Opinião e Análise

Renata Correia Cubas

Ariane Costa Guimarães

As controvérsias sobre o local do recolhimento do <a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/iss">ISS</a> não são recentes e, ao longo das últimas décadas, tem se acirrado diante de conflitos entre municípios da prestação e do tomador e de legislação complementar, que buscou deslocar a competência para o recolhimento do ISS do local da prestação para o do tomador/destino do serviço para alguns serviços com características especificas de funcionamento, entre eles os serviços relacionados a gestão de planos de saúde, por exemplo. 
Os anos de litígio sobre o tema do local do recolhimento e tentativas de resolução por leis complementares, que trouxessem com mais clareza definição do local do recolhimento, e agora uma <a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/reforma-tributaria">reforma tributária</a>, pareceram prometer mais simplicidade e trazer mais segurança ao tema, com diminuição substancial dos litígios a respeito do local da prestação, numa nova relação fisco contribuinte.
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Mas a transição promete ser árdua, pois enquanto ela se encaminha no âmbito da reforma, com previsões que buscam dar mais clareza às diretrizes sobre a tributação no destino, juntamente com reduções significativas para a saúde com relação à carga tributária do IBS e da CBS em substituição ao ICMS, IPI, ISS e PIS e Cofins para esse setor, ainda estamos discutindo o tema de local da prestação em serviços de saúde em especial de análises clínicas. Infelizmente, o encaminhamento do tema atualmente não indica um horizonte de resolução rápida ou de diminuição de litígios: ao contrário, os promove.
A insegurança particular do setor de saúde, notadamente para os serviços de gestão de planos e de análises clínicas, reside especialmente no fato de que ainda há muita confusão entre as atividades abrangidas por esses atores do mercado de saúde e que são consecução das atividades-fim e atividades-meio em contratos complexos.
Exatamente porque a saúde tem em si por princípio a universalização, é preciso que estes serviços se expandam e estejam em todos os lugares, mas a realização dos serviços em si, não necessariamente ocorre em todas as localidades para as quais os serviços são acessíveis e o acesso pode ser uma atividade autônoma e ou uma atividade-meio, meramente preparatória daquela maior e preponderante para a qual houve acesso, no bojo de um contrato complexo.  
Os desafios maiores dos prestadores destes serviços centrais da saúde, que buscam dar consecução ao princípio da universalização e ampliar o acesso, estão na exigência da tributação no local de acesso, que acaba por implicar no cumprimento de legislações diferentes em 5.570 municípios. 
Hoje, tais regras gerais para tributação não são uniformes sobre cumprimento de obrigações principal e acessórias e quando há mais de um município envolvido e não coincide local de prestação ou do tomados, não raramente temos legislações conflitantes resultando potencial dupla tributação de uma mesma operação.   
No caso dos planos de saúde, o assunto foi levado ao <a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/stf">Supremo Tribunal Federal</a> (<a href="https://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=5316998">ADPF 499</a>), quando antes mesmo da reforma tributária tratar da tributação no destino para este setor, sobreveio a <a href="https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lcp/lcp157.htm">Lei Complementar 157/2016</a> que alterou a <a href="https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lcp/lcp116.htm">Lei Complementar 116/2003</a> para estabelecer que o Imposto sobre Serviços de Saúde (ISS) incidente sobre os serviços de gestão de planos de saúde deveria ser pago no local do domicílio do tomador, e não no local do estabelecimento prestador de serviços.
Note-se que, também nesta ocasião, a definição de tomador para esses serviços não foi suficientemente clara e por essa razão mereceu capítulo especial nas exposições de motivos de todas as propostas de reforma tributária e justificou o afastamento de sua aplicação.  
No caso dos planos de saúde, ficou clara a impraticabilidade do recolhimento no sistema atual sem afronta a segurança jurídica, além de ser tema sensível ao pacto federativo e objeto da longa discussão trazida no bojo da reforma tributária. 
Já com relação aos laboratórios de análises clínicas, embora sequer previsão na legislação complementar a esse respeito exista para recolhimento no local do destino, há interpretações equivocadas sobre o conteúdo de serviços e sua tributação.
Quando tratamos dos serviços de análises clínicas, há confusão entre o local da atividades-meio como é o caso da coleta, por exemplo, que inclusive é um serviço autônomo da lista de serviços quando prestada autonomamente, e a atividade preponderante fim, de análise clínica propriamente dita. 
