Opinião e Análise

Ronaldo Dias Lopes Filho

O que se pretende no presente texto é apresentar argumentos para a ampliação das atuais hipóteses previstas na regulamentação infralegal da transação na cobrança por meio de proposta individual do devedor quando presente a figura do responsável tributário.
É preciso delimitar o contexto para a situação inerente à responsabilidade tributária do terceiro incluído no polo passivo de execução fiscal. Isso ocorre, por exemplo, quando constatada algumas das hipóteses do art. 135, incisos I a III, do CTN. São as normas de responsabilidade tributária que impõem a obrigação contra o terceiro, no que toca aos tributos devidos pela sociedade.
Dentre as modalidades tratadas na <a href="http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2020/lei/l13988.htm">Lei 13.988/2020</a> encontra-se a transação tributária na cobrança da dívida ativa por meio de proposta individual do devedor (art. 10). Ocorre que a atual regulamentação autoriza o não conhecimento de propostas individuais de débitos consolidados inferiores a R$ 15 milhões (§ 1º, art. 4º, da Portaria nº 9.917/2020).
Em decorrência do elevado valor, verifica-se que dificilmente o responsável tributário, que em regra é pessoa física, terá a sua proposta analisada.
Pesam a favor da legitimidade do limite a outorga de discricionariedade pelo legislador, o fato de a PGFN oferecer a modalidade da transação por adesão para a negociação de débitos abaixo desse valor e os problemas pragmáticos inerentes a uma elevada quantidade de interessados nas transações por meio de proposta individual.
Entretanto, o atual regulamento da transação tributária por meio de proposta individual do devedor não poderia tratar da mesma maneira o devedor contribuinte e o devedor responsável.
A modalidade da transação tributária por adesão destinada ao contribuinte, com a previsão de descontos e de prazos e formas de pagamentos especiais, apresenta-se condizente com o princípio da capacidade contributiva. Por outro lado, o contexto para a adesão do responsável tributário a essa mesma transação é diverso: é preciso que se tenha como premissa a diferença das normas que regulam essa relação, distintas daquelas entre o fisco e o contribuinte.
No voto condutor do RE nº 562.276, Tema nº 13 de Repercussão Geral, a ministra Ellen Gracie ressaltou que do fato gerador só surge a obrigação direta do contribuinte e: “[...] o dever fundamental de pagar tributos está associado às revelações de capacidade contributiva a que a lei vincule o surgimento da obrigação do contribuinte".<a href="#_ftn1" name="_ftnref1">[1]</a> Trata-se do leading case em que o STF reconheceu como sendo inconstitucional – seja sob o aspecto formal ou material – a responsabilidade solidária de sócios de limitadas por dívidas junto à seguridade social<a href="#_ftn2" name="_ftnref2">[2]</a>.
Diante disso, se o legislador é obrigado a observar a diferença entre contribuinte e responsável, não nos parece que a restrição ao acesso da transação por meio de proposta individual do responsável tributário com dívidas inferiores a R$ 15 milhões encontra-se coerente com as normas de responsabilidade tributária, especificamente no que toca ao princípio da capacidade contribuitiva que deve balizar as obrigações tributárias devidas pelo terceiro.
A decisão do STF sobre o Tema nº 13, em decorrência do atual sistema de precedentes que pretende proporcionar maior coerência aos julgados, deve ser observada pela autoridade regulamentadora das transações por meio de proposta individual do devedor responsável tributário<a href="#_ftn3" name="_ftnref3">[3]</a>.
Os critérios para aferição do grau de recuperabilidade das dívidas, os parâmetros para aceitação da transação individual, a concessão de descontos, dentre eles o insucesso dos meios de cobrança, vinculação de benefícios e a amplitude da capacidade contributiva, merecem atenção por parte da autoridade regulamentadora no que toca ao responsável tributário, pois são distintos daqueles destinados ao contribuinte (inc. V, art. 14, da Lei 13.988/2020).
Assim sendo, além da regulamentação destinada ao contribuinte, o ato regulamentador dever ser adequado ao devedor responsável tributário.
A restrição da responsabilidade do terceiro é bastante discutida no âmbito dos executivos fiscais, seja por meio de exceção, embargos à execução etc. A valoração das provas produzidas em prol da defesa do terceiro, inerentes à proporção do descumprimento dos seus deveres que repercutiram na ocorrência do fato gerador ou no descumprimento da obrigação tributária, pode ser realizada pela autoridade responsável pela cobrança a fim de balizar a transação tributária do responsável.
A depender das provas produzidas pelo terceiro, é possível a delimitação da responsabilidade pelo próprio órgão de cobrança, como, por exemplo, a restrição da obrigação do terceiro no período em que não exerceu a administração da empresa, antes de uma decisão judicial sobre tais argumentos alinhavados em exceção ou embargos. Além disso, ao terceiro é possível comprovar os critérios de recuperabilidade das dívidas para fins de aceitação da proposta.
A transação por adesão, previamente parametrizada, não proporciona ao responsável tributário a adequada apuração da sua responsabilidade considerando a necessidade de decisão administrativa fundamentada pelo órgão de cobrança.
Nota-se que a proposta individual de transação tributária do responsável pode ser tida como o início de procedimento a ser dirimido no âmbito dos órgãos de cobrança, que poderão aceitá-la ou não, dentro dos limites de ato regulamentar e de maneira fundamentada.
Para isso, consequentemente, torna-se necessária a outorga de certo grau de discricionariedade ao procurador responsável pela execução fiscal, autoridade que possui condições de analisar de maneira individualizada a extensão da obrigação e a probabilidade de êxito da recuperação do crédito tributário inerentes ao terceiro.
Por outro lado, o aparelhamento da PGFN para o atendimento dos procedimentos relativos a propostas individuais é de suma importância, principalmente porque poderá proporcionar uma redução de discussões havidas no âmbito judicial. As propostas de transações individuais são passíveis de homologação judicial, nos termos do inc. VIII do art. 725 do CPC, de maneira a proporcionar maior segurança jurídica às partes.
Enfim, parece-nos que o caminho menos tortuoso para a resolução das controvérsias envolvendo a responsabilidade tributária de terceiros encontra-se fora do executivo fiscal, apresentando-se a transação por meio de proposta individual como uma interessante opção posta no sistema pelo legislador que não deve ser restrita a grandes devedores, principalmente porque a maior massa processual envolve pequenas e médias cobranças.
<hr />
<a href="#_ftnref1" name="_ftn1">[1]</a> STF, Tribunal Pleno, julgado em 03/11/2011, DJe 09/02/2011.
<a href="#_ftnref2" name="_ftn2">[2]</a> A amplitude da decisão encontra-se nos Embargos de Declaração no RE nº 562.276, DJ nº 198 do dia 10/10/2014.
<a href="#_ftnref3" name="_ftn3">[3]</a> CPC, art. 927, inc. I a V.

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Resolução de controvérsias sobre responsabilidade tributária de terceiros está fora do executivo fiscal

Transação por meio de proposta individual do responsável tributário

Responsável tributário: Resolução de controvérsias sobre responsabilidade tributária de terceiros está fora do executivo fiscal