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Presidente do TST reclama de ‘visões preconceituosas’ sobre a Justiça do Trabalho

Na última semana, Gilmar Mendes, do STF, disse que Justiça do Trabalho tem uma ‘visão distorcida’ da sistemática de precedentes

TST, Lelio
Lelio Bentes, presidente do TST / Crédito: TST/Divulgação

Ministros do Tribunal Superior do Trabalho (TST) criticaram, em falas públicas e sessões realizadas na quarta (25/10) e nesta quinta-feira (26), o que chamaram de “equívocos que circulam na mídia”, “opiniões carregadas de preconceito” e “narrativa da imprensa” sobre um atrito jurisprudencial com o Supremo Tribunal Federal (STF).

O presidente do tribunal, Lelio Bentes Corrêa, enalteceu os feitos da Corte, enquanto a ministra e a ministra Maria Helena Mallmann afirmou que não há desrespeito em relação ao que Suprema Corte tem decidido.

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“Há de se recordar que, nos últimos quatro, cinco anos, o nosso país não conheceu uma paralisação em setores estratégicos como, por exemplo, aeronautas, controladores de voo, de forma que mais uma vez acredito que todos estejamos convencidos disso. Mas é importante reafirmar, em alto e bom som, diante de alguns equívocos que circulam na mídia, erros de perspectiva, visões preconceituosas, a Justiça do Trabalho é, sim, essencial à função democrática do Estado de Direito em nosso país”, disse o presidente.

No dia anterior, durante um evento, Corrêa se manifestou no mesmo sentido, ao afirmar que estamos em “um momento em que os voluntarismos avultam”.

“Opiniões externadas, carregadas de preconceito contra a Justiça do Trabalho e contra o Direito do Trabalho, negando os avanços que a sociedade brasileira evidenciou, a partir de 1943, com a introdução do nosso sistema jurídico da consolidação das leis do trabalho. A essas precipitações, a essas opiniões infundadas, penso que deva se contrapor uma postura equilibrada e baseada em evidências científicas que, sem sombra de dúvidas, corroboram a importância e a centralidade da Justiça do Trabalho na promoção dos direitos sociais”, declarou o ministro.

Mallmann seguiu a mesma linha. A ministra apresentou dados para demonstrar que não há desrespeito às decisões da Suprema Corte.

“Segundo os dados estatísticos do Portal da Transparência do STF, no ano de 2022, foram proferidas 9.420 reclamações, sendo que apenas 2.512 envolviam o ramo do direito do trabalho. Dessas, apenas 1.327 foram julgadas procedentes de forma parcial. Desse total, apenas 849 reclamações tinham como objetivo decisões oriundas do Tribunal Superior do trabalho”, enunciou.

A ministra disse que há uma “narrativa da imprensa, que é conhecida de todos nós, de que haveria uma tendência da Justiça do Trabalho de não respeitar as decisões do Supremo Tribunal Federal. Isso é a narrativa que está vindo dos veículos de comunicação. Eu fico preocupada com isso”.

A ministra acrescentou: “Levando em consideração apenas os processos julgados pelo Tribunal Superior do Trabalho, no ano de 2022, chega-se ao percentual de 0,19% que foram alvos de reclamações no STF. Eu trago esses dados para demonstrar que a narrativa da imprensa em relação ao fato de a Justiça do Trabalho não estar aceitando as decisões do Supremo não corresponde aos fatos”

As rusgas do STF com a Justiça do Trabalho

As manifestações dos ministros do TST vêm na esteira da tendência de o Supremo Tribunal Federal cassar decisões trabalhistas sobre vínculo empregatício, principalmente envolvendo profissionais contratados como PJ.

Nos últimos meses, os ministros têm derrubado decisões dos Tribunais especializados que reconheciam o vínculo de trabalhadores com empresas, sob o argumento de desrespeito a entendimentos do Supremo sobre a validade da terceirização.

Na avaliação do ministro Gilmar Mendes, a atuação da Justiça do Trabalho em relação ao reconhecimento de vínculos empregatícios tem ido em direção contrária a entendimento do STF e estaria deslocada da realidade fática do mercado de trabalho e da jurisprudência da Corte.

O ministro falou que há uma “visão distorcida” da Justiça do Trabalho sobre o sistema de precedentes, o que pode fazer com que o Supremo tenha que aferir “dezenas, quem sabe centenas de decisões”, que talvez façam com que o Supremo se torne uma “Corte Superior ou Suprema Justiça do Trabalho.”

Barroso, por sua vez, já falou em “indústria das reclamações trabalhistas”. O presidente do STF tem trabalhado para unificar jurisprudência e frear as reclamações trabalhistas na Corte.

Jurisprudência

A maior parte das reclamações são relacionadas ao Direito do Trabalho e contestam decisões da Justiça do Trabalho, que tem condenado empresas que contratam trabalhadores como terceirizados ou como PJ.

Nas decisões, os ministros afirmam que a Corte tem precedentes reconhecendo a possibilidade de haver contratação por regimes de trabalho que vão além da CLT. Esses entendimentos estão fundamentados na ADPF 324, na ADI 5.625 e no RE 958.252 (Tema 725 da Repercussão Geral).

Os magistrados do Trabalho, por sua vez, continuam a condenar empresas que contratam funcionários no esquema da pejotização e têm determinado que elas paguem os direitos trabalhistas, previstos na CLT, a esses trabalhadores.

Nesta quinta-feira (26/10), o JOTA revelou que a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) vê um risco fiscal na derrubada de decisões trabalhistas sobre pejotização pelo STF.

A Procuradoria reconheceu que a prestação de serviço por profissionais na modalidade PJ não é, por si só, considerada fraude à relação de emprego. Ainda assim, frisou não ser possível admitir que um contrato seja firmado apenas para driblar a legislação, sem se considerar a realidade.

“Tal artifício aniquilaria o dever que vincula profissionais liberais qualificados ao pagamento de imposto de renda e desfalcaria o caixa da Previdência social, afastando-se da incidência da contribuição social patronal”, explicou o procurador Carlos de Araujo Moreira, que assina a peça.

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