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STF

Maioria do STF vota para restringir foro privilegiado

Tese teria efeito para deputados e senadores. Há expectativa de novo pedido de vista no caso

Luiz Orlando Carneiro, Matheus Teixeira, Márcio Falcão
23/11/2017|16:10
Atualizado em 23/11/2017 às 19:47

A maioria do Supremo Tribunal de Federal votou nesta quinta-feira (23/11) para limitar o alcance do foro privilegiado para deputados e senadores. O julgamento foi suspenso após pedido de vista do ministro Dias Toffoli.

Sete ministros entendem que é possível fazer uma interpretação restritiva da Constituição para deixar na Corte apenas investigações de crimes cometidos no exercício do cargo e que digam respeito ao desempenho da função.  Com isso, a primeira instância receberia processos contra parlamentares por crimes como homicídio, violência doméstica e estupro, por exemplo, desde que não tenham ligação com o cargo. A tese foi proposta pelo relator, ministro Luís Roberto Barroso, seguido por Rosa Weber, Marco Aurélio, Cármen Lúcia,  Edson Fachin, Luiz Fux e Celso de Mello.

 

O ministro Alexandre de Moraes também defende a restrição do foro privilegiado, mas com outro alcance. Para o ministro, cabe ao Supremo investigar somente deputados e senadores que praticaram crimes durante o exercício do mandato, portanto, a competência da Corte seria apenas para infrações penais comuns que surjam após a diplomação do político para o cargo. O ministro propôs que permaneçam na Corte ações de políticos sobre crimes não ligados ao mandato.

Ainda faltam os votos de Toffoli, Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski. O pedido de vista já era esperado e os ministros se movimentaram para antecipar votos numa tentativa de pressionar os colegas. A presidente do Supremo, Cármen Lúcia, disse esperar que o tema seja devolvido ao plenário com celeridade diante de sua relevância.

Barroso afirmou que a tese do julgamento terá efeito para deputados e senadores, mas que depois poderá ser estendida para outros políticos.  Ministros avaliam que esse entendimento do relator deve diminuir 90% dos processos contra políticos que tramitam na Corte atualmente - são 531 processos, sendo 435 inquéritos e 96 ações penais, sendo que, na Lava Jato, são investigados 32 senadores, 66 deputados, 6 ministros e ainda o presidente Michel Temer.

Atualmente, 37 mil autoridades no país têm prerrogativa de foro em diversas esferas. No STF, por exemplo, são processados e julgados, em tese, mais de 800 agentes – incluindo presidente, vice, 513 deputados, 81 senadores, os atuais 28 ministros de Estado e ainda os 3 comandantes militares, os 90 ministros dos tribunais superiores, 138 chefes de missão diplomática e integrantes do Tribunal de Contas da União.

Na sessão desta quinta, Moraes divergiu em parte do relator, que sugeriu o foro apenas para crimes cometidos durante o mandato e relativos ao exercício da função: "Entendo que o foro se aplica a todas infrações penais comuns praticadas por detentores de mandatos eletivos a partir da sua diplomação". “"A Constituição é clara ao estabelecer que cabe ao STF processar e julgar originariamente presidente, vice, membros do congresso, ministros e procurador-geral da Republica que cometerem infração penal comum, concordemos ou não com o foro privilegiado", diz Moraes.

O ministro Gilmar Mendes ainda não votou, mas ele fez um aparte na fala de Moraes e fez críticas à Justiça de primeiro grau, para onde irão os processos caso a restrição do foro se concretize. “"Temos um quadro extremamente caótico no funcionamento da Justiça criminal e não há nenhum projeto de reforma dessa área. O problema não está só no tema do foro privilegiado".

Moraes também sugeriu mudanças nas regras de conexão que levam co-réus ao STF por terem cometidos crime em conjunto com detentores de mandatos. “Proponho que não se aplique mais hipóteses de continência e conexão, somente sendo extensível quando o fato for único e indivisível, o que levaria à anulação da Súmula 704", disse.

A súmula citada é de 2003, e diz o seguinte: "Não viola as garantias do juiz natural, da ampla defesa e do devido processo legal a atração por continência ou conexão do processo do co-réu ao foro por prerrogativa de função de um dos denunciados".

O ministro Luiz Edson Fachin, relator da Lava Jato no STF, seguiu a linha do relator. “O foro protege crimes ocorridos após a diplomação do agente público. Para os demais casos, vale a regra do juiz natural, a competência é fixada no momento que o ato é praticado. E a prerrogativa do foro perdura até o término do mandato, isso porque, como o STF já decidiu quando cancelou a súmula 394, há previsão de prerrogativa para aqueles que deixaram a função”.

Para o ministro Luiz Fux, é necessária a mutação constitucional para que o STF julgue apenas ilícitos cometidos durante o cargo e referente ao exercício dele.

Barroso entende que é possível aplicar a teoria da mutação constitucional em sentido técnico, que decorre da releitura interpretativa da Constituição sem alteração formal de seu texto, para mudar de entendimento. Barroso sustentou que a alteração da realidade fática justifica uma mudança de interpretação: “Quando o foro foi concebido, ninguém imaginou que houvesse perante a corte constitucional mais de 500 processos de natureza criminal envolvendo mais de um terço do Congresso Nacional. É uma realidade que nunca ninguém cogitou”.

O ministro também propôs como linha de corte para fixar a competência na análise de processos contra autoridade a fase de alegações finais, quando as partes são chamadas a se manifestar pela última vez depois do encerramento da fase de produção de provas.

A discussão no Supremo se dá em uma questão de ordem levantada por Barroso na ação penal 937 contra o prefeito de Cabo Frio, Marquinhos Mendes (PMDB-RJ). O caso chamou atenção pelas diversas mudanças de competência para julgar o réu — ele começou a ser julgado em 2013 no Tribunal Regional Eleitoral do Rio de Janeiro, mas, em poucos anos, foi deputado federal, prefeito e também ficou sem mandato, gerando um vaivém do processo por diferentes instâncias.logo-jota