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Women in Tax Brazil

PIS/Cofins: protagonismo feminino na decisão da não incidência em descontos comerciais

Início, meio e fim deste caso no STJ foi protagonizado por mulheres

PIS Cofins
Crédito: Marcello Casal Jr./Agência Brasil

No dia 11 de abril deste ano, a 1ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) proferiu julgamento inédito acerca da não incidência de PIS e Cofins sobre as verbas comerciais recebidas pelos adquirentes de mercadorias (REsp 1.836.082/SE). 

Além do ineditismo da matéria perante o STJ, outro aspecto desse julgamento merece destaque: o início, o meio e o fim desse caso foi protagonizado por figuras femininas. Se, de um lado, o protagonismo feminino chama a atenção por ser pouco usual nos tribunais brasileiros, o brilhantismo do trabalho realizado por essas mulheres soa bastante comum à atuação feminina (também) no ambiente de trabalho. 

Tratando sobre o tema julgado, ele tem como pano de fundo a relação estabelecida no âmbito dos acordos comerciais e ganhou destaque em meados de 2017, quando a Receita Federal publicou duas soluções de consulta (COSIT 531 e 542) em que atribuía a natureza de receita operacional ao efeito positivo no resultado contábil decorrente do recebimento de descontos comerciais.

O impasse está no seguinte: a Receita Federal afirma que os descontos recebidos geram acréscimo patrimonial correspondente a uma receita do adquirente, sujeita, portanto, à incidência de PIS/Cofins. Já os contribuintes alegam que sobre as verbas comerciais recai a natureza de redutor de custo, na medida em que os valores recebidos decorrem da relação de compra e venda de mercadoria. 

O caso recebe diversas denominações (descontos comerciais, verbas comerciais, acertos decorrentes de acordos comerciais), e também se materializa de múltiplas formas, sendo as mais comuns através de i) mercadorias bonificadas (eventualmente fora da nota fiscal de venda); ii) descontos financeiros no boleto ou duplicata; iii) depósito em dinheiro em conta bancária do adquirente. Também são inúmeras as justificativas para a concessão das verbas na relação comercial estabelecida: i) desconto por atingimento de meta de compra; ii) por impulsão de mercadoria; iii) por lançamento de novo produto, dentre várias outras.

Não havia dúvidas, portanto, de que a multiplicidade de facetas do assunto representava um desafio para a defesa dos contribuintes. E é nesse ponto que o caso merece destaque. 

A defesa do contribuinte conseguiu abarcar toda a diversidade dos descontos comerciais a partir de uma única linha argumentativa, que pode ser resumida através da seguinte pergunta: é possível auferir receita operacional por ocasião da aquisição de bens? A resposta certamente é não. Esse foi o ponto-chave para solucionar o imbróglio, bravamente apresentado pelas advogadas Betina Treiger Grupenmacher e Ariane Guimarães, e aplicado pela ministra Regina Helena Costa em seu voto. 

Ora, o auferimento de receita é atributo exclusivo do vendedor, que transforma sua atividade empresarial em nova riqueza financeira. Sob a perspectiva do adquirente, o que se tem é exclusivamente um custo, o qual, a depender da sua eficiência na negociação junto ao fornecedor, poderá ser maior ou menor. Tudo a depender da estrutura de comercialização estabelecida pelos envolvidos – liberalidade que lhes é assegurada pelos princípios constitucionais da autonomia da vontade, da livre concorrência e da liberdade empresarial. E em se tratando de redução de custo, os descontos comerciais irão impactar no lucro – passível da incidência de IRPJ/CSLL – mas não podem ser confundidos com receita, base de cálculo de PIS/Cofins.

A reflexão proposta por Betina Grupenmacher em nome do amicus curiae do Instituto para Desenvolvimento do Varejo (IDV) e reforçada por Ariane Guimarães, patrona da recorrente Cencosub Brasil Comercial Ltda., em sua sustentação oral, foi acolhida pela ministra-relatora Regina Helena, que, ao captar o cerne da discussão, dedicou-se, em seu voto, a referir a aspectos práticos do tema debatido. 

A decisão faz alusão a uma variedade de descontos recebidos, muitos deles condicionados a diversos tipos de contrapartidas por parte do adquirente. Quanto a isso, a decisão afirma que o fato de haver uma contraprestação por parte do adquirente não transforma a relação em uma prestação de serviço, pois essa não é a motivação da relação entre os dois agentes econômicos. Tudo decorre do interesse do fornecedor em vender mais e do adquirente comprar por um preço menor.  

Além disso, a decisão desata um nó que surgia com bastante frequência quando se discutia o assunto: a previsão legal que autoriza a exclusão dos descontos incondicionais da base de cálculo de PIS/Cofins aplica-se apenas na perspectiva do vendedor que concede o desconto. Significa dizer que sob o olhar do adquirente, que recebe o desconto, não se trata de definir se o desconto é condicionado ou incondicionado. Essa classificação desinteressa ao adquirente, já que a verba recebida na relação comercial vai resultar em uma redução do preço unitário do bem recebido. Assim, convencida de que o adquirente jamais poderá auferir receita em uma relação comercial, a ministra Regina Helena foi certeira em seu julgamento. 

Por óbvio, as felizes colocações dessas três mulheres decorrem de um trabalho coletivo de vários outros profissionais, cujo reconhecimento registra-se desde já. O fato é que os contribuintes ganharam uma importante batalha no Poder Judiciário, não apenas pelo placar unânime, mas especialmente pela qualidade das razões que fundamentaram a decisão judicial. E quanto a isso, mérito a essas três mulheres que capitanearam o alcance desse resultado. logo-jota