Opinião e Análise

Mariana Vilella

<p>A jurisdição do TCU é ampla e, como regra, segue a trajetória dos recursos públicos federais. Partindo da premissa de que o Brasil é uma federação e de que há Tribunais de Contas estaduais e municipais, uma dúvida que tem permeado as pesquisas do Observatório do TCU é: como o tribunal controla transferências voluntárias de recursos da União a outros entes federativos? O caso da execução de despesas municipais com educação pode ser elucidativo.</p>
<p>Nesse campo, o TCU faz interpretação abrangente do conceito de “transferências voluntárias”. O Acórdão 2368/2013-P considerou como voluntárias as transferências da União em programas instituídos por leis federais, como o Programa Nacional de Apoio ao Transporte do Escolar (PNATE) ou o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE). São repasses que, por sua previsão legal, usualmente seriam considerados de natureza obrigatória, mas que mudaram de classificação no entendimento da Corte de Contas. O objetivo parece ser legitimar o controle direto pelo TCU, já que, na transferência voluntária, o tribunal entende que há mera delegação da execução de recursos federais.</p>
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<p>No <a href="https://pesquisa.apps.tcu.gov.br/#/documento/acordao-completo/3.061%252F2019/%2520/DTRELEVANCIA%2520desc%252C%2520NUMACORDAOINT%2520desc/0/%2520?uuid=56ebf210-3d46-11ea-9d6d-2d70a706d126">Acórdão 3.061/2019</a>-P, a ministra Ana Arraes ponderou que a simples existência de previsão legal não caracterizaria a transferência como obrigatória. O fator determinante para diferenciar a transferência obrigatória da transferência voluntária seria a imposição de exigências para a realização do repasse. No caso de recursos descentralizados pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), por atender a esse fator, deveriam ser classificados como transferências voluntárias. Com isso, o TCU parece ter procurado centralizar o controle da execução de despesas de educação pelos municípios.</p>
<p>Os acórdãos 18066/2021 e 18114/2021, ambos da 2ª Câmara do TCU, podem corroborar essa hipótese.</p>
<p>No primeiro caso, uma Tomada de Contas Especial (TCE) foi instaurada pelo FNDE contra um ex-prefeito de Olinda (PE) pela não aprovação da prestação de contas do PNAE, em 2014.</p>
<p>O processo foi motivado por dúvidas quanto à aquisição de produtos para merenda. O relatório destaca a análise empreendida pela Secex/TCE sobre a quantidade de milho de munguzá, fubá e fígado bovino adquiridos para as refeições escolares no município. Ao final, a defesa foi parcialmente acolhida, mencionado no acórdão o princípio da proporcionalidade e a desnecessidade de mover a máquina administrativa para o débito em questão.</p>
<p>O segundo acórdão trata de processo contra um ex-prefeito de Brejo (MA) instaurado para apurar as contas municipais no Programa Nacional de Inclusão de Jovens, de 2014. O TCU considerou que não houve comprovação da correta aplicação de parte da verba repassada, e o ex-prefeito teve suas contas julgadas irregulares, com condenação ao pagamento do débito e multa. Teria havido inconsistências em comprovantes e extratos bancários nas compras de alimentos, material de consumo escolar e capacitação de professores pelo município.</p>
<p>Os exemplos nos levam a perguntar com qual grau de detalhamento o TCU controla despesas em âmbito municipal. De um lado, como se trata de políticas nacionais e com recursos da União, parece fazer sentido a aferição centralizada do cumprimento dos objetivos da política. De outro lado, causa estranhamento o TCU, pelo simples fato de ter jurisdição ampla, se transformar em tribunal de contas nacional, julgando, no varejo, a aplicação de recursos federais por cada ordenador de despesa Brasil afora.</p>
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Fachada da sede do TCU, em Brasília

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JOTA

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