Aumentar a eficiência da Administração Pública, melhorar sua governança, equilibrar as contas públicas, corrigir distorções no funcionalismo: lugares-comuns da desafiadora agenda de reforma do Estado. Há, porém, um tema que parece ficar esquecido – ou pelo menos subestimado – no debate reformista: o controle público.
As reformas dos anos 90 visavam a criar um modelo de gestão mais flexível, com mais autonomia para o administrador e controles posteriores focados em resultados, dando protagonismo ao controle social. Nada foi feito em relação à estrutura dos órgãos de controle. De lá pra cá, o Tribunal de Contas da União (TCU) agiu para expandir competências e ampliar sua atuação, muitas vezes sem mandato legal claro.
Há autores que identificam na atuação “ativista” dos controladores uma espécie de revés ao programa de reforma, pois reforçou o caráter prévio, centralizado e burocrático do controle[1].
Reformar o controle externo ainda é tabu. Prevalece a noção de que “quanto mais controle melhor” e de que críticas e sugestões de mudanças visam a fragilizá-lo.
Não quero, aqui, dizer que o TCU deve ser reformado dessa ou daquela forma, e sim chamar atenção para a importância do controle como uma variável crítica do bom funcionamento do Estado, defender que possíveis reformas do controle sejam debatidas de maneira desimpedida e propor possíveis eixos de discussão.
Um dos principais vetores do “ativismo de contas” é o uso das auditorias operacionais. Destoando da prática internacional, o TCU costuma emitir atos de comando e aplicar sanções no âmbito do controle de performance[2]. Fora dos casos expressamente previstos na Constituição, o TCU não deveria agir diretamente, ou seja, caberia ao órgão comunicar seus achados às autoridades competentes e subsidiar o Congresso Nacional, que é o titular do controle externo. Seria bem-vinda, portanto, legislação que esclarecesse que fiscalização operacional tem apenas caráter informativo.
Outro ponto de atenção é o desenho institucional do TCU, notadamente no que tange aos critérios de escolha de ministros[3]. Há propostas de emenda à Constituição em trâmite no Congresso Nacional visando a alterar a forma de composição da Corte e até mesmo instituir mandato para os ministros[4]. Essas proposições ainda não ocuparam o centro da agenda.
Outro caminho que parece promissor é o de adaptar para o TCU os mesmos instrumentos de melhoria da governança da Administração, como a ampliação do controle social por meio da realização de consultas e audiências públicas antes da edição de normas e de atos relevantes, a elaboração de análises de impacto e a aplicação mais rigorosa de regras e garantias processuais.
O ativismo do TCU deve vir a ser corrigido pelo Supremo Tribunal Federal (STF), que ainda não deu a atenção devida ao tema. Paralelamente, reformas bem desenhadas podem contribuir para o aperfeiçoamento do controle e, em última instância, da gestão pública.
[1] ABRUCIO, Fernando. Uma viagem redonda: por que ainda discutimos o Plano Diretor da Reforma do Estado 25 anos depois? In: CAVALCANTE, Pedro Luiz Costa; SILVA, Mauro Santos (orgs). Reformas do estado no Brasil: trajetórias, inovações e desafios. Rio de Janeiro: IPEA, 2020.
[2] TRISTÃO, Conrado. Tribunais de Contas e Controle Operacional da Administração. In: SUNDFELD, Carlos Ari; ROSILHO, André (orgs). Tribunal de Contas da União no Direito e na Realidade. São Paulo: Almedina, 2020.
[3] WILLEMAN, Marianna Montebello. Accountability democrática e o desenho institucional dos Tribunais de Contas no Brasil. Belo Horizonte: Fórum, 2017.
[4] Cf. PEC nº 30/2019.