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Acesso ao tratamento para fibrose cística depende de incorporação ao SUS

Discutida em consulta pública da Conitec, adoção de terapia tripla pode atingir 1,7 mil pacientes no Brasil

Foto: Unsplash

Um dos tratamentos com maior taxa de sucesso para fibrose cística aguarda indicação da Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde (Conitec), ligada ao Ministério da Saúde, para ser ou não incorporado ao SUS. Antes de dar a palavra-final, o órgão levará em conta as contribuições coletadas na consulta pública sobre o tema, que se encerra nesta terça-feira (13/6). 

Combinação de três medicamentos de nova geração (o elexacaftor, tezacaftor e o ivacaftor) para a fibrose cística, criado e distribuído pela farmacêutica Vertex é um dos únicos capazes de atuar na causa da doença e não nos sintomas. A estimativa é que ele melhore a qualidade de vida dos pacientes e seja capaz de expandir a expectativa média de vida deles de 18 a quase 50 anos. 

Conhecida antigamente como “a doença do beijo salgado”, a fibrose cística é uma doença genética considerada rara que pode ser detectada desde o nascimento com o famoso teste do pezinho.

“Ela é rara por ser de baixa incidência na população, mas dentre as doenças que se encaixam nessa categoria, ela é uma das mais comuns”, explica Neiva Damaceno, especialista de um dos maiores centros de referência da doença no país, na Santa Casa de Misericórdia de São Paulo.

Nesta quarta-feira (14/6), a Casa JOTA recebe especialistas e gestores públicos para discutir a incorporação do tratamento contra a fibrose cística

Segundo dados do Ministério da Saúde, estima-se que existam 70 mil pacientes portadores da fibrose cística no mundo. No Brasil, o número oficial gira em torno dos 7 mil. 

Os nascidos com essa condição apresentam uma falha no gene CFTR, que dá as instruções necessárias para a célula produzir a proteína de mesmo nome, responsável por controlar o transporte de íons – como cloro e sódio – através das membranas das células.

Com isso, há um defeito sistêmico no corpo do paciente no transporte de diversos sais e água. Como consequência, é produzido um muco grosso e pegajoso que afeta, principalmente, o sistema respiratório e o gastrointestinal.

“Com esse muco espesso no pulmão, o paciente fica muito mais propenso a desenvolver doenças no trato respiratório, por exemplo. Já no pâncreas, há uma falta de produção de enzimas digestivas”, conta Damaceno.

Essas consequências possuem tratamento protocolado no SUS envolvendo fisioterapia, inalação de antibióticos, cápsulas de reposição enzimática, entre outros. “No entanto, tudo isso vai tratar apenas os sintomas da doença, não o problema que os causa”, afirma a médica.

O tratamento padrão é capaz de melhorar a sobrevida dos pacientes, mas com limitações relevantes e perda de qualidade.  “Os pacientes perdem de duas a três horas por dia fazendo inalações, por exemplo”, explica o coordenador da comissão de Fibrose Cística da Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia, Rodrigo Athanázio.

“Com a terapia tripla e outros moduladores de CFTR, tivemos uma revolução. Eles são capazes de se conectar à proteína alterada no organismo e fazer com que ela atue de forma normal”, afirma ele.

De acordo com estudos clínicos realizados entre 2018 e 2019, o medicamento trouxe uma melhora de 14% nas funções pulmonares e uma diminuição de 60% nos resíduos pulmonares expelidos.

“Há uma melhora completa dos sintomas, o paciente volta a ganhar peso, melhora na capacidade pulmonar, só não podemos chamar de cura porque ele precisará fazer uso do medicamento pelo resto da vida”, explica Athanázio.

“Nos meus 40 anos de experiência com a doença, esse é o mais próximo de um milagre que já chegamos. Os pacientes dizem que não conseguem imaginar a vida deles, os adolescentes começam a ter planos de vida”, fala Damaceno.

Barreiras no acesso ao tratamento 

Dos quatro moduladores da proteína CFTR existentes hoje no mercado, somente um está disponível hoje no SUS, o ivacaftor. Ele, no entanto, serve apenas para em torno de 50 pacientes, elegíveis para o tratamento, já que ele se destina a tipos específicos de mutação. 

De acordo com o Registro Brasileiro de Fibrose Cística (REBRAFC), cerca de 1.700 pacientes do Brasil poderiam fazer uso da terapia tripla, sendo o mais abrangente das medicações até agora.

“Atualmente, há poucos pacientes fazendo uso da medicação, obtida por meio de ação judicial. Com a inclusão dele no SUS, o tratamento poderia ser indicado e iniciado mais facilmente”, conta Damaceno.

Fora do SUS, dificilmente os pacientes teriam acesso a tratamentos de alta complexidade. No estado de São Paulo, por exemplo, existe uma resolução aprovada em 2015 que proíbe a prescrição de medicamentos dentro do sistema público de saúde que não estejam agregados à lista de tratamentos aprovados pelo SUS. 

“Assim, além de não ter acesso a esse medicamento, muitos pacientes nem podem ter a chance de fazer uma requisição judicial que dê uma chance de vida a eles”, explica ela.

Como a terapia tripla pode ser incorporada ao SUS?

Para que um medicamento seja disponibilizado pelo SUS, o primeiro passo é passar por um processo conhecido como Avaliação de Tecnologias em Saúde (ATS), conduzido aqui no Brasil pela Conitec sob demanda da indústria ou mesmo do próprio Ministério da Saúde.

A comissão avalia o medicamento sob uma série de óticas (critérios clínicos, econômicos, organizacionais) e emite um parecer preliminar favorável ou desfavorável à incorporação.

Esse relatório é colocado em consulta pública, momento em que a sociedade é consultada e pode comentar sobre a decisão. A consulta da terapia tripla foi iniciada em 25 de maio, com um parecer preliminar desfavorável devido a seu custo (cerca de de R$ 888.174,43 por ano por paciente).

A comunidade de fibrose cística vem enviando dados, evidências e relatos para reverter a situação. Assim como a indústria, que ofereceu uma nova proposta em relação ao preço. As informações serão, então, analisadas mais uma vez e levadas em consideração para que a Conitec emita o parecer final.

Em caso favorável, a decisão será publicada e o Ministério da Saúde terá até 180 dias para disponibilizar o medicamento no SUS – o que nem sempre acontece sem entraves ou atrasos, por problemas na alocação orçamentária, por exemplo. 

Em caso de decisão final desfavorável, o medicamento não é incorporado ao SUS e os pacientes com indicação do medicamento ficam sem acesso. Por isso, a consulta pública é a última oportunidade para que os impactos sociais de uma doença grave como a fibrose cística sejam observados pela Conitec.

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