Integrante da 3ª Turma da Câmara Superior de Recursos Fiscais do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), Tatiana Midori Migiyama foi indicada pela Confederação Nacional das Instituições Financeiras (CNF). Bacharela em Ciências Contábeis pela FEA-USP e em Direito pela Faculdade Metropolitanas Unidas, Migiyama é pós-graduada em Direito Tributário pelo IBET, tem especialização em Mediação, Conciliação e Arbitragem pela FGV e é professora convidada da FIPECAFI, PUC/RS, IET, IBDT e APET.
A conselheira Tatiana Midori Migiyama considera o Carf um órgão importantíssimo para a sociedade, por possibilitar ao contribuinte recorrer gratuitamente e discutir atos da autoridade fiscal e matérias tributárias, tendo à disposição julgadores técnicos apreciando seus recursos de forma imparcial.
O Carf, afirma Tatiana Midori Migiyama, “surgiu com o intuito de se representar a justiça social no âmbito administrativo tributário, tendo, por consequência, composição paritária (metade do colegiado com conselheiros representantes da Fazenda Nacional e a outra, com conselheiros dos contribuintes)”.
Para Tatiana Midori Migiyama, “o desenvolvimento da nação pode ser provocado por vários estímulos, dentre eles tecnológicos, industriais, políticos e, entre outros, pelo sentimento de justiça social. O que o Carf, por ser um órgão paritário, inegavelmente contribui para o desenvolvimento da sociedade”.
Uma discussão que a conselheira considera interessante de analisar é a se as “indenizações” (lucros cessantes ou não x dano emergente) teriam a natureza de receita para fins de tributação pelo PIS e Cofins.
Em seu tempo livre, Tatiana Midori Migiyama gosta de assistir filmes, séries orientais, frequentar aulas de culinária japonesa, viajar, cozinhar e ler. Diz não entender muito de futebol, mas torcer para o Brasil durante as Copas do Mundo.
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Ficha-técnica de Tatiana Midori Migiyama
Formação: Bacharela em Ciências Contábeis e em Direito. Contadora e advogada licenciada.
Alma mater: Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade – FEA/USP e Faculdade Metropolitanas Unidas/SP.
Vida acadêmica: Pós-graduada em Direito Tributário/IBET. Especialização em Mediação, Conciliação e Arbitragem – FGV. Coordenadora de Seminários e Cursos na Área de Mercado Financeiro e de Capitais. Compliance. Professora convidada da FIPECAFI, PUC/RS, IET, IBDT e APET.
Origem da indicação: Conselheira representante dos contribuintes indicada pela Confederação Nacional das Instituições Financeiras – CNF.
Time do coração ou hobby: Não sou uma boa entendedora de futebol, mas sempre torço para o Brasil na Copa do Mundo. Tenho como hobby assistir filmes, séries orientais, aulas de culinária japonesa, passear, viajar, conversar com amigos, cozinhar e ler.
As decisões da conselheira
Qual foi o voto mais inovador que proferiu?
Dentre os mais de 700 acórdãos em que tive a oportunidade de formalizar meus votos, desconsiderando os que eu havia sido designada como redatora do voto vencedor, acredito ser difícil destacar somente um, eis que algumas matérias, a depender do tributo em debate, poderá ter ensejado uma desenvoltura dialética mais flexível. Todavia, é de se mencionar o acórdão 9303-010.944, onde tive a oportunidade de manifestar meu pensamento em voto vista que, por sua vez, foi refletido em declaração de voto constante daquele acórdão.
Naquele caso, discutíamos o prazo decadencial para se imputar responsabilidade para determinada pessoa física. Explanei o meu entendimento de que “se o lançamento tiver sido feito apenas em nome de um dos devedores solidários, o prazo de prescrição estava em curso apenas contra ele e, por isso, só se interrompe em relação a ele. Contra os demais devedores solidários continua correndo o prazo de decadência, já que, em relação a eles, não houve a ‘constituição do crédito tributário’. O que, por conseguinte, em relação a eles, não há que se falar em interrupção de prescrição, nem de decadência.”
Por se tratar de matéria ainda não apreciada pelo Judiciário e o Carf seguir com posicionamentos diferentes, esse direcionamento constante de minha declaração de voto, ainda que inovador no mundo jurídico, é o que acredito, com a devida vênia aos que pensam diferente, conferir racionalidade processual no âmbito tributário, em respeito à observância do devido processo legal.
