Thaís Vidal Saraiva
Advogada da área de Infraestrutura e Saneamento do Felsberg Advogados. Membra Infra Womem. Membra da Comissão Especial de Infraestrutura, Logística e Desenvolvimento Sustentável da OAB-SP. CP3-P
No último dia 28 de julho, foi divulgada pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) a abertura da consulta pública do órgão, que visa receber até o dia 9 de setembro as contribuições sobre a cobrança da taxa de serviço público de limpeza urbana e de manejo de resíduos sólidos em fatura de energia elétrica.
A pretensão da Aneel é captar elementos externos hábeis a embasar a regulamentação da Lei 11.445/2007, com redação da Lei 14.026/2020, que institui o novo Marco do Saneamento Básico, de forma a modificar, também, a Resolução Normativa nº 1.000/2021, em que o regramento estabelece as regras de prestação do serviço público de distribuição de energia elétrica.
Essa situação é, por si só, extremamente interessante sob o ponto de vista de mercado, regulamentação e inovação em formas de cobrança dos serviços públicos essenciais para as futuras estruturações de projetos de resíduos sólidos no cenário nacional.
Explica-se. De acordo com o Manual Orientativo sobre a Norma de Referência nº 01 da Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA), que trata cobrança pela prestação do serviço público de manejo de resíduos sólidos urbanos, bem como da sustentabilidade econômico-financeira dos serviços de manejo de resíduos sólidos (SMRSU) no Brasil, “a política de cobrança será instituída e regulada por norma legal e/ou por atos administrativos editados pelo Poder Executivo ou pela entidade reguladora à qual forem outorgadas ou delegadas as atividades administrativas de regulação”.
Adicionalmente, menciona-se que é obrigatória a apresentação de instrumento de cobrança pelo titular da cobrança, com comprovado atendimento “pelo titular do serviço, do disposto no art. 14 da Lei Complementar nº 101, de 4 de maio de 2000, observadas as penalidades constantes da referida legislação no caso de eventual descumprimento”, conforme o §2º do art. 35 do novo Marco.
Nesse sentido, em plena observância à instrução da ANA, a agência indica que há a intenção de conferir maior aderência aos regramentos aplicáveis aos serviços essenciais, visando auxiliar na cobrança, a fim de que ocorra a sustentabilidade econômico-financeira dos serviços de manejo de resíduos sólidos no Brasil.
Atualmente, os principais modelos de cobrança são: (i) pela instituição de taxa pública direta, que, geralmente, é atrelada ao IPTU; e (ii) pela instituição de tarifa, cuja cobrança pode vir junto aos serviços de água e esgoto, em parceria com as concessionárias dos serviços.
No entanto, surgem alguns problemas advindos do formato de cobrança. Como exemplo, no estado de São Paulo, há significativo inadimplemento relacionado ao IPTU. Conforme apuração, há um total de 513.723 pessoas que entraram em inadimplência por não terem pagado o imposto — o que impacta diretamente também na inadimplência dos valores vinculados ao manejo de resíduos sólidos.
Dessa forma, identifica-se que a inclusão de uma nova forma de cobrança por meio da conta de energia elétrica, que hoje é um serviço essencial oferecido a 99,8% da população, segundo o IBGE, e com uma taxa de inadimplência média de 5,89/%, é vista com uma possível alternativa para trazer maior segurança e previsibilidade para o serviço.
Destaca-se também que a diversidade de modelos e o aumento da segurança podem gerar uma redução dos valores para os usuários, uma vez que ocorre a redução do risco para os prestadores dos serviços de resíduos sólidos.
De maneira proativa e atenta, a Aneel, regulador nacional cuja competência abarca a promoção das atividades relativas às outorgas de concessão, permissão e autorização de empreendimentos e serviços de energia elétrica, preocupou-se com a regulação justa e cabida para que os interesses, e consequentemente, as vontades dos entes arrecadadores estejam presentes em eventuais negociações para viabilizar esse novo modelo.
Tanto é verdade que, de acordo com a Nota Técnica nº 0032/2022-SRD/Aneel, a agência frisa que a cobrança via fatura de energia elétrica dependerá da vontade da distribuidora local, e que o consumidor não poderá se escusar em adimplir com o valor.
Por assim dizer, entende-se que há um modelo embrionário extremamente importante em vista, que precisa ser discutido, sob o ponto de vista regulatório, por possuir grande potencial para possibilitar novos formatos de cobrança da prestação dos serviços públicos de manejo de resíduos sólidos, conferindo maior segurança e previsibilidade para o desenvolvimento de concessões públicas que visam acelerar o alcance das metas estabelecidas e tornar um país mais sustentável.