Opinião e Análise

Ariana Avansini

Muito se fala sobre a desigualdade de gênero sob várias perspectivas do Direto, mas pouco se debate as discriminações ou quebras de isonomia em matéria tributária.
Assim, embora ainda incipiente, os defensores da discussão da igualdade de gênero cada vez mais mobilizam debates<a href="#_ftn1" name="_ftnref1">[1]</a> para defender políticas fiscais que envolvam o estudo sobre tributos, direitos das mulheres e justiça de gênero.
<a href="https://conteudo.jota.info/jota-pro-tributos?utm_source=Banner%20site&amp;utm_medium=Artigos&amp;utm_campaign=CTA_Tributos_materias" rel="attachment wp-att-291213"><img class="size-medium wp-image-291213 aligncenter" src="https://www.jota.info/wp-content/uploads/2021/01/jota-pro-tributos-v2.jpg" alt="" width="300" height="300" /></a>Apesar de muito debatida em outros países<a href="#_ftn2" name="_ftnref2">[2]</a><a href="#_ftn3" name="_ftnref3">[3]</a>, a tributação de gênero ainda é pouco explorada no Brasil. A despeito da ausência de vieses explícitos na legislação brasileira sobre questões discriminatórias, seria possível argumentar sobre a existência de vieses implícitos na tributação do consumo e da renda.
Com relação a tributação sobre o consumo, podemos destacar a prática internacionalmente conhecida como “Pink Tax” que consiste em atribuir preços mais altos a produtos destinados ao público feminino, que leva a uma consequência imediata de tributação mais elevada.
Nesse contexto, diversos países vêm adotando medidas para combater a desigualdade tributária entre gêneros<a href="#_ftn4" name="_ftnref4">[4]</a>. Inclusive, no âmbito do “Pink Tax”, mulheres têm divulgado orientações para dirigir o consumo do público feminino, como forma de protesto e luta contra a indústria que atribui maiores preços a produtos pelo simples fato de serem destinados ao público feminino.
Diante deste cenário, no Brasil, assim como em outros países do mundo, a instauração de uma tributação regressiva mediante impostos sobre consumo e da renda para as mulheres vem sendo debatido, especialmente em relação à renda por conta de uma remuneração historicamente mais baixa e práticas de mercado desfavoráveis ao público feminino, o que nos leva a discussão de justiça fiscal.
Temas como a tributação diferenciada entre mulheres e homens pelos desníveis de remuneração, repercussões da maternidade sobre a vida profissional e custos adicionais com saúde no momento gestacional, naturalmente, levam a uma reflexão sobre essa desigualdade e novas formas de mitigar tais efeitos para fins tributários.
Ainda que de maneira invisível, segundo dados do IBGE<a href="#_ftn5" name="_ftnref5">[5]</a>, tarefas domésticas impõem carga de trabalho muito maior para mulheres. Sobre esse ponto, podemos citar as questões trabalhistas, tendo em vista que muitas mulheres buscam maior flexibilidade de horários para cuidar da casa e dos filhos, se inserindo no mercado de trabalho informal, em que muitas ficam consequentemente à mercê das políticas públicas.
Ou seja, em virtude dessa adaptação, invariavelmente, o seguinte ciclo acontece (i) o trabalho informal gera uma possível sonegação de tributos, (ii) que propicia falta de recursos para implementar políticas e programas de prevenção para combater, por exemplo, a violência contra as mulheres, (iii) o que gera uma falta de mecanismos do Estado para reinserir estas mulheres novamente no mercado formal de trabalho.
Outras consequências surgem à medida que os governos estão sob pressão para aumentar a carga tributária, em especial nesta pandemia, e fazem isso aumentando os impostos indiretos que têm impacto desproporcional entre as mulheres, sobretudo as que possuem renda mais baixa.
<blockquote class="jota-article__eye">No entanto, mesmo sendo evidente que o tributo incidente sobre o consumo impacta as mulheres, as conversas acerca de um maior empoderamento econômico feminino nem sequer tangenciam esse ponto.</blockquote>
Neste aspecto, pouco se estuda os efeitos dessa prática discriminatória no mercado brasileiro principalmente para aquelas que mais precisam.
Ora, deveriam ser criadas medidas tributárias de incentivo para que empresas contratassem mulheres, considerando o período gestacional, filhos pequenos e maior carga de trabalho em casa, por exemplo?
