Opinião e Análise

Lisa Worcman

Marcel Alcades Theodoro

Rayane Dornelas Sukar

Renata Correia Cubas

Tatiana Penido

O avanço tecnológico gera novos desafios para a comunidade de intérpretes que atribuem sentido aos textos de direito positivo. Tais desafios permeiam a “economia digital” que tem consagrado novos métodos de transacionar. Muito mais que tendência, a comercialização por meio de plataformas digitais se tornou uma necessidade neste momento de distanciamento social em que vivemos.
A economia compartilhada tem como característica novas formas de facilitação de acesso a bens e serviços por meio de plataformas digitais. Tais plataformas apresentam diferentes modelos de negócio, dentre os quais está o marketplace. O marketplace nada mais é do que um grande shopping center virtual, onde vendedor e comprador podem se organizar e encontrar digitalmente para transacionar bens e serviços.
Com a chegada da pandemia, e a necessidade de varejistas fecharem suas portas físicas, muitos recorreram aos marketplaces para continuar suas atividades, e encontraram então uma janela para o mundo digital.  Em meio ao constante aumento de demanda nesse modelo de negócios, e a crescente queda na arrecadação, o Fisco (tanto estadual quanto federal) tem envidado esforços para atribuir também a esse intermediário digital o ônus da fiscalização.
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No âmbito estadual, a responsabilidade do marketplace pelo recolhimento do ICMS tem sido suscitada desde a edição do Convênio 106, de 29.9.2017, que previu, em sua cláusula quinta, que “as unidades federadas poderão atribuir a responsabilidade pelo recolhimento do imposto: I - àquele que realizar a oferta, venda ou entrega do bem ou mercadoria digital ao consumidor, por meio de transferência eletrônica de dados, em razão de contrato firmado com o comercializador;”. Ocorre que essa disposição traz diversos questionamentos no âmbito constitucional e legal.
Não obstante, diversos estados da nossa federação, como BA, CE, MT e RJ, entenderam por bem seguir as diretrizes do mencionado convênio e editar leis para disciplinar tal responsabilidade<a href="#_ftn1" name="_ftnref1">[1]</a>.
<blockquote class="jota-article__eye">Vale notar que muitos marketplaces não integram o arranjo de pagamento instituído, optando por ferramentas de pagamentos cada vez mais ubíquas no mercado.</blockquote>
Em diversas situações, sequer o fluxo financeiro das transações ocorridas no ambiente virtual passa pelo marketplace pois, nesses casos, o marketplace tem acesso somente ao valor que lhe é devido, sem acesso ao valor total pago pelos clientes, ou aos valores devido aos vendedores que atuam em sua plataforma.
Todavia, a transferência do ônus tributário ao marketplace tem se tornado tendência tanto no âmbito internacional como federal. Nesse sentido, há diversas iniciativas internacionais sobre a responsabilização das plataformas digitais pelas atividades que acontecem em seu ambiente e sob seu controle. A União Europeia determinou que a partir de julho de 2021 os marketplaces serão responsáveis pelo IVA sobre as atividades que estas intermedeiam.
Ademais, países como México, Colombia e Argentina estipularam uma necessidade de registro perante o fisco local para monitorar a atividade econômica de plataformas estrangeiras que não possuem presença física naqueles países. Vale notar que no âmbito internacional as iniciativas vão além da responsabilização e buscam a tributação das receitas de plataformas de comércio eletrônico com presença significativa local<a href="#_ftn2" name="_ftnref2">[2]</a>.
De outro lado, o Projeto de Lei n. 3.887, datado de julho de 2020, pretende alterar a legislação federal e instituir a Contribuição sobre Operações com Bens e Serviços (CBS). Com relação às plataformas digitais, o projeto inova ao propor que essas sejam “responsáveis pelo recolhimento da CBS incidente sobre a operação realizada por seu intermédio nas hipóteses em que a pessoa jurídica vendedora não registre a operação mediante a emissão de documento fiscal eletrônico”.
O projeto também prevê a responsabilização solidária de plataformas digitais localizadas no exterior pela CBS incidente sobre a importação. Apesar de mencionar que tais plataformas deverão se registrar com a Receita Federal, não há clareza sobre como se dará esse cadastro eletrônico e qual será a extensão desse monitoramento tributário de partes estrangeiras.
A despeito das lacunas do projeto, deve-se notar que o Código Tributário Nacional estabelece as normas gerais relativa à responsabilidade tributária, sendo que os artigos 134 e 135 expressamente determinam quem são os terceiros responsáveis tributários e em que circunstâncias eles surgem. Um rápido olhar sobre essas normas poderia resultar na conclusão de que, no marketplace, a plataforma poderia ser o terceiro, alheio à hipótese de incidência.
Em resumo, a economia compartilhada, por compreender novas formas de facilitação de acesso a bens e serviços por meio de plataformas digitais, traz um desafio tributário, uma vez que possibilita a realização de negócios por atores que, na economia tradicional, não teriam tanto espaço.
Tal desafio deve ser enfrentado de acordo com os parâmetros definidos pelo nosso sistema jurídico, especialmente os contornos constitucionais e previstos no Código Tributário Nacional. Dessa forma, a responsabilização solidária de plataformas como os marketplaces deve ser analisada com esse rigor.
Sendo certo que é necessário conceder aos Fiscos instrumentos de controle, vale a ponderação de formas alternativas de munirmos o Fisco de tal controle (por meio de obrigações acessórias) ou se devemos implementar mudanças mais profundas no nosso sistema tributário para permitir a responsabilização de plataformas como proposto.
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O episódio 45 do podcast Sem Precedentes trata de dois julgamentos que irão começar no Supremo Tribunal Federal (STF) e que interferem diretamente nas relações da Corte com o governo Bolsonaro e o Congresso Nacional. Ouça:
https://youtu.be/8vxcYqw2vRc
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<a href="#_ftnref1" name="_ftn1">[1]</a> E pasmem, mesmo Estados que ainda não internalizaram a cláusula 5ª do Convênio ICMS 106/2017 acharam a ideia tão boa que já estão imputando a responsabilidade solidária às plataformas de marketplace por meio de atuações fiscais!
<a href="#_ftnref2" name="_ftn2">[2]</a> A India, precursora dessas iniciativas, já em 2016 iniciou a tributação da publicidade on-line e expandiu a tributação para as plataformas de e-commerce em 2020. Nos últimos anos verificamos esse movimento pelo Reino Unido, Itália, França, Turquia e Indonésia e Áustria.

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JOTA

Fisco tem envidado esforços para atribuir também a esse intermediário digital o ônus da fiscalização

Breves comentários sobre tributação, marketplace e economia compartilhada

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