Opinião e Análise

Roberta Gomes Azevedo

O recurso de apelação tem, em regra, efeito suspensivo. Algumas exceções, entretanto, estão previstas no §1º do art. 1.012 do <a href="http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm">Código de Processo Civil (CPC)</a>, entre elas a apelação interposta contra a sentença que julga improcedentes os embargos à execução, inclusive a fiscal. Deveria essa exceção ser aplicada também às apelações em ações anulatórias de débito fiscal julgadas improcedentes, considerando serem ambas as ações — embargos e anulatória — instrumentos que questionam a exigibilidade do crédito tributário? Essa é a pergunta que buscaremos responder nesse artigo.
A investigação a que nos propomos é importante, entre outras razões, porque, das consequências derivadas da ausência de efeito suspensivo para a apelação, sabe-se, está a possibilidade de prosseguimento da execução fiscal, inclusive com alienação de bens penhorados e a liquidação de seguro ou fiança, ressalvada a conversão em renda antes do trânsito em julgado. A depender da resposta à questão posta, pelo que se vê, podemos defender  o prosseguimento da execução fiscal após sentença de improcedência na anulatória, caso exista garantia na execução. E o mesmo valeria para os casos de “execução passiva”, aqueles em que a garantia é prestada na anulatória.
Talvez esses pontos ainda não tenham sido objeto de intensos debates porque o oferecimento de garantia em anulatória, à exceção dos depósitos, só se tornou corriqueiro após o advento do CPC de 2015 e a consequente extinção das ações cautelares autônomas — instrumento processual no passado comumente usado para o oferecimento de garantia e que foi referendado pelo <a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/stj">Superior Tribunal de Justiça (STJ)</a> no julgamento do Tema Repetitivo nº 237 (<a href="https://processo.stj.jus.br/processo/pesquisa/?tipoPesquisa=tipoPesquisaNumeroRegistro&amp;termo=200900279896&amp;totalRegistrosPorPagina=40&amp;aplicacao=processos.ea">REsp 1.123.669/RS</a>). Merecem atenção, entretanto, tendo em vista, além da identidade de escopo, as novas regras de conexão introduzidas pelo CPC, os requisitos legais para a suspensão da execução em decorrência da apresentação de impugnação do crédito tributário, a isonomia processual, bem como o entendimento jurisprudencial em torno da matéria. Voltemo-nos à busca pela resposta à questão que propomos.
Nos embargos à execução fiscal, cuja admissão depende de garantia (art. 16, §1º, da <a href="http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l6830.htm">LEF</a>), cabe ao executado alegar toda matéria útil à sua defesa, requerer provas e juntar documentos. Nessa ação, o executado irá se opor à cobrança do crédito objeto da execução, podendo aduzir para isso fundamentos jurídicos e legais diversos.
A anulatória, a seu turno, tem em essência o mesmo propósito dos embargos, ou seja, impugnar a cobrança do crédito tributário. Não há para essa ação, porém, qualquer limitação específica quanto ao que pode ser alegado pelo contribuinte. Além disso, sua admissibilidade independe de apresentação de garantia.
Essas duas ações de conhecimento, quando relacionadas ao mesmo crédito, possuem a mesma causa de pedir remota e, em regra, as mesmas partes. Por isso mesmo que, se baseadas nos mesmos fundamentos jurídicos e veicularem pedidos iguais, devem ser consideradas idênticas, o que conduzirá à extinção daquela ajuizada por último em razão da litispendência. Lado outro, ainda que os fundamentos jurídicos que as embasam e os pedidos sejam distintos, haverá necessariamente conexão, à medida  que compartilham as demandas a mesma causa de pedir remota.
Indo além, nos termos do art. 55, §2º, inciso I, do CPC, devemos reconhecer a figura (da conexão) também entre a anulatória e a execução fiscal que se refiram ao mesmo crédito — conclusão que se se saca visto que a relação jurídica de direito material que oficia como causa de pedir remota da anulatória é a mesma que fundamenta a execução.
