Opinião e Análise

Jacintho Arruda Câmara

Comentei neste <a href="https://www.jota.info/opiniao-e-analise/colunas/publicistas/uma-lei-de-processo-administrativo-nacional-05042022">espaço</a> que a comissão de juristas instituída pelo Senado para reformar a lei de processo administrativo federal (Lei 9.784/1999) poderia propor a sua nacionalização. A ideia, de fato, foi apresentada e convertida no <a href="https://legis.senado.leg.br/sdleg-getter/documento?dm=9199165&amp;ts=1674176726859&amp;disposition=inline">PL 2481/2022</a>.
Como esperado, houve reação de parte da comunidade jurídica, que considera a proposta contrária ao princípio federativo. A imposição, pelo <a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/congresso">Congresso</a>, de normas sobre processo administrativo a todos os entes federativos invadiria competências próprias à auto-organização desses entes.
A preocupação quanto à invasão de competências dos entes subnacionais é relevante. Feriria suas autonomias se, a pretexto de editar norma de processo administrativo, o legislador nacional disciplinasse o próprio exercício das competências estaduais e municipais (divisão interna de competências, tramitação de matérias, critérios de atribuição de direitos, fixação de sanções administrativas e assim por diante).
Contudo, há direitos e garantias dos particulares em face do poder público que precisam ser reconhecidos e aplicados de maneira uniforme em todas as esferas. Esse padrão mínimo deve ser obedecido por qualquer entidade da administração pública, sendo por isso importante que lei nacional o imponha. A atual lei de processo administrativo federal já pode ser nacionalizada sem ofender a qualquer competência inerente à autonomia dos entes subnacionais. O Superior Tribunal de Justiça (<a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/stj">STJ</a>) reconhece tal característica da lei vigente e a aplica subsidiariamente aos entes desprovidos de lei processual própria.
Difícil sustentar que, por força do princípio federativo, entes subnacionais devam ter regras próprias sobre aplicação de princípios de direito administrativo; definição dos legitimados a participar de processos administrativos; segurança e transparência nos processos administrativos eletrônicos; revogação, anulação e convalidação de atos administrativos; garantias básicas dos processos de cunho sancionatório e assim por diante. Esses assuntos, que compõem o cerne do projeto em debate, merecem tratamento uniforme. Eles não afetam a autonomia administrativa de estados ou municípios. Todos os entes da federação continuarão aptos a disciplinar o que a autonomia administrativa lhes reserva.
Assuntos de ordem mais concreta abordados pelo projeto, como a fixação de prazos para deliberar e a previsão de instrumentos de atuação, receberam tratamento que respeita a autodeterminação de cada ente federativo. Boa parte dessas normas tem caráter meramente autorizativo. Quando não, elas estipulam padrões (como o prazo para decidir um processo), mas admitem criação de regra legal diferente, a depender da conveniência de cada ente.
Espero que os debates parlamentares se ocupem mais com o aperfeiçoamento das ideias abordadas no projeto do que com a polêmica sobre a nacionalização da lei. O projeto não propõe usurpação de competências reservadas a outros entes federativos. O pacto federativo não está em risco. Leiam o projeto e fiquem tranquilos.

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JOTA

Fiquem tranquilos: a nacionalização da lei não afetará a autonomia dos entes subnacionais

Uma lei de processo administrativo nacional e o pacto federativo

Fiquem tranquilos: a nacionalização da lei não afetará a autonomia dos entes subnacionais. Afinal, o pacto federativo não está em risco.