Opinião e Análise

Felipe Recondo

O Supremo completa 130 anos de história republicana no próximo domingo, dia 28 de fevereiro. Nesse dia, em 1891, o tribunal realizou sua primeira sessão sob o novo regime. E esta primeira sessão, assim como a nomeação dos primeiros integrantes da Corte, foi marcada por algumas disputas, debates e desavenças.
A organização do STF tinha como base o decreto 848, de 11/10/1890, editado pelo governo provisório da República. No seu artigo 5º, o texto estabelecia:
Art. 5º O Supremo Tribunal Federal terá a sua séde na capital da Republica e compor-se-ha de quinze juizes, que poderão ser tirados dentre os juizes seccionaes ou dentre os cidadãos de notavel saber e reputação, que possuam as condições de elegibilidade para o Senado.
Paragrapho unico. Os parentes consanguineos ou affins, na linha ascendente e descendente e na collateral até ao segundo gráo, não podem ao mesmo tempo ser membros do Supremo Tribunal Federal.
<img src="https://www.jota.info/wp-content/uploads/2021/01/jota-pro-poder.jpg" />
Foi Constituição de 1891, promulgada em 24 de fevereiro de 1891, que instituiu o Supremo nos artigos 55 e 56.
Art. 55. O Poder Judiciario da União terá por orgãos um Supremo Tribunal Federal, com séde na Capital da Republica, e tantos juizes e tribunaes federaes, distribuidos pelo paiz, quantos o Congresso crear.
Art. 56. O Supremo Tribunal Federal compor-se-ha de quinze juizes, nomeados na fórma do art. 48, n. 12, dentre os cidadãos de notavel saber e reputação, elegiveis para o Senado.
E a primeira composição do STF era herdada do regime anterior. Os ministros que compunham o Supremo Tribunal de Justiça no período imperial foram aproveitados pelo Supremo Tribunal Federal da República. O que provocaria alguns problemas no seu início de funcionamento.
Até o último dia do tribunal no império, o tribunal era presidido pelo Visconde de Sabará, o Conselheiro José Evangelista Negreiros Saião de Lobato. Ele foi nomeado presidente em 1886 pelo Imperador, conforme previa a lei de 1828. Foi reconduzido em 1889. Com a queda do Império, o STJ da época continuou funcionando normalmente, mesmo sob o novo regime, até que viesse a nova regulamentação.
O tribunal tinha suas sessões às quartas e sábados de 10h30 até 14h30. E funcionava na esquina da rua do Lavradio com a Relação, no Rio de Janeiro. Como descreveu Leda Boechat em um dos volumes de sua obra sobre a história do STF, o prédio “primava pela pobreza e pelo desconforto”. Nos primeiros meses, o Supremo foi regido pelo antigo regimento interno do tribunal já extinto. Em 8 de agosto de 1891, os ministros aprovaram um novo regimento.
As nomeações dos primeiros integrantes do STF provocaram longos debates no Senado, que só foi reaberto em junho de 1891. Mesmo depois de já instalado o Supremo e de já estarem trabalhando normalmente os seus integrantes, os parlamentares discutiam se os nomes indicados deveriam ou não ser submetidos à votação da Casa, como previa a Constituição no seu artigo 48.
Decidiu o plenário do Senado que o presidente deveria encaminhar os nomes escolhidos para aprovação do Legislativo. E a Comissão de Justiça deu parecer favorável a aprovação de todos os indicados, menos de dois: Barão de Lucena e Tristão de Alencar Araripe. O parecer da comissão dizia que “por circunstâncias e fatos notórios a comissão deixava de reconhecer a precisa idoneidade para o desempenho imparcial e justo dos grandes deveres e atribuições que lhes adviriam de tão elevado encargo”.
Ambos eram integrantes do governo e sofriam críticas por abusar de suas posições e da confiança do presidente, “violando acintosa e caprichosamente muitas disposições da Constituição”, nas palavras de Amaro Cavalcanti, senador que depois viria a ser ministro do STF.
Os nomes, entretanto, foram todos aprovados a despeito dessas críticas.
Na escolha do presidente do novo STF houve divergências e a insatisfação notória de quem foi preterido pelos pares. Saião Lobato intentava continuar presidindo o tribunal. Mas seus pares escolheram outro nome. Um nome que tinha a simpatia do novo governo.
Rodrigo Octavio de Langgaard Meneses deixou, num dos volumes de suas memórias, uma descrição detalhada daquilo a que assistiu. “O governo desejou que, em ver de Saião Lobato, fosse o sr Freitas Henriques o presidente do Supremo Tribunal, por circunstâncias, aliás, antes de natureza afetiva do que política”, ele escreveu. Freitas Henriques era amigo de Deodoro da Fonseca e do Barão de Lucena, ministro de estado que dirigia a política do governo.
“Assumindo a presidência do novo tribunal e abrindo a sessão [Saião Lobato], já era manifesto o seu mau humor. Empossados os demais ministros e instalado assim o novo tribunal, dever-se-ia proceder à eleição do presidente, e justamente ao Visconde [de Sabará], como o de mais idade, cabia a presidência. Recolhidas e contadas as cédulas, começou o Visconde a apurá-las”.
“Abriu a primeira e leu: Freitas Henriques”.
“Tomou da segunda, já com a mão tremente, abriu e leu de novo: Freitas Henriques”.
“Da terceira vez, já quase não pôde pronunciar o nome que lera na cédula, e, daí em diante, num acesso crescente de raiva, com os dentes cerrados, ia abrindo as cédulas e pronunciando uns nos roucos, cada vez menos inteligíveis, até que, chegando à última, nada mais pôde dizer, levantando-se e deixando a cadeira, apoplético e furioso”.
Apesar de não ter sido proclamado o resultado, Freitas Henriques assume os trabalhos da sessão e declarou que, em vista do resultado das eleições, assumia a Presidência do tribunal.
O aniversário de 130 anos do Supremo será lembrado pelo presidente Luiz Fux na sessão desta quinta-feira. O tribunal também publicará um site especial com declarações, dados históricos e fotos do STF ao longo deste período. Também divulgada a identidade visual dos 130 anos e o slogan “Celebrar a história para concretizar o futuro"  para marcar a data comemorativa.
*A coluna ExCelso é um espaço para lembrarmos e discutirmos a história do Supremo Tribunal Federal por meio de imagens, documentos, entrevistas, livros. A coluna é publicada semanalmente e traz em seu nome uma referência ao ex-ministro Celso de Mello, que atuou como a memória do tribunal durante seus anos como decano. Quem assistia às sessões se acostumou às suas referências que, não raro, iam até o Império e às Ordenações Filipinas, do século XVI.

bancoImagemBibliotecaPastaSTF_AP_168468

https://images.jota.info/wp-content/uploads/2021/09/copy-of-jota-logo-high-cmyk.jpeg

JOTA

Data deve ser lembrada na sessão desta quinta (25) pelo presidente Luiz Fux

ExCelso: Os 130 anos do Supremo Tribunal Federal

Data deve ser lembrada na sessão desta quinta (25) pelo presidente Luiz Fux