Seguida essa linha, tais ações, por serem conexas, devem ser em princípio reunidas para decisão conjunta, conforme disciplina o §1º do art. 55 do CPC, salvo se proferida sentença em uma delas ou se, sendo a anulatória precedente, tramitarem em juízos distintos, sendo um deles absolutamente competente para julgar a execução em razão de norma de organização judiciária.
Nesses casos em que há conexão entre a anulatória e a execução fiscal e daquela com os embargos, é admissível que se suspenda o processo executivo quando for oferecida e aceita garantia da satisfação do crédito e demonstrado fumus boni iuris e  periculum in mora.
A suspensão da execução fiscal em razão do oferecimento dos embargos é possível, contanto que seja apresentada garantia integral e verificados pelo juiz a relevância da fundamentação (fumus boni juris) e o perigo de dano irreparável ou de difícil reparação (periculum in mora), conforme entendimento firmado pelo STJ no julgamento do <a href="https://processo.stj.jus.br/processo/pesquisa/?tipoPesquisa=tipoPesquisaNumeroRegistro&amp;termo=201101962316&amp;totalRegistrosPorPagina=40&amp;aplicacao=processos.ea">REsp 1.272.827/PE</a>.
Em razão da comunhão de propósitos que enlaça anulatória e embargos, bem como da conexão sempre existente entre essas ações quando concernentes ao mesmo crédito, tem-se autorizado a suspensão da execução quando do ajuizamento da anulatória, desde que cumpridos os mesmos requisitos exigidos para a atribuição de efeito suspensivo aos embargos<a href="#_ftn1" name="_ftnref1">[1]</a>.
Assim, muito embora possa a anulatória ser ajuizada independentemente do oferecimento de qualquer garantia, verifica-se, cada mais amiúde, sobretudo após o CPC de 2015, o ajuizamento dessas ações acompanhado do oferecimento de garantia nos próprios autos, para que os contribuintes possam se valer dos efeitos legais da garantia, como a suspensão antes tratada e a impossibilidade de que o débito garantido seja óbice à expedição de certidão positiva com efeitos de negativa ou implique inscrição no <a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/cadin">Cadin</a>.
Da sentença de procedência proferida na anulatória decorrerá a inexigibilidade do crédito tributário. Esse mesmo efeito advirá da sentença de procedência nos embargos, caso a parte tenha deduzido argumentos voltados à inexigibilidade do crédito tributário.
Por outro lado, a sentença de improcedência proferida nos embargos reforça a presunção de certeza e liquidez da dívida inscrita e implica a “plena retomada da presunção de legitimidade que recobria a obrigação exequenda, cassando a eficácia suspensiva relativamente à execução fiscal, feito que retoma seu fluxo, portanto”<a href="#_ftn2" name="_ftnref2">[2]</a>.
A apelação interposta contra essa sentença, conforme já adiantado de início, excepcionando a regra geral de suspensividade, terá efeito apenas devolutivo, significando isso que poderá prosseguir a execução após a prolação da sentença, inclusive no que tange aos atos de expropriação.
Não obstante as apelações contra sentença de improcedência nas demais ações de conhecimento tenham, em regra, efeito suspensivo, é de se entender pela aplicação do mesmo racional à apelação em anulatória julgada improcedente, permitindo-se o prosseguimento da execução fiscal ou o alavancamento da “execução passiva”, com todas as medidas que sejam viáveis, como a liquidação da garantia nos próprios autos da anulatória, seja porque a sentença de improcedência ali proferida reforça a presunção de legitimidade do lançamento, seja porque não se pode dar tratamento distinto a situações iguais.
<hr />
<a href="#_ftnref1" name="_ftn1">[1]</a> AgRg no REsp n. 1.472.806/SP, relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, julgado em 29/4/2019, DJe de 8/5/2019.
<a href="#_ftnref2" name="_ftn2">[2]</a> CONRADO, Paulo Cesar. Execução Fiscal. 5ª ed. rev. e ampl. São Paulo: Noeses, 2021, p. 261.

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JOTA

Das consequências da ausência de efeito suspensivo está a possibilidade de prosseguimento da execução fiscal

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