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Armadilhas à liberdade de expressão na MP 1068/2021

A inconstitucionalidade material na nova regulação da moderação de conteúdo no Marco Civil

Artur Pericles Lima Monteiro
14/09/2021|10:25
Atualizado em 14/09/2021 às 10:29
Jair Bolsonaro
O presidente Jair Bolsonaro. Crédito: Marcos Corrêa/PR

Meses depois de ter afirmado que trabalhava num decreto para regulamentar o Marco Civil da Internetsobre a moderação de conteúdo realizada pelas plataformas, o presidente Jair Bolsonaro editou medida provisória modificando a lei quanto ao tema.

Publicada na véspera de manifestações em que Bolsonaro novamente ameaçou agir fora das “quatro linhas da Constituição”, a medida foi imediatamente denunciada por beneficiar quem espalha desinformação e propaga conteúdo antidemocrático nas redes — favorecendo o próprio presidente da República e sua base. A medida também foi criticada por modificar radicalmente o Marco Civil da Internet, que foi objeto de grande debate no Congresso e na sociedade civil, com discussões amplas que ficam prejudicadas no célere procedimento de MP. Segundo noticiado na quarta-feira, o presidente do Congresso Nacional estaria considerando devolver a MP.

O contexto político e o impacto da medida sobre as políticas das plataformas contra desinformação já foram bastante discutidos. Este texto se volta a outras questões. As críticas à MP muitas vezes parecem conceder que suas disposições protegem a liberdade de expressão, ainda que de maneira excessiva. Quero mostrar como a liberdade de expressão é violada pela MP, embora o governo tenha defendido sua edição com base nesse direito.

O novo texto do Marco Civil exige que a moderação de conteúdo (e de contas) em redes sociais seja realizada apenas com “justa causa” e de forma motivada, além de criar outros direitos para usuários, incluindo uma espécie de devido processo de moderação de conteúdo e garantia de informações relacionadas.

O texto da MP lista hipóteses em que “[c]onsidera-se caracterizada justa causa”. Entre elas, encontramos referências ao Estatuto da Criança e do Adolescente, a infrações penais sujeitas a ação penal pública incondicionada, a organizações criminosas e terroristas e a violação a direitos da personalidade (como privacidade e honra) e propriedade intelectual.

Uma potencial interpretação do texto seria que, fora das hipóteses especificadas na MP, a rede social não poderia remover conteúdo. A lista seria exaustiva. A ideia por trás da MP, que já estava na minuta de decreto modificando o regulamento do MCI, tornada pública pelo ministério do Turismo em maio, parece ser que qualquer medida de moderação de conteúdo fora dessas situações seria uma forma de censura privada, imposta pelas grandes empresas de tecnologia. Essa é uma forma equivocada de compreender a moderação de conteúdo, que, no texto da MP, leva à violação da liberdade de expressão.

Como escrevi com outros pesquisadores do InternetLab, cercear dessa maneira a moderação de conteúdo prejudica a construção de um ambiente plural na internet, com múltiplos espaços. O que venha a ser “justa causa” na moderação de conteúdo não é algo que possa ser definido numa lista de conteúdos ilícitos. As plataformas muitas vezes adotam regras diferentes, mas podem ser radicalmente distintas ainda quando partem das mesmas políticas de conteúdo.

Uma ilustração pode ajudar. Uma sala de concerto e uma casa de shows são dois espaços voltados ao mesmo objetivo, apreciação da boa música. A grande regra, em ambos, é não impedir que outras pessoas do público possam aproveitar o espetáculo. Na prática, no entanto, isso se traduz de forma marcadamente diferente. Na sala de concerto, quebra as regras mexer no celular ou até abrir a embalagem de uma bala. Na casa de shows, ninguém espera silêncio absoluto, mas não vale tudo: falar ao telefone durante a apresentação seria um comportamento inadequado. Nenhuma dessas condutas seria ilícita em si; é a partir do funcionamento orgânico desses lugares, e não de sua licitude em abstrato, que entendemos o que é comportamento apropriado ou inapropriado.

Para que a internet seja capaz de construir espaços diferentes como esses, pluralidade na moderação de conteúdo é fundamental. A MP impede essa construção e impõe um único molde a toda a internet, prejudicando que usuários sejam capazes de conviver segundo regras próprias às dinâmicas de cada espaço. Seria um evidente erro ver tais regras apenas como limitações à expressão de usuários, quando na verdade são elas que também criam esses ambientes — que oferecem novas oportunidades de comunicação. A medida provisória cerceia o estabelecimento e a aplicação dessas regras e, assim, elimina formas de manifestação e interação para usuários.

