Opinião e Análise

Danielle Eugenne Migoto Ferrari Fratini

Juliana Furtado Costa Araujo

Não é novidade que o Código de Processo Civil de 2015 prestigiou a cooperação como forma de se buscar solucionar os conflitos de interesses entre as partes, seja por autocomposição, no qual as próprias partes acordam com relação à controvérsia, seja por heterocomposição, que permite que terceiros estranhos ao Poder Judiciário possam proferir decisão sobre a questão conflituosa.
Para além dessas formas de composição das partes, o novo diploma trouxe expressamente o NJP como mecanismo de solução de conflitos, não no sentido de pôr fim ao litígio em si, mas como ferramenta para seu atingimento, em substituição ao tradicional embate entre as partes em questões procedimentais, permitindo-lhes, mediante consenso, alterar regras predeterminadas no código processual, e trazendo, em consequência, maior efetividade ao processo judicial.
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Em que pese a alegação de que o próprio Código de Processo Civil anterior estabelecesse formas típicas de negócio jurídico processual, quais sejam, aquelas já contempladas expressamente no decorrer de todo o texto, e de o próprio CPC de 2015 prever a calendarização no artigo 191<a href="#_ftn1" name="_ftnref1">[1]</a>, também como negócio jurídico processual típico, o novo Código foi além ao admitir, genericamente, a realização de NJP.
A previsão do artigo 190<a href="#_ftn2" name="_ftnref2">[2]</a> “autorizou” às partes convencionarem sobre o procedimento de maneira que melhor lhes atenda, sem trazer qualquer limitação quanto às hipóteses ou quanto às partes elegíveis, ressalvando, tão somente, a necessidade de a lide se referir a direitos que admitam autocomposição.
A permissão foi tão genérica que acabou por suscitar dúvidas: inicialmente sobre a possibilidade de as Fazendas Públicas aderirem ao instituto, e após superada a dúvida, sobre a necessidade de sua regulamentação para aplicação pelos entes públicos.
Após a inicial “omissão”, a Procuradoria da Fazenda Nacional inaugurou o processo de regulamentação do instituto com a Portaria PGFN 33/2018, autorizando o Procurador a celebrar NJP com a finalidade de “recuperar os débitos em prazo razoável”, utilizando-se de critério exclusivamente teleológico e de maneira aberta.
Embora somente essa autorização já fosse suficiente para admitir a convenção entre a Fazenda Pública e os contribuintes, a Procuradoria da Fazenda Nacional foi além, regulamentando as modalidades de negócios jurídicos processuais através das Portarias PGFN 360/2018, complementada pela 515/2018, com a apresentação de seis modalidades de celebração, e logo após, com a edição da Portaria da PGFN 742/2018, prevendo outras quatro formas de equacionamento.
Em São Paulo, a Procuradoria Geral do Estado editou a Portaria SubG-CTF nº, 14, em 24 de julho último, prevendo dez modalidades de celebração de negócio jurídico processual, algumas similares ao modelo federal. O modelo estadual, em uma só portaria, autorizou a celebração e previu sobre o que poderia versar os negócios jurídicos processuais nesse âmbito.
Questiona-se se a reiterada produção de portarias da esfera federal, ou se mesmo a única portaria editada no âmbito paulista trazendo variadas modalidades ou hipóteses para os negócios jurídicos processuais não seriam um traço de que os róis sejam exaustivos, a depender, portanto, de tantas regulamentações fossem necessárias para admitir as diversas possibilidades de celebração.
Com efeito, dada a especificidade das hipóteses previstas nas mencionadas portarias, sobretudo na estadual, sobraria muito pouco espaço de interpretação para que o Procurador e o contribuinte pudessem encontrar maior liberdade para celebrar negócios que não se encaixariam especificamente nos incisos previstos, a depender, portanto de novas previsões.
No caso de se concluir pela taxatividade, diversas novas e impensáveis convenções ficariam de fora da permissão, o que não se coaduna com o espírito conciliador e de busca de efetividade inaugurado pelo Código de Processo Civil de 2015.
Para além desses princípios norteadores, não parece, também, que o legislador quisesse restringir a generalidade do instituto no artigo 190, como já dito anteriormente. Em rigor, há diversas possibilidades que sequer ainda foram pensadas para a celebração de negócios jurídicos processuais, mesmo porque seria impossível aos operadores do direito preverem as inúmeras variantes que podem interferir nos negócios dos contribuintes.
A simples previsão de hipóteses mais genéricas eleva o campo de atuação do Procurador – preocupação já exposta na portaria estadual paulista – e possibilita que melhores ajustes procedimentais sejam realizados pelas partes sem a necessidade de tantas outras previsões, afastando a discussão acerca da taxatividade ou não das portarias.
Para além disso, a combinação de duas ou mais opções pode ser utilizada conjuntamente, ganhando-se em eficiência, aí inseridos melhor custo e efetividade do processo judicial, como forma de se chegar a um melhor resultado para o equacionamento da dívida tributária.
A necessária regulamentação da previsão processual civil, a fim de que se atenda aos princípios da legalidade e da impessoalidade, que sempre devem pautar a atuação do agente público, não se mostra conflitante com uma normatização de maior amplitude interpretativa, com vistas a dar máxima efetividade ao dispositivo e, por consequência, viabilizar integral aplicabilidade prática ao instituto.
<hr />
<a href="#_ftnref1" name="_ftn1">[1]</a> O artigo 191 do CPC estabelece a regra segundo a qual os litisconsortes com procuradores distintos terão prazo em dobro para a prática dos atos processuais, devido à dificuldade para os advogados das partes acessarem os autos ao mesmo tempo.
<a href="#_ftnref2" name="_ftn2">[2]</a> Art. 190. Versando o processo sobre direitos que admitam autocomposição, é lícito às partes plenamente capazes estipular mudanças no procedimento para ajustá-lo às especificidades da causa e convencionar sobre os seus ônus, poderes, faculdades e deveres processuais, antes ou durante o processo.

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Código de Processo Civil de 2015 prestigiou a cooperação como forma de solucionar os conflitos de interesses

As regulamentações das hipóteses de negócios jurídicos processuais

Código de Processo Civil de 2015 prestigiou a cooperação como forma de solucionar os conflitos de interesses