O tema demanda uma análise de mérito detida e infelizmente as recentes decisões do Superior Tribunal de Justiça (<a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/stj">STJ</a>), não parecem enfrentar a realidade dos fatos que permeiam a situação dos laboratórios e, certamente, gerarão aumento significativo de insegurança jurídica e de litigância, ao considerar o município da coleta como competente para exigir o ISS no caso dos serviços de análises clinicas que ocorrem em outra municipalidade onde normalmente se encontram os centros de análise.
Tal entendimento tampouco leva em consideração a irrelevância deste critério para deslocamento de competência para a exigência do tributo, mesmo após termos vivido a pandemia e mostrado que a coleta pode ocorrer em qualquer lugar (domicílios, estacionamentos, unidades móveis etc.), enquanto que o cerne do serviço ocorre em unidades construídas e dedicadas com profissionais da saúde e todos os ativos necessários a consecução da analise laboratorial, localizadas em municípios que exigem o ISS pelo fato de que o serviço está sendo prestado naquela localidade. 
As decisões do STJ no sentido de estabelecer o município da coleta como o competente para exigir o ISS traz consequências não dimensionadas na esfera da litigância tributária que nos indicam que a melhoria destas relações, e alcance da maior segurança jurídica, ainda está longe de ser alcançada. 
Veja-se: os municípios em que estão localizados os núcleos técnico operacionais dos laboratórios arrecadam o imposto e o fizeram e fazem com base também na interpretação que sempre fizeram do texto normativo municipal ao longo de décadas. 
Assim sendo, para que os laboratórios não tenham de efetuar duplamente o pagamento do ISS, algumas medidas que aumentam a litigância, são inevitáveis para a preservação de direitos: 
<ol>
<li>ações de repetição de indébito propostas pelos laboratórios contra os municípios para os quais foi feito pagamento indevido nos últimos cinco anos;</li>
<li>propositura de ações judiciais para consignação em pagamento em face de todos os municípios que realizam a coleta e em que sediados os núcleos técnicos operacionais para depósito judicial dos valores devidos a título de ISS, já que não há entendimento vinculante a respeito do assunto e as municipalidades em que sediados referidos núcleos técnicos operacionais nos quais ocorre efetivamente a prestação dos serviço de análise, cujo resultado inclusive em sua maioria é recebido por internet, continuarão a exigir o ISS desses laboratórios; e</li>
<li>denunciação à lide dos municípios para os quais foram feitos os pagamentos do ISS, especificamente nos processos em que os laboratórios estejam sendo exigidos pelos municípios em que realizadas coletas. </li>
</ol>
Referidas frentes envolverão milhares de novas ações judiciais em todo o território nacional e, ainda assim, remanescerão dúvidas operacionais. A saber: no caso em que há pessoa jurídica que realiza unicamente o serviço de coleta e recolhe o ISS sobre o custo segregado desta atividade, tais empresas precisarão efetuar o recolhimento adicional do imposto sobre o valor total da análise clínica? Qual o procedimento no caso de retenção do ISS? Contratos devem ser repactuados já que as operações tal como são tem seu núcleo desconsiderado?  
Tais fatores, de alta complexidade, foram considerados pelo STF quando declarou a inconstitucionalidade das novas regras veiculadas pela LC 157/16: "A ausência dessa definição e a existência de diversas leis municipais que tratam do tema, em suas respectivas localidades, geram forte abalo no princípio da segurança jurídica, apto a potencializar os conflitos de competência entre unidades federadas e um retrocesso nas relações, comprometendo a regularidade da atividade econômica, com consequente desrespeito à própria razão de existência do artigo 146 da Constituição Federal", segundo o ministro Alexandre de Moraes. 
Tais considerações são totalmente pertinentes na realidade atual, na qual se fez necessária uma reforma tributária para a mudança de critério pretendida, e cuja implementação ainda segue em discussão para que a simplicidade e diminuição dos litígios efetivamente ocorra. 
Os recentes posicionamentos do STJ sobre o tema colocam em xeque a universalização da saúde e especialmente para os laboratórios, a tão sonhada diminuição de litigância neste tema, já que não há como dar consecução a referido posicionamento sem que haja duplo recolhimento do ISS ou litígios para garantir sua não ocorrência dada a estrutura atual deste mercado e a cobrança do ISS pelos municípios nos quais os serviços de análises efetivamente ocorrem.

reforma tributária clínicas

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JOTA

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