Opinião e Análise

André de Castro O. P. Braga

“A Eletrobras deseja sonegar do Brasil essas informações e quer utilizar o TCU como cúmplice desse seu desejo”. A afirmação é do Ministro do TCU Bruno Dantas, em julgamento recente. As informações em questão são os relatórios de investigação independente conduzida por escritório de advocacia norte-americano, contratado pela estatal para apurar ilícitos nas obras de Angra 3.
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Para entender essa história é preciso voltar a 2017. Naquele ano, o TCU determinou que a Eletrobras lhe enviasse todos os relatórios produzidos pelo escritório durante a investigação (Acórdão 1.348/2017-P). Segundo Dantas, relator do caso, as informações lá presentes (entrevistas com empregados, mensagens eletrônicas etc.) poderiam ser úteis na identificação e responsabilização, pelo TCU, dos agentes públicos envolvidos nas irregularidades.
A Eletrobras encaminhou os relatórios, solicitando que o TCU os classificasse como sigilosos, acessíveis somente por servidores do tribunal e representantes da estatal. Torná-los públicos àquela altura poderia prejudicá-la em processo movido por acionistas minoritários nos EUA. O TCU concordou.
Com o fim do processo nos EUA, Dantas decidiu levantar o sigilo. A Eletrobras recorreu, alegando, entre outras coisas, que os documentos possuíam informações pessoais de empregados e dados sensíveis sobre empresas privadas. Em outubro deste ano, o Plenário entendeu que as razões fornecidas pela Eletrobras eram insuficientes (Acórdão 2.458/2019-P).
O julgado é importante. Revela que o TCU pode revisar a classificação de sigilo de qualquer documento produzido ou custodiado pela administração pública. Nas palavras de Dantas, caberia ao TCU “zelar pela cláusula constitucional da publicidade”. É entendimento que parece colidir com o § 2º do art. 85 da Lei 13.303, segundo o qual o grau de confidencialidade de documentos encaminhados ao TCU deve ser atribuído pela estatal fiscalizada.
O julgado também nos faz refletir sobre a real utilidade de investigações independentes em estatais.
Nos EUA, de onde importamos essa prática, a regra é o sigilo do resultado das investigações. Se quiser atenuar penalidade, a empresa deve compartilhar com a autoridade pública as informações coletadas. Em certas situações, a empresa possui, sim, o dever de reportar ilícito (casos de lavagem de dinheiro, por exemplo), mas não existe obrigação de encaminhar, a órgão com poder sancionador, todas as conclusões e documentos de uma investigação independente. Muito menos a obrigação de torná-los disponíveis ao público em geral.
Obviamente, no Brasil, em estatais, o contexto é diferente. Os recursos são públicos, o que atrai a incidência do princípio da publicidade e da Lei de Acesso à Informação. E existe regra constitucional que obriga os órgãos de controle interno de estatais a dar ciência ao TCU de qualquer ilegalidade. Tudo isso é verdade. Mas é possível que a abordagem do TCU descrita aqui desincentive o uso da investigação independente pelas estatais, transformando-a em algo semelhante a uma sindicância tradicional. Ou numa espécie de terceirização do controle exercido pelo TCU.

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TCU e as investigações independentes em estatais

Não vai ter sigilo