Essa eliminação de ambientes também tem um impacto ainda mais grave sobre grupos subalternizados e subrepresentados, que são alvo de ataques na internet. Mesmo caso removesse conteúdo ilícito (sob normas a respeito de racismo, homofobia e violência política), uma plataforma poderia ser um ambiente hostil a essas pessoas, em especial quando consideramos lógicas de turba lançadas a atacar pessoas vulneráveis. Esses ataques em massa não precisam conter expressões ilícitas para que tenham como resultado silenciamento e até mesmo retirada das pessoas atacadas da esfera pública digital.

Quando adotam regras em reposta a essa realidade, para tornar seus ambientes mais seguros à participação de grupos minoritários, as plataformas proporcionam condições ao exercício da liberdade de expressão a mais vozes, particularmente vozes historicamente excluídas de espaços públicos. Determinar que tipo de regra protege essas vozes sem chegar a ponto de bloquear o debate franco certamente é uma questão difícil, e a resposta de cada plataforma ou comunidade pode variar. Aqui o importante é entender que, para promover a liberdade de expressão de segmentos excluídos da população, comunidades e provedores de aplicação precisam ser capazes de controlar conteúdo mesmo que nada haja de ilícito.

Além de eliminar oportunidades para expressão de usuários na internet, a medida provisória também viola a liberdade de expressão ao prejudicar usuários que acessam plataformas buscando obter informação.

Sites de receitas como o TudoGostoso, a depender do tamanho, podem se enquadrar na regulação criada pela medida provisória. A MP pode afetar grupos no Facebook e comunidades no Reddit (chamadas de subreddits) que servem como repositórios comunitários, que têm suas próprias regras e fazem sua própria moderação. Inviabilizar esses espaços como fontes de informação para multidões de usuários viola o direito fundamental de acesso à informação, que também pode ser lido como desdobramento da liberdade de expressão, conforme a Convenção Americana de Direitos Humanos e o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos.

A medida provisória ainda exibe outros vícios importantes. Ao atribuir ao poder Executivo   a definição do que é “justa causa” na moderação de conteúdo, o texto permite a captura das redes sociais pelo governo. Isso se dá principalmente porque a fiscalização da MP não é nada óbvia: depende de conceitos de contornos imprecisos, como violação da honra e da privacidade, que abrem espaço para que o governo sancione as plataformas sempre que discordar da moderação de conteúdo. Essas sanções, nos termos da MP, podem chegar, na prática, à proibição do funcionamento no Brasil.

Diante disso, para evitar punições e retaliações, as plataformas têm enorme incentivo para implementar reflexamente a visão do governo. Poucos cenários seriam tão odiosos à liberdade de expressão: a MP cria um incentivo para que as redes sociais cerceiem conteúdo de crítica ao presidente, seus aliados e suas políticas — tipo de manifestação que certamente mais provocaria a ira sancionatória da autoridade administrativa, diretamente subordinada ao presidente da República.

Essa principal armadilha da MP ressalta um ponto importante para qualquer modelo regulatório: o direito da liberdade de expressão não é composto apenas pelas regras sobre o que pode e não pode ser dito. Fatores institucionais, como quem tem o poder de fiscalizar, são decisivos.

Embora urgentes na crise institucional atual, essas preocupações valeriam também em momentos de normalidade. A liberdade de expressão não deve depender de boas intenções dos governantes; sua proteção exige justamente que o direito proporcione arranjos institucionais seguros. Ao estabelecer o oposto, a medida provisória é inconstitucional.

** Agradeço Luiz Fernando Gomes Esteves e Diego Werneck Arguelhes pelas sugestões e críticas.


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Artur Pericles Lima Monteiro

Coordenador de liberdade de expressão no InternetLab. Coordenador do Núcleo e Direito, Internet e Sociedade da USP — NDIS/USP. Visiting fellow no Information Society Project, da Yale Law School. Pesquisador do grupo constituição, instituições & política, da USP. Mestre e doutorando em direito constitucional na Faculdade de Direito da USP. Advogado.

Tags Fake NewsJair BolsonaroLiberdade de ExpressãoMarco Civil da Internetmoderação de conteúdoplataformasRedes sociais
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