Opinião e Análise

Mariana Mota Prado

A adoção da análise de impacto regulatório (<a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/air">AIR</a>) no Brasil, apesar de ser resultado de pressões da OCDE, é sem dúvida um passo na direção certa. A obrigação de considerar as consequências da regulação serve, em princípio, como antídoto contra regras arbitrárias, irracionais ou equivocadas. Ao forçar o regulador a identificar as possíveis consequências da regulação proposta, aumenta-se transparência, accountability e potencialmente a qualidade do que se produz na administração pública. Esses pressupostos explicam por que o <a href="https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2020/decreto/d10411.htm">Decreto 10.411/20</a>, que regulamentou o uso da AIR pelas agências reguladoras e outros órgãos da administração federal, foi em geral <a href="https://www.jota.info/casa-jota/analise-de-impacto-regulatorio-desafios-24072020">bem recebido pelos especialistas</a>.
Todavia, seu caráter não vinculante é considerado um ponto fraco do decreto (Art. 21: “A inobservância ao disposto neste Decreto não constitui escusa válida para o descumprimento da norma editada e nem acarreta a invalidade da norma editada”). A impressão geral, como bem resumiu José Vicente Santos de Mendonça, é que o decreto é tão somente uma sugestão. <a href="https://www.jota.info/opiniao-e-analise/colunas/reg/a-regulamentacao-da-analise-de-impacto-regulatorio-na-administracao-federal-01072020">“É bom que a Administração Federal a siga, mas, se não seguir, tudo bem.”</a>
Talvez a ideia de manter a AIR como optativa no Brasil devesse ser celebrada. Pesquisas empíricas mostram que boa parte dos órgãos federais não estão prontos para usar de maneira adequada e efetiva a AIR (<a href="https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S095717871830345X">aqui</a> e <a href="https://www.scielo.br/j/rap/a/3RtddtZrVhV7dFQsR5s3rch/?lang=en">aqui</a>). Obrigá-los a fazê-lo exigiria alocação de volumosos recursos para treinamento e capacitação de pessoal sem muita clareza dos benefícios que esse investimento traria. A AIR conduzida no Brasil é primordialmente baseada na análise de custo-benefício, que é uma <a href="https://www.jota.info/opiniao-e-analise/colunas/constituicao-empresa-e-mercado/analises-impacto-regulatorio-airs-03032021">metodologia notoriamente limitada</a> para analisar setores onde há questões redistributivas, efeitos de longo prazo e riscos. Portanto, seu caráter opcional talvez permita que órgãos do governo apenas adotem AIR quando estiverem habilitados, e somente nos setores em que ela é de fato benéfica. Um bom exemplo é o uso da AIR na <a href="https://www.google.com/url?sa=t&amp;rct=j&amp;q=&amp;esrc=s&amp;source=web&amp;cd=&amp;ved=2ahUKEwilxb3ypLWBAxUMkIkEHUkZA3EQFnoECBYQAQ&amp;url=https%3A%2F%2Fageconsearch.umn.edu%2Frecord%2F212060%2Ffiles%2FSousa-Regulatory%2520Impact%2520Analysis%2520in%2520Brazil-1002.pdf&amp;usg=AOvVaw0cSQnogp5Y8rS6mmXg30tO&amp;opi=89978449">defesa agrícola</a>.
O pressuposto de que a falta de AIR deveria gerar a nulidade do ato regulatório parece inspirada na experiência americana. Mas lá há uma infraestrutura institucional robusta (vide o Office of Information and Regulatory Affairs) para checar a qualidade dessas análises. Sem a existência dessa infraestrutura institucional, a invalidação desses atos no Brasil estimularia apenas um engajamento vazio com a AIR. O regulador veria a AIR simplesmente como uma formalidade e não como uma ferramenta que pode enriquecer o processo decisório.
É difícil, todavia, reconciliar a natureza não vinculante do decreto com sua <a href="https://www.jota.info/opiniao-e-analise/colunas/reg/a-regulamentacao-da-analise-de-impacto-regulatorio-na-administracao-federal-01072020">longa lista de exceções</a>. Além de negar ao regulador a capacidade de decidir quando a AIR é adequada, as exceções estão sendo interpretadas de maneira bastante expansiva, reduzindo o potencial transformador do decreto. <a href="https://revista.enap.gov.br/index.php/RSP/article/download/5954/3781/21081">A Anvisa é um exemplo desse problema</a>.
Em suma, no Brasil atual, a opção feita pelo Decreto 10.411 parece acertada em princípio, mas precisamos de ajustes para colher seus benefícios.

Brasília 60 Anos – Esplanada dos Ministérios

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JOTA

Os benefícios do caráter não vinculante do Decreto 10.411/20

A Análise de Impacto Regulatório deveria ser obrigatória?

Os benefícios do caráter não vinculante do Decreto 10.411/20 em relação à análise de impacto regulatório (AIR)