Duas ações que tratam de descontos em mensalidades de instituições de ensino superior durante a pandemia de Covid-19 estão com destinos diferentes no Supremo Tribunal Federal (STF).
Na Arguição de Preceito Fundamental (ADPF) 713, há maioria formada entre os ministros para julgar inconstitucionais as decisões judiciais que determinaram às instituições de ensino superior de todo o país a concessão de descontos lineares por causa da pandemia da Covid-19. No entanto, a decisão não produz efeitos automáticos em processos com decisão transitada em julgado.
Já na ADPF 706, o ministro Gilmar Mendes pediu destaque e a questão será analisada em plenário físico.
A ADPF 713 foi proposta pela Associação Nacional das Universidades Particulares (Anup) contra o conjunto de decisões judiciais, atos administrativos, atos normativos e projetos de atos normativos que tratavam sobre o desconto de preços de mensalidades escolares do ensino superior privado, por conta das medidas de isolamento social adotadas para o enfrentamento da pandemia da Covid-19. Decisões judiciais e leis locais chegaram a conceder descontos de até 50% no preço das mensalidades.
Já a ADPF 706 foi ajuizada pelos Conselho de Reitores das Universidades Brasileiras (CRUB) e questiona as decisões judiciais.
Nas duas ações, a relatora é a ministra Rosa Weber. Na ADPF 713, a maioria dos ministros acompanhou a relatora. Para ela, não são válidas as decisões judiciais fundamentadas apenas na eclosão da pandemia da Covid-19 e na transposição de aulas presenciais para ambientes virtuais, sem considerar as peculiaridades dos efeitos da crise pandêmica para as partes. Leia o voto na íntegra..
“Não vejo cautela e equilíbrio na imposição de descontos lineares pelos órgãos do Poder Judiciária. Embora haja, nitidamente, a intenção de amenizar situação de econômica crise gerada pela pandemia, a presunção de perda do poder aquisitivo de alunos e responsáveis, de um lado, e de recebimento de contraprestação muito superior ao serviço prestado, do outro, demonstra a falta de real mitigação dos efeitos da crise, que pode afetar, saliento, as duas partes contratantes, à míngua de política pública de assistência a determinados setores sociais e econômicos”, escreveu a ministra.
Weber também argumentou que o próprio Conselho Nacional de Educação, no parecer CNE/CP n.º 5/2020, distingue atividades presenciais e não presenciais, e recomenda a utilização das duas alternativas durante a pandemia.
No entanto, a ministra entendeu que o pedido de impugnação de atos administrativos e normativos estava genérico e que não cabe a uma ADPF contestar projetos de lei, em respeito à atividade legislativa. Assim como as leis estaduais devem ser discutidas em ação direta de inconstitucionalidade.
Já tinham acompanhado a relatora, até o fim da tarde desta sexta-feira (24/9), os ministros Alexandre de Moraes, Cármen Lúcia, Dias Toffoli, Roberto Barroso, Luiz Fux e Nunes Marques. Votaram pelo não conhecimento e pela improcedência das ADPFs 706 e 713 os ministros Edson Fachin e Ricardo Lewandowski. As ações foram ajuizadas , respectivamente, em junho e julho do ano passado.
Fachin entendeu que “restringir a tutela coletiva a condicionantes tipicamente individualistas é retroceder indevidamente a um modelo processual de restrição de acesso à justiça, cabendo às instâncias ordinárias proceder ao controle de eventuais decisões sem a devida motivação”. Para o ministro, a ação não poderia ser conhecida pelo Supremo e, se superada essa preliminar, ele entendeu pela improcedência do pedido das associações das universidades.
Para a questão, a relatora propôs a seguinte tese e ressaltou que ela deve levar em consideração os preceitos fundamentais da livre iniciativa, da isonomia, da autonomia universitária e da proporcionalidade.
“1. É inconstitucional decisão judicial que, sem considerar as circunstâncias fáticas efetivamente demonstradas, deixa de sopesar os reais efeitos da pandemia em ambas as partes contratuais, e determina a concessão de descontos lineares em mensalidades de cursos prestados por instituições de ensino superior.
2. Para a caracterização da vulnerabilidade econômica e da onerosidade excessiva em contratos de prestação de serviços educacionais de nível superior em razão da pandemia, é imprescindível a apreciação: (i) das características do curso; (ii) das atividades oferecidas de forma remota; (iii) da carga horária mantida; (iv) das formas de avaliação; (v) da possibilidade de participação efetiva do aluno nas atividades de ensino; (vi dos custos advindos de eventual transposição do ensino para a via remota eletrônica; (vii) do investimento financeiro em plataformas de educação remota, em capacitação de docentes e em outros métodos de aprendizagem ativa e inovadora que respeitem o isolamento social requerido para minorar a propagação viral; (viii) da alteração relevante dos custos dos serviços de educação prestados; (ix) da existência de cronograma de reposição de atividades práticas; (x) da perda do padrão aquisitivo da(o) aluna (o) ou responsável em razão dos efeitos da pandemia; (xi) da existência de tentativa de solução conciliatória extrajudicial”.
A maioria formada também deixou anotado que “a presente decisão não produz efeitos automáticos em processos com decisão transitada em julgado”.
A ADPF 713 está em plenário virtual até às 23h59 desta sexta-feira (24/9) e ainda há possibilidade de algum ministro pedir vista ou destaque.