Qual foi o caso mais importante em que seu posicionamento se tornou o entendimento do colegiado?
Ainda que o colegiado não tenha novamente apreciado o conhecimento de Recurso Especial com os mesmos arestos indicados como paradigma, proveitoso mencionar o entendimento proferido no acórdão 9303-007.849, que se direcionou pelo não conhecimento do recurso especial, eis que acredito que poderá ser acompanhado em futuras discussões semelhantes. Naquela ocasião, destrinchamos as operações societárias para nos direcionarmos ao não conhecimento do recurso, vez que constatamos que os acórdãos indicados como paradigma trataram apenas da operação denominada desmutualização, e não das operações de incorporação de ações e resgate de ações.
O cerne da referida lide não era a tributação da receita de venda de ações após a operação de desmutualização, mas o valor relativo às ações incorporadas, bem como se o ato societário que se resume em incorporação de ações seria atividade típica das Instituições Financeiras. Essas operações, muitas vezes, causam confusão, se atermos aos autos de infração e julgamentos no processo administrativo fiscal.
Qual foi o caso mais difícil de formar sua convicção?
Independentemente do mérito da discussão, considerando preceitos e regras processuais, é de se mencionar o caso envolvendo a “exclusão do ICMS na base de cálculo do PIS e Cofins”, após a decisão dada pelo STF, quando da apreciação do RE 574.706, em sede de repercussão geral – julgamento que ocorreu no CARF antes de o STF se manifestar a respeito dos embargos opostos pela Fazenda Nacional.
Tanto é assim que apresentei declaração de voto ao acórdão 9303-008.945 à época, expondo que no CARF existiam 5 posicionamentos diferentes: (i) acórdão 3402-006.217, aplicando o entendimento do STJ dada em sede de repetitivo quando da apreciação do REsp 114469/PR, em respeito ao art. 62 do RICARF/2015; (ii) acórdão 3302-006.898, que aplicou a Solução de Consulta Cosit 13/2018, com restrição ao crédito de PIS e Cofins; (iii) 3402-006.283, que se direcionou pelo sobrestamento do processo até decisão definitiva do RE 574.706/PR; (iv) 3402-002.174, que converteu o julgamento em diligência para que a unidade de origem mensure o ICMS a ser excluído da base de cálculo das contribuições; (v) acórdão 3201-004.124, que aplicou a decisão dada pelo STF quando da apreciação do RE 574.706 que, a rigor, entendeu que o ICMS a ser retirado da base das contribuições seria o ICMS constante da Nota Fiscal de saída.
Vê-se que a demora na apreciação dos embargos de declaração opostos pela Fazenda em face do acórdão do RE 574.706, bem como o posicionamento antecipado da Receita Federal do Brasil, gerou insegurança jurídica à sociedade – provocando, inclusive, sugestão de dispositivo (inclusão do §4º ao art. 62, Anexo II) à minuta do RICARF:
“§ 4º A decisão pela afetação do tema nos termos dos arts. 543-B e 543-C da Lei nº 5.869, de 1973, ou dos arts. 1.036 a 1.041 da Lei nº 13.105, de 2015 – Código de Processo Civil, não permite o sobrestamento de julgamento de processo administrativo fiscal no âmbito do CARF, ressalvados os casos em que houver acórdão de mérito proferido pelo Supremo Tribunal Federal ainda não transitado em julgado, ou, no caso de matéria exclusivamente infraconstitucional, se houver acórdão de mérito proferido pelo Superior Tribunal de Justiça na mesma condição.” Importante trazer que nas sessões de agosto, julgamos essa matéria de forma favorável ao contribuinte, aplicando, finalmente, o decidido pelo STF.
Qual foi o caso em que seu voto teve mais força para pacificar uma discussão?
Considerando que as decisões são dadas pelo colegiado, e não somente por um conselheiro, irei me permitir não me manifestar invocando um voto específico, eis que todos os conselheiros, quer sejam, representantes da Fazenda Nacional e dos contribuintes, sendo imparciais, enriquecem as discussões, inclusive, buscando pacificá-las em respeito à segurança jurídica – que tanto se espera no mundo jurídico.
