Publicistas

Quais estrangeiros fazem a cabeça dos nossos administrativistas?

Uma investigação empírica sobre citações de autores estrangeiros

Eduardo Jordão
13/04/2021|07:10
Atualizado em 13/04/2021 às 07:21
sanção administrativa
Crédito: Unsplash

Como medir a influência de autores estrangeiros sobre os administrativistas brasileiros? Em pesquisa em andamento, Renato Toledo e eu optamos por examinar as bibliografias dos artigos da mais tradicional revista da área, a Revista de Direito Administrativo (RDA).

Ainda que o universo da RDA não possa ser rigorosamente identificado com o do direito administrativo brasileiro, a utilização desta revista se justifica por se tratar de referência do ramo, com publicação há mais de 70 anos, foco quase exclusivo no direito administrativo e alcance razoavelmente nacional.

Na pesquisa, pretendemos comparar diferentes períodos. Mas a parte já tratada da base de dados, referente aos últimos 10 anos da revista (de 2011 a 2020), revela informações interessantes (confira tabela).

Nas 30 edições deste período (excluídas duas extraordinárias), foram 207 artigos publicados por brasileiros. Eles contêm referência a 6.162 fontes bibliográficas, das quais 2.186 correspondem a trabalhos de estrangeiros.

Apenas 64 estrangeiros obtiveram mais de 5 menções nas bibliografias consultadas (v. tabela anexa). As estatísticas a seguir referem-se a eles.

Estes autores respondem por parcela significativa dos trabalhos de estrangeiros citados: 583 (26,6%). 16 deles são alemães, 15 são americanos e 10 são portugueses. Franceses são 5 e argentinos, ingleses e italianos empatam com 4.

Quando se contabiliza não o número de autores, mas o de menções dentro da amostra, eis os números, conforme a nacionalidade dos autores: EUA (28%), Alemanha (23%), Portugal (19%), França, Argentina e Espanha (5%), Itália, Inglaterra e Argentina (4%).

O campeão de citações é o americano Cass Sunstein, com 41 menções nas bibliografias consultadas. O português Gomes Canotilho (35), e o americano Richard Posner (25) vêm na sequência. Garcia de Enterría (20), Ronald Dworkin (18) e Robert Alexy (18) também tiveram destaque. Os primeiros autores da França (Jean Rivero) e da Itália (Sabino Cassese e Riccardo Guastini) tiveram somente 7 menções.

Os dados sugerem pelo menos três respostas à pergunta título deste texto.

  • Nossos administrativistas parecem pouco abertos à produção estrangeira feminina. Há apenas 3 mulheres entre os 64 estrangeiros mais citados: a portuguesa Maria Estorninho (12), a americana Susan Rose-Ackerman (8) e a alemã Hannah Arendt (6).
  • Fazem a cabeça de nossos administrativistas muitos “não juristas”, como Habermas (19), Luhmann (6) e Marx (5). Vários destes são alemães (7 no total), o que pode significar que a influência específica da doutrina jurídica alemã pode ser menos significativa do que os números acima sugerem.
  • Os dados ainda serão comparados com os de outros períodos, mas parecem confirmar uma queda da influência das antes predominantes doutrinas francesa e italiana – e a ascensão paralela da americana. A propósito, dentre os franceses que obtiveram mais de 5 menções, os dois únicos juristas já não estão mais vivos (René David e Jean Rivero), o que sugere uma fraca renovação da influência deste país.

O episódio 56 do podcast Sem Precedentes discute a CPi da Covid-19 e o choque do Supremo Tribunal Federal com o presidente Jair Bolsonaro. Ouça: