O Brasil é um dos países de maior potencial em inovação – especialmente na posição de nação emergente e latino-americana –, mas as soluções não têm conseguido chegar ao setor público. A avaliação é do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), que tem como uma das frentes a digitalização dos municípios brasileiros. Junto com o Tribunal de Contas da União (TCU), o BID lançou um estudo para orientar compras públicas de inovação por instituições públicas – e propor ajustes aos processos atuais.
Dificuldades para adquirir novas tecnologias sem deixar escapar os requisitos necessários às contas públicas são identificadas como barreiras que travam a adoção de novas tecnologias. As recomendações do BID – para que gestores públicos consigam ter acesso a soluções e empresas de inovação façam negócios também com governos – foram adiantadas ao JOTA.
Há ainda outra lógica para a urgência que o banco de desenvolvimento enxerga em virar essa situação: sem avanço tecnológico, a população não tem acesso a serviços públicos com as mesmas condições com que se conecta a serviços privados. Isso fortalece as desigualdade entre aqueles que dependem do setor público e os que têm outas alternativas.
Seguindo a diversidade de contextos regionais que o país comporta, a adoção de novas tecnologias por governos de dimensões variadas também é desigual e um desafio para o avanço do país como um todo nessa área. A questão é que, frequentemente, os recursos não estão sendo aplicados
A percepção de risco em relação aos órgãos de controle é identificada como um entrave para gestores públicos nas compras de inovação. O apego ao menor preço como principal critério de julgamento, a necessidade de justificar a própria conduta perante os órgãos de controle e a aversão à assunção de riscos seriam algumas das razões para que gestores tenham práticas defensivas.
Assim, as contratações de tecnologia emperram e instrumentos de cooperação público-privada deixam de ser usados. Segundo o estudo, essa insegurança decorre menos de penalizações por controladores, e mais do receio de atrair questionamentos ao fazer contratações menos comuns na administração pública. A proposta para mitigar isso é que contratações públicas de inovação sejam interpretadas e aplicadas separadamente da legislação que rege as compras públicas em geral.
Além disso, as contratações de inovação por órgãos públicos deveriam priorizar caminhos que gestores e órgãos de controle tenham familiaridade. Uma possibilidade apontada seria estruturar um fluxo comum de planejamento prévio para contratações de inovação com indicação de boas práticas, como consultas públicas e formação de grupos de especialistas. A mesma rota poderia ser usada em diferentes tomadas de decisão.
Nesse sentido, a Nova Lei de Licitações, sancionada neste ano, correria o risco de não ser capaz de dinamizar as compras públicas de inovação. O banco de desenvolvimento defende a delimitação da responsabilidade do gestor público por práticas que possam vir a ser consideradas irregulares pelos órgãos de controle seguindo a interpretação da Lei 13.655/2018, que trata de direito público.
A interpretação é que a responsabilidade do gestor público por decisões e opiniões técnicas se limitaria a casos de dolo e erro grosseiro. Assim, “uma aplicação mais intensa da norma” por Tribunais de Contas e Controladorias poderia contribuir para dissipar as incertezas na aplicação da nova lei.
“Estamos preocupados com os mais de 5 mil municípios que entregam as políticas na ponta e percebemos que grande parte das ineficiências e irregularidades são resultado de desorientação, que o TCU poderia dar suporte. Eles precisam de metodologia para atender necessidades dos cidadãos, mais do que punição”, afirma Adriano Amorim, secretário-geral da Presidência do Tribunal de Contas da União (TCU).
Entre as recomendações para que as ideias cheguem à população, estão o estímulo de sinergia entre os setores científico e produtivo para inovar em certos setores. Um exemplo seriam os “selos de excelência” da União Europeia, conferidos pelo fundo de pesquisa e inovação do bloco para que projetos de grande potência que não puderam ser financiados na rodada possam receber atenção de outras fontes de recursos. Durante a pandemia de Covid-19, centenas de empresas europeias com propostas de saúde receberam o destaque.
A falta de diversidade e estabilidade de recursos para o financiamento de ciência e tecnologia seria outro problema. A sugestão seria aperfeiçoar a legislação de fundos patrimoniais e estimular que universidades e instituições públicas criem iniciativas para financiar atividades de pesquisa, como já fazem algumas universidades. Porém, atualmente a legislação sobre o tema, aprovada em 2019, não permite que as doações feitas possam usufruir de benefícios fiscais, o que desestimularia repasses.
Outra lacuna seria a cooperação público-privada para desenvolvimento de tecnologias. E a proposta seria consolidar modelos diferenciados de gestão de instituições públicas de pesquisa por Organização Social e Serviço Social Autônomo, figura privada que poderia equilibrar e trazer maior flexibilidade de atuação com regras de transparência. Isso dependeria de legislações locais permitirem esse tipo de arranjo.