Essa pandemia, sob vários aspetos, nos escancarou o quanto a mulher é demandada em casa nestes momentos de necessidade e, pior, o quanto foram afetadas em seus empregos e na progressão de suas carreiras. Ainda de maneira tímida, o Supremo Tribunal Federal (STF) deu um passo importante na discussão envolvendo tributação e gênero.
No julgamento do RE 576.967/2020, ao reconhecer a inconstitucionalidade da incidência da contribuição previdenciária a cargo do empregador sobre o salário maternidade, trouxe para a pauta a discussão sobre a discriminação da mulher nos ambientes de trabalho e o que pode ser feito para reduzir este fato. Explica-se.
Como mais uma prática discriminatória, o salário maternidade era custo para quem empregava, ou seja, a contratação de homens acabava sendo, invariavelmente, mais barata para os empregadores, que ainda precisavam contar com o fato de eventual substituição da funcionária durante o período de licença maternidade.
Nesse sentido, o julgamento do STF é um marco importante pelo simples fato de o julgamento ter ocorrido com base no princípio da isonomia, posto que a mulher não pode ser prejudicada em um ambiente de competição por uma vaga de trabalho em virtude de o empregador ter que considerar eventual custo adicional a título de salário maternidade.
Assim, apesar de parecer um tema antigo, quase superado, em que muitos preferem o discurso negacionista de que não há discriminação na tributação, o que se percebe na prática é que em algumas situações a posição da mulher é de fato mais vulnerável.
Por esse motivo, este tema precisa ser considerado nas propostas de reforma tributária. Ora, hoje as mulheres representam 51,8%<a href="#_ftn6" name="_ftnref6">[6]</a> da população brasileira, isto é, mais da metade da população sendo negligenciada por muitos temas, inclusive os tributários.
O empoderamento da mulher depende de medidas efetivas do Estado e da sociedade para que haja uma redução das desigualdades entre homens e mulheres, sendo a tributação um dos elementos que precisa ser melhor equacionado. Não adianta defendermos igualdade de gênero sem pensarmos em justiça fiscal!
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O episódio 52 do podcast Sem Precedentes discute os bastidores e as desconfianças envolvendo o caso Lula no Supremo Tribunal Federal. Ouça:
https://youtu.be/1T8EYyNCQeM
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<a href="#_ftnref1" name="_ftn1">[1]</a> PISCITELLI, Tathiane, et ali. Tributação e gênero. Jota, 3 mai. 2019. Disponível em: &lt;https://www.jota.info/opiniao-e-analise/artigos/tributacao-e-genero-03052019&gt;. Acesso em: 24 de setembro de 2020.
<a href="#_ftnref2" name="_ftn2">[2]</a> UNIÃO EUROPEIA. Committee on Economic and Monetary Affairs Committee on Women’s Rights and Gender Equality. REPORT on gender equality and taxation policies in the EU (2018/2095(INI). [Buxelas]: [s.n.], 2018. Disponível em: &lt;http://www.europarl.europa.eu/doceo/document/A-8-2018-0416_EN.pdf&gt;. Acesso em: 24 de setembro de 2020.
<a href="#_ftnref3" name="_ftn3">[3]</a> CARPRARO, Chiara. Women's Rights and Fiscal Justice. SUR - International Journal on Human Rights, v. 24, pp. 17-26, 2016. Disponível em: &lt;https://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=3021958&gt;. Acesso em: 24 de setembro de 2020.
<a href="#_ftnref4" name="_ftn4">[4]</a> THE TAXCAST 76: Tax justice, women and UN human rights conventions: our April 2018 podcast. [Locução de:] NAOMI FOWLER. [S.I.] 24 abr. 2018. Podcast. Disponível em: &lt; https://www.taxjustice.net/2018/04/24/tax-justice-women-and-un-human-rights-conventions-our-april-2018-podcast/&gt;. Acesso em: 24 de setembro de 2020.
<a href="#_ftnref5" name="_ftn5">[5]</a> Disponível em: &lt;https://agenciadenoticias.ibge.gov.br/agencia-noticias/2012-agencia-de-noticias/noticias/18568-tarefas-domesticas-impoem-carga-de-trabalho-maior-para-mulheres&gt;.
<a href="#_ftnref6" name="_ftn6">[6]</a> Informação disponível em: &lt;<a href="https://educa.ibge.gov.br/jovens/conheca-o-brasil/populacao/18320-quantidade-de-homens-e-mulheres.html">https://educa.ibge.gov.br/jovens/conheca-o-brasil/populacao/18320-quantidade-de-homens-e-mulheres.html</a>&gt;. Acesso em 05 de março de 2021.

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JOTA

Empoderamento feminino depende de medidas efetivas do Estado e da sociedade para reduzir desigualdades

No mês das mulheres que tal falarmos de justiça fiscal e desigualdade de gênero?

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