Jamile Racanicci
Foi repórter em Brasília. Cobria tributário, em especial no STJ e no STF. Antes, passou pelas redações do Poder 360 e, como estagiária, da TV Globo, da GloboNews, do G1 e do Correio Braziliense.
O Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) manteve nessa terça-feira (19/6) uma cobrança de contribuição previdenciária sobre as bolsas de estágio pagas pelo antigo Banespa a estudantes de Ensino Superior ou de curso profissionalizante. A Receita Federal descaracterizou os contratos de estágio e exigiu que o Santander, que incorporou o Banespa, inclua a remuneração dos alunos no cálculo do tributo pago à Seguridade Social, referente aos anos de 2002 a 2006.
Por voto de qualidade, a 2ª Turma da Câmara Superior decidiu que o Santander não conseguiu comprovar que atendeu aos requisitos da lei nº 6.494/1977, necessários para afastar a incidência da contribuição sobre a bolsa paga aos estagiários. Segundo conselheiros do colegiado, a decisão é inédita no tribunal administrativo.
Para os conselheiros representantes da Fazenda Nacional, não basta que o banco apresente o termo de compromisso que também foi assinado pelos estagiários, pela instituição de ensino e pelo Centro de Integração Empresa-Escola (CIEE).
Além disso, na visão dos julgadores, o Santander deveria ter comprovado a matrícula e a frequência regular dos alunos nos cursos das instituições de ensino, o acompanhamento do estagiário por parte de um professor e de um supervisor do banco, a realização de atividades que colaborem com o aprendizado escolar e outros fatores que afastam a existência de vínculo empregatício.
Ainda que o estágio tenha sido intermediado pelo CIEE, os conselheiros entenderam que o ônus de provar que o Santander atendeu aos critérios legais continua com o banco
Vencidas, as conselheiras representantes do contribuinte entenderam que a apresentação do termo de compromisso, somada à intermediação pelo CIEE, é suficiente para comprovar a isenção. Como o convênio é aprovado pelo governo, as julgadoras argumentaram que o Estado autorizou a divisão de responsabilidades com o CIEE, de forma que o intermediário também seria responsável pela verificação de frequência, por exemplo.
Como a votação terminou em quatro votos a quatro, resolveu a controvérsia a presidente do colegiado, conselheira Maria Helena Cotta Cardozo. Representante da Fazenda Nacional, a julgadora votou pela manutenção da cobrança.
Durante o julgamento, as conselheiras representantes do contribuinte lembraram que o antigo Banespa era uma sociedade de economia mista, e argumentaram que a fiscalização não poderia caracterizar um vínculo empregatício entre o banco e os estagiários porque estes foram contratados sem concurso público. Nesse sentido, as julgadoras apontaram o recurso extraordinário nº 705.140, julgado pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
No RE 705.140, o Supremo entendeu que as contratações ilegítimas não geram quaisquer efeitos jurídicos válidos
Segundo decidiu o STF, a contratação sem concurso garante apenas o direito de os trabalhadores receberem o salário correspondente ao tempo trabalhado. Como os supostos empregados não poderiam nem receber a aposentadoria neste caso, as conselheiras do Carf afastaram a incidência da contribuição à Seguridade Social.
Diante disso, os julgadores representantes da Fazenda Nacional argumentaram que os auditores da Receita Federal têm competência para caracterizar o vínculo empregatício para fins fiscais, independentemente de o contrato não produzir efeitos na esfera trabalhista. Os conselheiros basearam o entendimento na súmula nº 363 do Tribunal Superior do Trabalho (TST), que estaria em consonância com o RE.
A contratação de servidor público, após a Constituição de 1988, sem prévia aprovação em concurso público, encontra óbice no respectivo art. 37, II e § 2º, somente lhe conferindo direito ao pagamento da contraprestação pactuada, em relação ao número de horas trabalhadas, respeitado o valor da hora do salário mínimo, e dos valores referentes aos depósitos do FGTS
Contra a decisão do Carf, o contribuinte pode apresentar embargos de declaração ao próprio tribunal administrativo. Além disso, o banco pode levar a discussão ao Judiciário.
Processo citado na matéria: 16327.001895/2008-12
Fazenda Nacional x Banco Santander (Brasil) S.A.