Releva-se que os direcionamentos sofrem alterações por mudança no colegiado. Podemos considerar nesse sentido, com a nova composição, as recentes decisões favoráveis ao contribuinte envolvendo, por exemplo, a discussão da vinculação física no regime de drawback, equiparação de compensação e dedução de crédito para fins de contagem do prazo decadencial e para aplicação da denúncia espontânea. Bem como o relevante julgado acerca da possibilidade do direito ao crédito das contribuições não cumulativas ao PIS e Cofins sobre fretes na aquisição de produtos sujeitos ao regime monofásico, matérias em que já havia me manifestado de forma condizente com as recentes decisões.
Qual foi o caso mais marcante em que você foi voto vencido?
Na minha percepção, posso citar dois: (i) o caso consignado no acórdão 9303-008.341 envolvendo o processo do grupo Silvio Santos Participações – inerente à operação com o Banco Panamericano. Naquela sessão de julgamento, houve controvérsia quanto ao conhecimento do recurso e ao mérito – perdão de dívida, tendo sido resolvido por voto de qualidade desfavoravelmente ao contribuinte; (ii) o caso tratado no acórdão 9303-006.236, que tive a oportunidade, com a devida vênia ao nobre relator à época, de apresentar declaração de voto expondo meu entendimento. Naquela ocasião discutimos se as receitas financeiras oriundas das reservas técnicas, fundos especiais e provisões seriam computadas na base de cálculo das contribuições, quando se tratar de sociedades seguradoras.
Qual é a discussão que adoraria ter a oportunidade de participar como julgador?
Não avisto, no momento, uma discussão específica, pois, independentemente da tese invocada pelo sujeito passivo ou pela Fazenda Nacional, considerando a aplicação do formalismo moderado pelo Carf, diferentemente do Poder Judiciário, e o respeito à busca pela verdade material, as matérias postas em debate tornam-se diferentes e interessantes – sendo grandes incentivadores e motivadores para optarmos por continuar no Carf.
Percebo ainda que, independentemente do valor e da matéria ou da repercussão que a decisão tomada pelo colegiado poderá causar à sociedade, todas as discussões devem ser igualmente niveladas, concedendo a mesma oportunidade para as partes e com apoio de argumentos sólidos e fundamentos técnicos. Devemos nos manter imparciais, não julgando melhor ou pior, somente considerando o tema ou o valor do processo. Mas posso adiantar que uma discussão interessante seria analisar se “indenizações” (lucros cessantes ou não x dano emergente) teriam a natureza de receita para fins de tributação pelo PIS e Cofins.
Visão de mundo de Tatiana Midori Migiyama
Qual é o papel do Estado e do seu trabalho no desenvolvimento da nação?
O Estado tem o papel fundamental de definir recursos, quer sejam financeiros, administrativos ou regulamentares, que serão destinados e priorizados para determinado setor (saúde, infraestrutura, educação, social, etc), massa/segmentos da sociedade, estados, etc. Possui, em síntese, o poder administrativo dos Estados membros com observância das limitações constitucionais, visando o equilíbrio econômico e social no país e incentivando e regulando seu desenvolvimento, inclusive no âmbito internacional.
Quanto ao papel público que atualmente exerço, em vez de injustamente enaltecer o meu trabalho individual no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais – Carf do Ministério da Economia – ME, pretendo me direcionar à relevância do órgão julgador. O Carf é um órgão importantíssimo para a sociedade, pois possibilita, de forma gratuita, ao contribuinte recorrer e discutir, com formalismo moderado, atos da autoridade fiscal e, no mérito, matérias tributárias, tendo à disposição julgadores técnicos, de idoneidade comprovada, apreciando seus recursos de forma imparcial.
Cabe mencionar ainda que esse órgão surgiu com o intuito de se representar a justiça social no âmbito administrativo tributário, tendo, por consequência, composição paritária (metade do colegiado com conselheiros representantes da Fazenda Nacional e a outra, com conselheiros dos contribuintes). Sendo assim, o Carf tem o intuito de refletir a justiça social no processo administrativo tributário e assegurar, com a tecnicidade de suas decisões, a segurança jurídica às partes – Fazenda Nacional e contribuintes. O desenvolvimento da nação pode ser provocado por vários estímulos, dentre eles tecnológicos, industriais, políticos e, entre outros, pelo sentimento de justiça social. O que o Carf, por ser um órgão paritário, inegavelmente contribui para o desenvolvimento da sociedade.
