A Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe) divulgou nota em que afirma “demonstrar preocupação com a escalada de ataques pessoais a ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), em especial, ao ministro Kassio Nunes Marques que recentemente foi alvo de críticas contundentes e desproporcionais”. A entidade de classe representativa da magistratura federal brasileira divulgou nota rebatendo texto da Associação Brasileira de Imprensa (ABI), que defendeu a liberdade de expressão e o professor da USP Conrado Hübner Mendes, alvo de uma representação do ministro à PGR para investigar crimes contra a honra.
Ao se posicionar contra o ofício dirigido ao professor, que é colunista da Folha de S.Paulo, a ABI chamou Marques de “o ministro de estimação do ainda presidente Jair Bolsonaro” e diz que ele não leu o voto da colega de plenário ministra Cármen Lúcia em defesa da liberdade de expressão.
Relatora da ação direta de inconstitucionalidade (ADI) 4.815, ela julgou inconstitucional a exigência de autorização prévia para a publicação de biografias. Afirmou, ainda, que eventuais danos devem ser corrigidos a posteriori. “Cala a boca já morreu. É a Constituição do Brasil que garante”, disse a ministra, no caso sempre lembrado nas discussões sobre liberdade de expressão.
A investigação solicitada por Nunes Marques foi motivada por artigo publicado na Folha de S.Paulo pela atuação judicial convergente, segundo o texto, com a agenda política do presidente da República, especialmente no caso que envolveu a proibição de cultos religiosos durante a pandemia.
No artigo O STF come o pão que o STF amassou, o professor da USP chama Nunes Marques de “chicaneiro” e diz que “autocratas precisam de tribunais servis. Há técnica para isso: aposentar juízes, aumentar número de cadeiras e ocupá-las com apologistas ou comprá-los. O STF oferece ao autocrata a alternativa peculiar do “basta um”: basta um Kassio Nunes para paralisar o tribunal. Se completar com um André Mendonça ou Augusto Aras, melhor ainda. O “soldado e o cabo” não vestem farda”.
O próprio Aras já havia ajuizado, poucos meses antes, uma ação penal privada contra Mendes por crimes contra honra. Da mesma forma que o ministro Nunes Marques, o PGR não aceitou as críticas contra a postura tida por omissiva diante do governo de Jair Bolsonaro. Em artigo publicado no JOTA, o professor e advogado constitucionalista Daniel Sarmento alertou: “É muito importante que essas iniciativas não prosperem, pois elas não atingem apenas o réu e investigado, mas a toda a democracia brasileira.”
Por outro lado, a Ajufe ressaltou a “necessidade de proteção das instituições da República e demonstrar preocupação com a escalada de ataques pessoais a ministros do STF, em especial, ao ministro Kassio Nunes Marques que recentemente foi alvo de críticas contundentes e desproporcionais”.
De acordo com a entidade, a crítica ao Poder Judiciário é bem-vinda, inclusive quando aponta limitações, equívocos ou falhas, já que, com ela, é possível avançar na construção e aperfeiçoamento da institucionalidade. “Contudo, essas críticas não podem jamais descambar para ataques contra a honra de magistrados.”
“Para a Ajufe, a liberdade de imprensa é essencial para a democracia, mas não pode ser considerada absoluta. É importante destacar que a liberdade de expressão está sujeita a limites legais, sendo direito de qualquer cidadão, inclusive dos agentes públicos, defender sua honra, quando entender que foi violada”, disse.
Ainda segundo a entidade, a ABI tem histórico equilibrado, mas a nota em defesa de Conrado Mendes contraria esse passado. “A ABI é reconhecida e respeitada pela defesa da democracia e dos direitos fundamentais no Brasil. Infelizmente, esse posicionamento agressivo não condiz com o perfil da entidade.” A Ajufe diz que a imprensa e as instituições são pilares da República e não devem rivalizar na defesa da democracia e da justiça.
Já a ABI destacou que, “assim como já havia feito o procurador-geral da República, Augusto Aras, a iniciativa do ministro Kássio Marques tem o objetivo exclusivo de intimidar o colunista Conrado Hübner e, por extensão, todos os jornalistas, pois, embora figuras públicas não aceitam receber críticas”.