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Como o termo de arbitragem pode ajudar a lidar com divergências entre árbitros

TJSP anulou uma sentença após árbitro se abster de votar. Lei não prevê alternativas para situações semelhantes

Foto: Unsplash

Uma decisão recente do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) repercutiu por ter anulado uma sentença arbitral porque um dos árbitros se absteve de votar em uma parte do julgamento. Na ocasião, ele não participou da votação sobre o valor da indenização que caberia, após ter sido vencido ao defender a inexistência do dever de ressarcir. 

O caso despertou a atenção de especialistas em arbitragem para os cuidados que se deve ter na elaboração do compromisso arbitral, endereçando métodos para superação de divergências entre os árbitros.

No caso que gerou discussão, a 1ª Câmara Reservada de Direito Empresarial do TJSP julgou procedente uma ação anulatória de sentença arbitral devido à “a abstenção de voto de coárbitro configura non liquet, vulnerando o princípio constitucional do acesso à Justiça”. 

Além de considerar a sentença arbitral nula, os desembargadores do Judiciário paulista determinaram a reabertura do caso para que os três árbitros declarem os seus votos, inclusive o que anteriormente havia se abstido de votar. E, caso o árbitro persista em negar jurisdição, outro deverá ser chamado em seu lugar para decidir. 

“Recentemente, temos visto com preocupação o aumento do número de anulatórias de sentenças arbitrais propostas e deferidas. Todavia, a recusa de um árbitro em votar viola as próprias regras de formação e desenvolvimento regular do processo arbitral, bem como os princípios constitucionais da inafastabilidade da jurisdição e do contraditório”, afirma explica Helvecio Franco Maia Júnior, sócio do escritório Rolim Goulart Cardoso Advogados, em São Paulo. 

Nesse tipo de situação, o Judiciário se limitaria a anular a sentença e determinar que o vício seja reparado. “No caso, haveria um novo julgamento da causa pelo tribunal arbitral. Em hipótese alguma, o Judiciário poderá então substituir o tribunal arbitral e julgar o mérito da demanda”, explica. 

Assim, a decisão do TJSP seria adequada, já que essas limitações não foram extrapoladas, na perspetiva de Carolina Smirnovas, advogada da banca Manesco, Ramires, Perez, Azevedo Marques Sociedade de Advogados, em São Paulo. 

“Não é admissível que o árbitro se abstenha de julgar em caso de discordância – o que pode ser feito, nessa hipótese, é consignar o voto divergente em separado, como previsto na Lei de Arbitragem. Afinal, os árbitros têm o dever de prestar a tutela jurisdicional a que foram contratados”, explica. 

Critérios de desempate

Os desembargadores do TJSP entenderam que, no caso em julgamento, não era possível a aplicação de dispositivo do artigo 24 da Lei de Arbitragem que estipula a prevalência do voto do presidente na hipótese de não haver acordo majoritário entre os árbitros. Isso porque não houve um empate, por exemplo. 

Por isso, na decisão, foi preciso recorrer ao Código de Processo Civil (CPC) para suprir uma lacuna da Lei de Arbitragem na regulamentação do non liquet. O conceito define que o juiz não pode se eximir de decidir sob a alegação de lacuna ou obscuridade do ordenamento jurídico  – naquele caso, porque o árbitro tinha sido contrário à indenização, não via como votar pela definição do valor e não havia orientação no compromisso arbitral. 

Além disso, os desembargadores também apontaram que CPC determina que o julgador, mesmo que vencido em preliminar, deve votar no julgamento do mérito. Portanto, aplicaram a mesma lógica ao caso do árbitro. 

O relator, Cesar Ciampolini, fez a ressalva que os dispositivos não valeriam se houvesse essa determinação expressa no acordo de arbitragem. “Embora o diploma processual [o CPC] não seja supletivo à Lei de Arbitragem, certo é que os árbitros, frente a lacunas, hão de estar atentos às soluções edificadas pelo legislador, mormente quando em causa questões constitucionais, como aqui sucede”, afirmou.

Termo de arbitragem 

No artigo 10, a Lei de Arbitragem elenca os elementos que devem obrigatoriamente constar do compromisso arbitral: identificação das partes e dos árbitros; a matéria que será objeto da arbitragem e o lugar em que será proferida a sentença arbitral. 

Já no artigo 11, a lei relaciona as matérias que poderão constar no termo de arbitragem: local onde se desenvolverá a arbitragem; autorização de julgamento por equidade, prazo para sentença, lei de regência, regras de responsabilidade pelos custos da arbitragem e honorários dos árbitros.

“A flexibilidade procedimental certamente é uma das grandes vantagens da arbitragem. Mas as partes devem ter cautela, pois flexibilidade não significa que não há limite. E o limite previsto na Lei de Arbitragem é a vedação à violação aos bons costumes e à ordem pública”, diz a advogada Carolina Smirnovas.

Como enfrentar divergências entre árbitros

As divergências entre árbitros podem ser qualitativas (quando, por exemplo, os árbitros divergem quanto ao dever de indenizar) ou quantitativas (quando a controvérsia é sobre o valor da indenização).

A única regra prevista na Lei de Arbitragem para superação de divergências (qualitativas) entre árbitros é a do artigo 24, que determina a prevalência do voto do presidente do tribunal arbitral caso não haja acordo majoritário entre os julgadores. 

Como a Lei de Arbitragem não dispõe de outros mecanismos para que se chegue a um consenso entre os árbitros, especialistas recomendam a inclusão no compromisso arbitral de técnicas de superação de divergências para evitar impasses – e até questionamentos na Justiça. 

“Um dos princípios basilares da arbitragem é a autonomia da vontade. Por isso, não me parece vedado pela legislação que as partes possam convencionar que, na hipótese de um árbitro vencido na discussão da fase de conhecimento, este árbitro deva se pronunciar na fase de liquidação da sentença arbitral. Ou, ainda, sua eventual substituição por outro árbitro, respeitados os limites legais”, afirma João Pedro El Faro Lucchesi, sócio da área Cível do BBMO Sociedade de Advogados, em São Paulo. 

Para solucionar divergências qualitativas, Lucchesi sugere a possibilidade de se prever no compromisso arbitral mecanismo similar ao julgamento estendido, previsto no CPC, para aumentar o colegiado arbitral, com a convocação de outros árbitros para dirimir a questão.

“Outra possibilidade seria a estipulação, no compromisso arbitral, da realização de novo julgamento. Os árbitros vencidos teriam que aderir a uma das posições majoritárias adotadas pelos demais árbitros”, propõe o especialista. 

No caso de divergências quantitativas, há duas possibilidades. A primeira seria estipular no termo de arbitragem o chamado critério da continência, segundo o qual prevaleceria o valor que estivesse contido na maioria dos votos dos árbitros. 

“Nesse sentido, caso os árbitros tenham fixado o valor da indenização em R$ 750 mil; R$ 300 mil e 150 mil, respectivamente, o montante de R$ 300 mil prevaleceria, porque também está contido na posição do árbitro que fixou R$ 750 mil”, exemplifica Lucchesi.

A segunda recomendação seria ter o método da média aritmética. Nele, o montante determinado pelo tribunal arbitral seria o resultado da soma dos valores fixados pelos árbitros e sua divisão pelo número de árbitros.  

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