Pertinente trazer ainda, considerando a justiça social mencionada anteriormente, o aumento do número de mulheres conselheiras no Carf, se considerarmos o período de 2009 até o momento. Porém, depreendendo-se da análise do “quem é quem” disponível no sítio do órgão, temos que, em quase todas as turmas ordinárias e especiais, o número de mulheres no órgão ainda é menor em comparação ao de conselheiros homens. Mas, inegável o progresso que ocorreu ao longo do tempo. Quanto à diversidade, acredito que o Carf tem contribuído de forma significativa para a equidade social, promovendo acesso de conselheiros com diferentes culturas e raças. Nesse quesito, fico lisonjeada por ser a primeira mulher descendente de japonesa a compor a Câmara Superior de Recursos Fiscais. O que já adianto que toda mulher consegue se posicionar e se fazer ouvir, sem perder sua feminilidade e essência ou alterar o tom de voz. A importância da voz das mulheres está justamente nas palavras e argumentos e não na forma como ela é dita.
Quais julgamentos e decisões de que você não participou como julgador marcaram sua vida profissional até hoje?
Certamente as decisões envolvendo a aprovação das súmulas do Carf pelas turmas da Câmara Superior de Recursos Fiscais – CSRF, antes de estar como conselheira titular da 3ª Turma da CSRF ou quando os enunciados ainda estão sendo discutidos no âmbito do STF ou STJ, em sede de repercussão geral ou de repetitivo. Eis que, por força do art. 62, Anexo II, do RICARF/2015, somos obrigados, como conselheiros, a observá-las nos julgamentos dos recursos especiais, ressalvados os casos que entendemos não serem aplicáveis – situação em que deveremos apresentar para o “distinguishing” argumentações/fundamentos para o afastamento do enunciado.
Quem são as pessoas que te inspiram (pessoalmente e profissionalmente)?
Muitas pessoas me inspiram todos os dias através de atitudes, pensamentos, inteligência, esforço e, principalmente, caráter.
No lado pessoal, considerando minha trajetória de vida, originalmente sem suporte financeiro, paternal e emocional, com a nitidez de recordações sofridas, percebo que vários anjos surgiram em minha vida e que, até hoje, me inspiram. Posso mencionar meus irmãos Katy e Frank, meu filho Bruno, meus amigos e pessoas que fizeram parte de cada momento de minha vida – o que irei abster de citá-los, pois são muitos.
No âmbito tributário, posso mencionar os professores Luciano Amaro, Marcos Takata, o saudoso Mitsuo Narahashi, Humberto Ávila, Ricardo Mariz, o amigo Denis Aquino e a admirável Misabel Derzi. Mas, ainda assim, estou fazendo injustiça, pois há muitos outros professores e colegas que me inspiram e mereceriam ser apontados. No direito contábil, os professores Eliseu Martins, Nelson Carvalho e Ariovaldo dos Santos. No acadêmico, os professores José Maria Arruda de Andrade, Marcelo Magalhães, Valter Lobato, Leonardo Branco, Alexandre Evaristo Pinto, Arthur Ferreira Neto, Jimir Doniak Jr, etc.
Quais são os livros e referências que não saem de cima da sua mesa?
Atualmente:
- Gelbcke, Ernesto Rubens. Santos, Ariovaldo dos Santos. Iudícibus, Sérgio de. Martins, Eliseu. Manual de Contabilidade Societária aplicável a todas as sociedades (De acordo com as normas internacionais e do CPC). 3ª Edição. São Paulo. Atlas: 2018;
- Bianco, João Francisco Bianco (coordenador). Regulamento do Imposto de Renda – RIR/2019. São Paulo. Thomson Reuters. Revista dos Tribunais;
- Borges, José Souto Maior. O contraditório no Processo Judicial (uma visão dialética). São Paulo. p.30. Malheiros Editores, 1996;
- Borges, José Souto Maior. Ciência Feliz. São Paulo. Quartier Latin, 2007;
- Walsh, William Thomas. Nossa Senhora de Fátima. São Paulo. Quadrante, 2017.