
Associações da indústria aeroespacial brasileira entraram com ação civil pública contra a Boeing sob a alegação de que a empresa coloca em risco a soberania nacional. A Boeing contratou nos últimos seis meses diversos engenheiros aeroespaciais com alta qualificação que fazem parte da Base Industrial de Defesa (BID). As associações pedem na Justiça que seja colocado um teto nas contratações.
A Associação Brasileira das Indústrias de Materiais de Defesa e Segurança (Abinde) e a Associação das Indústrias Aeroespaciais do Brasil (Aiab) alegam que a Boeing, com a contratação de engenheiros de empresas que fazem parte da BID, coloca em risco a soberania nacional.
Isso porque a BID é formada por companhias estatais ou privadas que têm como objetivo a constante atualização das tecnologias da Marinha, da Força Aérea e do Exército. Elas são a garantia de que a inovação e o desenvolvimento na área de Defesa estejam sob domínio nacional, resguardando a autonomia do Estado brasileiro.
Leonardo Bissoli, advogado no escritório Tojal Renault, responsável pela ação, explica que a Boeing tem dificuldade para encontrar engenheiros qualificados nos Estados Unidos. Com a Guerra da Ucrânia, a empresa fechou o escritório na Rússia e perdeu mais uma fonte de mão de obra. O Brasil foi a opção que restou.
Desde 2018, a Boeing tem informações sobre a Embraer, já que as duas empresas negociavam uma parceria para a criação de joint venture. Dias antes de selar definitivamente o acordo, que previa o pagamento de US$ 4,2 bilhões à Embraer, a Boeing rescindiu de maneira unilateral.
Segundo Bissoli, desde julho deste ano, a Boeing já contratou 200 engenheiros brasileiros. “Se olharmos por aspectos quantitativos, a Boeing não contratou tanto engenheiros assim, mas é preciso analisar a senioridade dos engenheiros e o fato de que essa é a área da economia com maior escassez de mão de obra”, afirma, completando: “Para se ter uma ideia, o Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA) forma somente 23 engenheiros aeroespaciais por ano”.
O advogado afirma que há estudos que demonstram que um profissional de engenharia aeroespacial qualificado gera uma cadeia de empregos de até 40 pessoas. Quando a Boeing contrata os profissionais, outras pessoas que dependem deles podem perder o emprego. “A Boeing visa a construir um grande escritório de projetos, ela não pretende gerar nada do começo ao fim. Ela só quer a mão de obra de engenharia para auxiliar no desenvolvimento do produto fora do país”, observa Bissoli.
Teto de contratação
A ação solicita que seja estabelecido um teto de contratação para a Boeing. “Em estudos técnicos, foi constatado que a rotatividade de profissionais em empresas de defesa aeroespacial gira em torno de 6%. Nós pedimos ao juiz que ele limite a contratação anual pela Boeing a 0,6% dos quadros de engenheiro”, explica Bissoli.
O pedido é para que o teto seja considerado a partir de julho de 2022. A empresa teria que pagar R$ 5 milhões a cada contratação que extrapolar o teto. “Ela vai vir aqui e gerar uma escassez de profissionais, então ela também tem que contribuir ainda que de uma forma mais contundente”, afirma o advogado. Bissoli observa que o teto considera somente as contratações diretas, ou seja, aquelas que contratem um profissional que se desligou dessas empresas de defesa em menos de seis meses da demissão.
O advogado afirma que a ação serviria como um freio para Boeing. “Se a União e todas as empresas do setor apoiarem a ação, ela ficará em um cenário bem hostil e mudará a forma de atuar”, observa.
Procurada para comentar a ação, a Boeing informou que não vai se pronunciar.