O Ministério Público Federal (MPF) recomendou a retificação do edital do Concurso Nacional Unificado para incluir a reserva de 2% das vagas para pessoas transexuais na seleção para o cargo de auditor fiscal do trabalho. O Concurso Nacional Unificado prevê apenas cotas para pessoas negras (20%), pessoas com deficiência (5%) e, no caso específico do concurso da Funai, 30% para indígenas.
O MPF sustenta, no entanto, que houve, em julho de 2023, promessa de ação afirmativa também para pessoas trans, mas não se confirmou no edital, publicado no dia 10 de janeiro.
Segundo a recomendação do MPF, a não inclusão das cotas para pessoas trans implica em contradição em relação a declarações anteriores de autoridades federais. Em junho de 2023, o presidente Lula afirmou que 2% das vagas do próximo edital para o cargo de auditor fiscal do trabalho seriam reservadas para pessoas trans. Posteriormente, no mesmo mês, o ministro do Trabalho e Emprego, Luiz Marinho, confirmou a reserva de 2% das 900 vagas para o certame.
Segundo o MPF, houve quebra da confiança depositada pela população nas declarações gera consequências jurídicas para o Estado. O órgão defende que a vedação de comportamentos contraditórios alcança a Administração Pública e que ela também se sujeita às limitações criadas em razão da sua própria atuação, por meio da prática de condutas que devem ser cumpridas.
No documento, os procuradores regionais dos Direitos do Cidadão, Martha Figueiredo e Lucas Costa Almeida Dias, ressaltaram que a “implementação de cotas para grupos sociais submetidos a quadros de violência e discriminação histórica possui respaldo no ordenamento jurídico-constitucional brasileiro e não possui como requisito de validade a prévia criação por meio de lei específica”.
Os procuradores citam, no documento, o entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF) na ADPF 186, que reconheceu a constitucionalidade de atos administrativos da Universidade de Brasília (UnB) que estabeleceram cotas étnico-raciais. Ainda, mencionam outros órgãos que já implementaram as cotas para pessoas trans, por meio de atos próprios, como a Defensoria Pública do Estado de São Paulo, o Ministério Público do Trabalho e o Ministério Público da União.
Em nota técnica, publicada nesta quarta-feira (17/1), a Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC), órgão do MPF, defendeu a adoção e cotas para pessoas transgênero em universidades e concursos públicos. Para a PFDC, a medida é necessária para reduzir as desigualdades enfrentadas pela população trans no acesso à educação e ao mercado de trabalho.
A recomendação foi encaminhada pelo MPF à Comissão de Governança e ao Comitê Consultivo, comitês responsáveis pela governança do CNU. Foi fixado um prazo de 72 horas para que os comitês informem se acatarão a recomendação, tendo em vista o início das inscrições para o certame na próxima sexta-feira (19/1).
Ministra da Gestão diz que segue a lei
Questionada sobre a possibilidade de ampliar as cotas do Concurso Nacional Unificado também para as pessoas transexuais, em entrevista na manhã desta quarta-feira (17/1) ao programa “Bom dia, ministra”, da EBC, a ministra da Gestão e da Inovação, Esther Dweck, explicou que esse segmento não está contemplado na atual legislação e, por isso, ficou de fora.
Em entrevista à newsletter Por Dentro da Máquina, do JOTA, o subconsultor-Geral da União de Gestão Pública, Ivan Santos Nunes, alertou, em dezembro, que o tema de cotas poderia ser um dos principais focos de judicialização do certame.
“A gente está adotando as cotas que hoje estão na legislação. Em relação às outras cotas, a gente está pensando nelas, tentando estruturar. A gente tem discutido no Congresso um novo PL de Cotas no serviço público, onde a gente pensa em ampliar para outros grupos minorizados, pessoas com dificuldades para entrar no mercado de trabalho. Porém, nesse concurso, a gente tá pensando nas cotas que estão na legislação”, afirmou a ministra Esther Dweck.