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Direito Tributário

A Sociedade em Conta de Participação e seu caráter confidencial face a IN RFB 1.470/2014

Norma passou a exigir das SCP a inscrição no Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica (CNPJ)

Lucas Tavares Bueno, Carlos Eduardo Orsolon
08/12/2015|07:11
Atualizado em 08/12/2015 às 06:11
@flickr/E.R.R

Apesar de a Sociedade em Conta de Participação (SCP) não ser uma das figuras jurídicas mais comuns no Direito brasileiro, a sua utilização é considerada de grande valia para estruturas societárias que buscam se diferenciar de estruturas usuais de Limitadas ou Sociedades Anônimas com, via de regra, o anonimato de sua existência e a de seus sócios participantes perante terceiros.

Isso porque a legislação que regula a SCP (artigos 991 a 996 do Código Civil brasileiro) estabelece que o sócio ostensivo exerça as atividades da SCP, em seu próprio nome, e aparece perante terceiros, respondendo exclusivamente perante esses. Entretanto, o caráter confidencial da SCP, e de seus sócios participantes, passou a ser questionado em razão da promulgação, em 30 de maio de 2014, da Instrução Normativa (IN) RFB nº 1.470, que, dentre outras deliberações, exigiu das Sociedades em Conta de Participação a sua inscrição no Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica (CNPJ).

A SCP é um tipo societário que se constitui mediante a assinatura de um Contrato Social, por prazo determinado ou não, o qual estabelecerá os termos que regerão a relação entre as partes. Esta sociedade configura-se pela existência de dois tipos distintos de sócios, o sócio ostensivo, ou seja, a parte que efetivamente exerce a atividade empresarial e é juridicamente responsável pela SCP e pelas obrigações por ela contraídas perante terceiros, e o sócio participante, que contribui de forma oculta para a sociedade, aportando recursos e/ou prestando serviços para a exploração de seu objeto social. Em complementação, não há qualquer formalidade para a sua constituição e tampouco é necessária a apresentação e o registro do Contrato Social perante o registro do comércio ou cartórios de registro de títulos e documentos.

Como consequência, a SCP não existe perante terceiros, por isso é comum atribuir a esse tipo societário o caráter de confidencialidade. O vínculo jurídico resultante de uma SCP apenas obriga os signatários, como um contrato comercial, de forma que o sócio ostensivo é a única parte que aparece na relação com terceiros, assumindo todas as obrigações da SCP em seu próprio nome, sendo papel do sócio participante contribuir de forma oculta e participar dos resultados obtidos pela SCP, conforme os termos acordados no Contrato Social.

Com tal aspecto de confidencialidade, a SCP é utilizada em estruturas que não desejam revelar ao público em geral todas as partes envolvidas no negócio, caraterística preservada até então pelo Artigo 4º da IN SRF 179/1987, que dispunha não ser exigida a inscrição da SCP no então Cadastro Geral de Contribuintes do Ministério da Fazenda. Desta forma, as obrigações tributárias inerentes à SCP eram cumpridas utilizando-se o CNPJ, e sob responsabilidade exclusiva, do sócio ostensivo.

Entretanto, em 30 de maio de 2014, esse dispositivo foi expressamente revogado pelo Artigo 52 da IN RFB 1.470/2014, de forma que a legislação atual passou a estabelecer que todas as pessoas jurídicas domiciliadas no Brasil, inclusive as equiparadas pela legislação do Imposto sobre a Renda, estariam obrigadas a inscrever no CNPJ cada um de seus estabelecimentos localizados no Brasil ou no exterior, antes do início de suas atividades.

Apesar de não existir uma menção específica à SCP nessa IN, definiu-se no Artigo 3º que o termo "equiparadas" refere-se à legislação do Imposto de Renda, de forma a enquadrar as SCP na obrigatoriedade de inscrição no CNPJ. Ainda, para esclarecer qualquer dúvida remanescente a essa questão, a ementa da Solução de Consulta DISIT/SRRF04 Nº 4.017, de 26 de março de 2015, dispôs o seguinte:

"As sociedades em conta de participação devem inscrever-se no Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica (CNPJ), ainda que tenham sido constituídas antes da entrada em vigor da Instrução Normativa RFB nº 1.470, de 2014, publicada no Diário Oficial da União de 3 de junho de 2014 e retificada no dia 9 subsequente, que determinou a inscrição naquele cadastro de todas as pessoas jurídicas domiciliadas no Brasil, inclusive aquelas equiparadas pela legislação do Imposto sobre a Renda."

Com essa nova obrigação vinculada à SCP, bem como todas as obrigações acessórias a ela relacionadas, passou-se a questionar o caráter confidencial até então reservado a esse tipo societário, existindo a preocupação que as características principais da SCP, ou seja, a ausência de personalidade jurídica e a existência de sócios participantes (ocultos) poderiam estar prejudicadas em razão das disposições advindas da IN RFB 1.470. Em especial, discute-se a necessidade de informar nos formulários de cadastro do CNPJ os nomes dos sócios participantes, o que afetaria ainda mais a quebra de confidencialidade.

No entanto, entendemos que o caráter confidencial não foi atingido com a promulgação da referida IN, tendo em vista que as obrigações da SCP sempre foram controladas em contas próprias dentro da contabilidade da sócia ostensiva e sempre constaram nas demonstrações financeiras da sócia participante. Portanto, a nosso ver, as alterações fiscais promovidas não afetaram a inexistência de personalidade jurídica ou prejudicaram a confidencialidade desse tipo jurídico, apenas promoveram uma obrigação que visa permitir à Receita Federal do Brasil ter um maior controle em relação ao recolhimento dos tributos devidos pela SCP.

Se faz importante ressaltar que as informações acerca da SCP devem ser apresentadas apenas à Receita Federal do Brasil e não serão, oficialmente, divulgadas perante terceiros. Desta forma, a identidade do sócio participante continua sendo preservada e as responsabilidades legais perante terceiros continuam recaindo sobre o sócio ostensivo, de forma a não prejudicar as caraterísticas inerentes à Sociedade em Conta de Participação, nos termos do Código Civil vigente.logo-jota