Apenas nove operadoras aceitaram os termos da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) para movimentação extraordinária de recursos no contexto da crise decorrente da pandemia do coronavírus. Dessa forma, o impacto financeiro no setor estimado em quase R$ 15 bilhões, sendo cerca de R$ 12 bilhões relacionados a ativos garantidores, diminuirá consideravelmente.
A agência reguladora divulgou, no fim da tarde desta terça-feira (28/4), o balanço das empresas que assinaram o termo de compromisso proposto, mas não informou o número de operadoras que estariam aptas a movimentar os recursos. Em fevereiro deste ano, dado mais recente disponível no site institucional, 1.212 tinham registro ativo na ANS.
O cenário de baixa adesão era esperado, uma vez que o texto do documento foi vazado ao mercado antes mesmo de ser votado pela diretoria colegiada, o que antecipou o recebimento de críticas vindas do setor. Após a divulgação do documento oficial, entidades representativas avaliaram publicamente que as contrapartidas exigidas pela agência eram desvantajosas.
O JOTA antecipou na sexta-feira (24/4), em conteúdo exclusivo para assinantes, que a ANS estudará novas propostas para as empresas, desde que haja a apresentação de dados que comprovem a necessidade de medidas para equilibrar o setor de saúde suplementar neste momento.
A proposta para desbloqueio dos ativos garantidores, principal medida para trazer liquidez e solvência ao mercado, é considerada superada pela agência. Até a semana passada, a avaliação interna diante da expectativa da baixa adesão era de que as empresas que realmente necessitavam aceitariam o termo de compromisso.
Ativos garantidores
A ANS havia estimado a liberação de até R$ 1,4 bilhão com a não exigência de ativos garantidores equivalentes à provisão de eventos ou sinistros a liquidar relacionados ao ressarcimento ao SUS (PESL SUS), com recomposição a partir de janeiro de 2021, e a movimentação de até R$ 10,5 bilhões equivalentes à provisão de eventos ocorridos e não avisados (PEONA), com recomposição a ser verificada no mês de agosto deste ano.
No acordo, a ANS também estabeleceu margem de solvência de 75% para as seguradoras e operadoras que não estão em fase de escalonamento para adesão ao modelo baseado em capital de risco, o que representaria uma redução de R$ 2,9 bilhões em exigência de capital.
Como esses recursos são vinculados às operadoras e variam, a depender do porte das empresas, o impacto financeiro será menor do que o previsto pela agência. O JOTA solicitou um novo cálculo nesta segunda-feira (27/4), mas não teve resposta até esta publicação.
As empresas que assinaram o termo de compromisso devem, como contrapartida, manter em dia o pagamento de serviços realizados entre março e junho deste ano pelos prestadores e garantir o atendimento aos beneficiários inadimplentes por meio de renegociação de contratos até 30 de junho. Entre os pontos criticados pelo setor, este último foi o que gerou maior impasse, pois foi visto como um incentivo à inadimplência.
Outras medidas devem começar a ser estruturadas depois do dia 30 de abril, data limite para a apresentação do Documento de Informações Periódicas das Operadoras de Planos de Assistência à Saúde (DIOPS) referente ao 4º trimestre de 2019. No dia 30 de maio será encerrado o prazo para o envio do documento relativo ao 1º trimestre de 2020. Por enquanto, a agência tem solicitado informações paralelas sobre o fluxo de caixa das operadoras.
Uma das propostas aventadas seria o adiamento do pagamento de multas para um alívio financeiro imediato. Todavia, o contexto de cobrança ainda precisa ser analisado, já que a conta deverá ser paga no futuro, que é incerto. Essa medida também precisará passar por avaliação jurídica.
Críticas
Enquanto a ANS adota uma postura cautelosa para apresentar soluções, por considerar que o período mais crítico ainda vai chegar, as entidades cobram celeridade com receio de que o socorro seja tardio.
“A gente entende a cobrança desses dados. O problema é que nessa crise você só vai ter dados daqui a três meses, aí não vai haver setor”, afirmou o superintendente-executivo da Associação Brasileira de Planos de Saúde (Abramge), Marcos Novais.
Para a diretora-executiva da Federação Nacional de Saúde Suplementar (FenaSaúde), Vera Valente, a proposta de movimentação de ativos vinculada à renegociação de contratos de inadimplentes não cumpre a função aguardada de garantir liquidez ao setor.
De acordo com ela, as operadoras são responsáveis por “irrigar” o sistema, destinando 85% do caixa para o pagamento de serviços dos prestadores, e seriam prejudicadas com a falta de pagamento dos beneficiários. “Esperamos que a ANS tenha a postura de se adequar às necessidades e de forma ágil”, disse.
Em nota divulgada na noite da última sexta-feira (24/4), a ANS ressaltou que a lei dos planos de saúde obriga a existência de contrapartidas favoráveis aos consumidores para a assinatura de qualquer termo de compromisso. “A composição de um acordo que só gere vantagens às operadoras não encontra amparo legal”, diz um trecho da nota.