O Supremo Tribunal Federal (STF) começou a julgar, na tarde desta quinta-feira (23/6), o recurso extraordinário com repercussão geral que discute se é constitucional norma da Corregedoria-Geral de Justiça que dispõe sobre a tramitação direta de inquérito policial entre o Ministério Público e a Polícia Civil sem o controle judicial prévio. A ação discute se esse ato normativo invade competência privativa da União por legislar sobre direito processual.
O debate ocorre no RE 660.814 e o julgamento foi interrompido por um pedido de vista do ministro Gilmar Mendes. Até o momento, três ministros se manifestaram. O relator, ministro Alexandre de Moraes, entendeu pela possibilidade de tramitação direta do inquérito policial entre MP e Polícia e os ministros Ricardo Lewandowski e André Mendonça divergiram.
Em seu voto, Moraes entendeu que o ato estadual que regulamenta a tramitação direta do inquérito é uma regra procedimental e não processual, portanto, não há invasão de competência privativa da União. Segundo a Constituição brasileira, apenas a União pode legislar sobre processo penal e civil. Moraes também defendeu que o inquérito é uma fase pré-processual e, dessa forma, não há uma ação penal. Por isso, para ele, o procedimento criado dá mais celeridade processual. De acordo com Moraes, 18 estados têm norma local sobre a tramitação direta.
Moraes fixou a seguinte tese: “É constitucional a tramitação direta do inquérito policial e dos procedimentos de investigação criminal previamente distribuídos ao juiz competente entre o MP e a polícia judiciária, a ser disciplinado por ato normativo competente do estado, uma vez que o inquérito policial tem competência administrativa”.
O ministro Ricardo Lewandowski pediu para adiantar o voto e se posicionou contrário a Moraes. Para ele, a norma é inconstitucional porque trata de processo, e, dessa forma, não poderia ser regulado pelo estado. Além disso, para Lewandowski, há invasão de reserva de jurisdição. “Não podemos abrir mão de um estrito controle da investigação policial”, afirmou o magistrado. O ministro André Mendonça também acompanhou a divergência. “A discussão parece pontual, mas é mais ampla. Lida com a tensão de eficiência do processo sancionador e garantia dos direitos individuais no âmbito do processo”, explicou.
Mendonça propôs que efeitos da decisão valham a partir do julgamento e propôs a seguinte tese: “O artigo 10, § 3º do Código de Processo Penal foi recepcionado pela Constituição Federal, assim, é inconstitucional, lei estadual ou norma administrativa de qualquer ente federativo que estipule a tramitação direta do inquérito policial entre o Ministério Público e a polícia judiciária”
Ação
No caso concreto, o recurso foi interposto pelo Sindicato dos Delegados de Polícia Judiciária Civil do Estado de Mato Grosso (Sindepo/MT) contra acórdão do Tribunal de Justiça estadual (TJ-MT) que manteve a validade da norma da Corregedoria-Geral de Justiça de Mato Grosso que regulamenta a tramitação direta de inquérito policial entre o Ministério Público e a Polícia Civil sem o controle judicial prévio.
O sindicato alega que as regras ofendem as Constituições estadual e federal ao estabelecer ilegítimo controle interno da Polícia Civil pelo Ministério Público. O autor da ação explica que a Constituição garante a independência e a autonomia da Polícia Civil, seja quanto à sua administração, seja no tocante à investigação das infrações penais. O Ministério Público, para o sindicato, pode requisitar a instauração do inquérito policial, mas não determinar o método de trabalho a ser seguido. Alega, por fim, que o provimento invade competência privativa da União ao legislar sobre matéria processual.