 e um aumento superior a 70% na demanda por alimentos. 

Essa mudança demandará alternativas viáveis para fazer frente ao aumento do consumo ao mesmo tempo em que é preciso se ater aos objetivos de um desenvolvimento sustentável no país.

“O sinergismo das proteínas alternativas e dos ODS é maior do que imaginávamos. Existem muitos fatores que nos levam a acreditar que a indústria das proteínas alternativas tem uma performance muito boa dentre os diversos setores da indústria de alimentos em geral”, afirma Luís Rangel, um dos autores do estudo e coordenador de Fomento, Promoção e Articulação Institucional do Ministério da Agricultura.

Rangel pontua que a indústria de ingredientes alternativos reduz a emissão de gases poluentes das cadeias alimentares, com destaque para o metano, que, na pecuária tradicional, é emitido via fermentação entérica. Além disso, o modelo permite a reutilização de subprodutos. 

E se a estimativa da FAO estiver correta, no futuro haverá uma busca por alternativas, o que permitirá à indústria de ingredientes alternativos – hoje ainda restrita diante de sua capacidade – possa crescer para além de nichos.