Opinião e Análise

Talita Ferreira de Brito dos Reis

Maria Luiza Prestes Magatti

Natali Inacio Neves

Em novembro de 2015, foi ajuizada pelo Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM) a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5.422 no Supremo Tribunal Federal (STF), que objetiva o reconhecimento da inconstitucionalidade da incidência de Imposto de Renda de Pessoa Física (IRPF) sobre as verbas recebidas a título de alimentos ou pensão alimentícia.   
Em março de 2021, o ministro relator, Dias Toffoli, havia proferido voto de conhecimento parcial da ADI e, quanto à matéria, julgava procedente o pedido formulado de modo a dar ao artigo 3º, §1º, da Lei 7.713/88, ao artigos 4º e 46 do Anexo do Decreto 9.580/18 e aos artigos 3º, caput e §1º; e 4º do Decreto-lei 1.301/73 interpretação conforme a Constituição Federal para afastar a incidência do imposto de renda sobre valores decorrentes do direito de família percebidos pelos alimentados a título de alimentos ou de pensões alimentícias.   
Toffoli propunha a fixação da seguinte tese de julgamento em seu voto: "É inconstitucional a incidência de imposto de renda sobre os alimentos ou pensões alimentícias quando fundados no direito de família". O ministro Roberto Barroso seguia o relator.   
Todavia, em fevereiro deste ano, o ministro Gilmar Mendes efetivou o pedido de destaque no julgamento, o que implica no reinício da contagem e dos votos sobre a matéria. O pedido de destaque, em que pese não tenha previsão no Código de Processo Civil (CPC) brasileiro, consta do artigo 4º, da Resolução 642/2019 do Tribunal Supremo.   
O tema aventado na mencionada ADI, de tributação dos valores recebidos a título de pensão alimentícia pelo IRPF, envolve as temáticas de tributação e desigualdade de gênero. Isso porque, em sua maioria, são as mães que recebem os referidos valores destinados à criação de seus filhos. Enquanto o genitor, que desembolsa o valor da pensão, tem o direito legal de deduzi-lo de seu imposto de renda pessoal. 
Em que pese o <a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/irpf">IRPF</a> incida sobre toda renda ou proventos de qualquer natureza que impliquem em acréscimo patrimonial, o IBDFAM alega que o recebimento de pensão alimentícia, destinado à inteira subsistência do pensionista, não implicaria em acréscimo patrimonial e a sua tributação prejudicaria o sustento de quem mais dele precisa.   
Como muito bem salientado pela dra. Pilar Coutinho, com o julgamento da ADI se começa a enfrentar temáticas em que imperam as desigualdades de gênero. Mas é preciso muita cautela, pois “a decisão pode levar, entretanto, a uma série de distorções sistêmicas, além do desejado fortalecimento da igualdade de gênero, ao criar, por exemplo, uma situação de não inclusão na base do Imposto de Renda da pensão, com dedução dos gastos correspondentes, o que é uma negação da lógica do próprio tributo” [1]. 
No mesmo sentido, salienta a dra. Tathiane Piscitelli que outra distorção possível decorrente de decisão favorável aos contribuintes, seria a não tributação dos valores em nenhuma das pontas. Como proposta de solução à problemática, aponta que “seria permitir a dedução dos valores até o limite de isenção mensal do imposto de renda, sem que isso afaste o direito de usufruir das deduções legais” [2]. 
Feitas estas considerações, verifica-se que a insurgência das temáticas que envolvam a tributação e a desigualdade de gênero começam a se sobressair, tal como ocorreu com a tributação do salário-maternidade, em que o STF, ao julgar o Recurso Extraordinário 576.967, Tema 72 da Repercussão Geral, reconheceu a inconstitucionalidade da incidência de contribuição previdenciária patronal sobre tais valores. Neste caso, a tributação seria um agravamento da desigualdade de gênero, vez que a contratação de mulheres, possíveis futuras mães, se tornava mais cara ao empregador.   
Nada obstante ao pedido de destaque efetivado em fevereiro na ADI 5.422, pelo ministro Gilmar Mendes, no plenário do Supremo Tribunal Federal afastou a incidência do IRPF sobre valores decorrentes do direito de família recebidos a título de alimentos ou de pensões alimentícias. A decisão se deu, na sessão virtual finalizada em 3 de junho de 2022. 
Já em 3 de outubro deste mesmo ano, o STF rejeitou os embargos declaratórios opostos pela União, afastando o pedido de modulação dos efeitos da decisão, o que implica na possibilidade de repetição do indébito para os contribuintes que tenham realizado o recolhimento indevido do tributo nos cinco anos anteriores à propositura de eventual ação judicial.  
A correção de distorções na tributação que fomentem a desigualdade de gênero no país devem ser enfrentadas pela sociedade civil, mas também pelos legisladores (as) e julgadores (as) naquilo que lhes compete, de modo que a tributação não seja mais um dentre tantos fatores que vulnerabilizem e estigmatizem a mulher, mãe, trabalhadora na sociedade brasileira.

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JOTA

Distorções tributárias que fomentem desigualdade de gênero devem ser enfrentadas

Tributação de pensão alimentícia pelo IRPF e a desigualdade de gênero no país

Distorções tributárias que fomentem desigualdade de gênero, como a tributação de pensão alimentícia pelo IRPF, devem ser enfrentadas