Opinião e Análise

Mariana Mota Prado

Em outubro de 2021, foi aprovada a nova <a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/lei-de-improbidade-administrativa">Lei de Improbidade Administrativa</a>, impondo mudanças significativas nesse importante instrumento de combate a corrupção. Como notaram <a href="https://www.jota.info/opiniao-e-analise/colunas/publicistas/a-lei-da-improbidade-tem-de-mudar-28092021">Floriano de Azevedo Marques</a> e <a href="https://www.jota.info/opiniao-e-analise/colunas/publicistas/o-que-o-presidente-deveria-vetar-na-nova-lei-de-improbidade-administrativa-12102021">Vera Monteiro</a>, algumas mudanças são bem-vindas e outras nem tanto. Uma delas foi a competência exclusiva do Ministério Público para propor tais ações, que <a href="https://www.jota.info/stf/do-supremo/stf-mantem-legitimidade-da-advocacia-publica-para-propor-acoes-de-improbidade-31082022">o STF declarou inconstitucional</a>. A decisão pode resolver um problema significativo, mas pode também agravar abusos.
Ao dar competência exclusiva ao Ministério Público, a nova lei eliminava a possibilidade de que o ente da administração lesado ingressasse com a ação de improbidade. Como <a href="https://www.jota.info/opiniao-e-analise/artigos/alteracao-da-lei-de-improbidade-administrativa-e-restricao-da-legitimidade-ativa-29012021">Victor Aguiar de Carvalho</a> e <a href="https://globalanticorruptionblog.com/2021/12/17/the-end-of-institutional-multiplicity-a-drawback-in-the-new-administrative-improbity-law/">Rafael Tonicelli </a>articularam, tal medida reduziria a multiplicidade institucional no combate a corrupção no Brasil. A multiplicidade institucional, que explorei em uma série de publicações (<a href="https://muse.jhu.edu/article/840193/pdf">aqui</a>, <a href="https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S1062976916300564">aqui</a> e <a href="https://www.scielo.br/j/rdgv/a/nDDK6nwrhjc7HVB9JMGTLMj/?lang=en">aqui</a>), se refere a arranjos nos quais várias instituições têm a capacidade de desempenhar a mesma função dentro de um regime jurídico. Essa redundância permite que uma instituição entre em cena caso a outra falhe. A decisão do STF manteve a multiplicidade institucional e, portanto, preservou a possibilidade de outra instituição atuar caso o Ministério Público não tenha recursos para ingressar com a ação de improbidade, ou esteja capturado.
Seria a preservação da multiplicidade institucional uma razão para celebrar a decisão? Em artigo nesta coluna, <a href="https://www.jota.info/opiniao-e-analise/colunas/publicistas/advocacia-publica-acao-improbidade-22022022">Carlos Ari Sundfeld</a> argumentou que as entidades administrativas têm outros instrumentos para atuar diretamente contra corrupção e combater a improbidade administrativa. Portanto, a reforma legislativa não teria eliminado a multiplicidade institucional e talvez o STF tenha resolvido um problema que não existia. Além disso, há o risco da corte ter reintroduzido um problema que o legislador tentava resolver. Ao dar exclusividade ao Ministério Público, o legislador tentou reduzir o risco das ações de improbidade serem utilizadas para propósitos políticos. O STF pode ter apenas ressuscitado o problema.
A questão é espinhosa e aponta para a necessidade de usar mais evidência empírica para informar propostas legislativas e decisões judiciais. A escolha entre manter ou não a multiplicidade institucional seria mais útil caso tivesse sido baseada em análise cuidadosa do percentual das ações de improbidade propostas pela advocacia pública, e de quantas dessas podem ser consideradas abusivas. Talvez o problema de abuso não seja significativo, como assume o legislador. Caso esse percentual seja significativamente maior do que o número de ações propostas por propósitos legítimos, talvez a exclusividade do Ministério Público se justifique. Se o percentual de abuso for mais alto em municípios, e relativamente baixo no nível estadual ou federal, talvez a exclusividade pudesse ser mantida apenas para certos níveis da federação. Mas para justificar tal exclusividade de forma ampla ou restrita, precisaríamos também investigar se as ações de improbidade propostas pelo Ministério Público não podem ser também abusivas e, caso sejam, com qual frequência isso ocorre. Se todas as instituições envolvidas podem atuar de maneira abusiva e o fazem com frequência, a multiplicidade institucional é parte do problema, ao invés de solução.

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JOTA

Não exclusividade do MP para ações de improbidade talvez resolva um problema, mas é difícil ter certeza sem dados empíricos


A multiplicidade institucional na Lei de Improbidade Administrativa

A não exclusividade do Ministério Público para ações de improbidade talvez resolva um problema, mas é difícil ter certeza sem dados empíricos