Opinião e Análise

André de Castro O. P. Braga

No ano passado, o Tribunal de Contas da União (TCU) bateu recorde no campo da responsabilização de agentes públicos, ao impor condenações num valor total de R$ 8,6 bilhões, entre multas e imputações de débito. É um número quase quatro vezes maior do que o verificado dez anos atrás (R$ 2,3 bilhões em 2011, em valores corrigidos).
Em 2021, teremos novo recorde. Apenas no primeiro semestre deste ano, o TCU chegou a R$ 8,7 bilhões em condenações, ultrapassando o valor do ano passado inteiro.
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De uma perspectiva quantitativa, os números retratam um órgão de controle em expansão. Mas o que eles dizem sobre a qualidade da atuação do TCU? As decisões do tribunal inibem novas ilegalidades ou novos erros na administração pública? Quais os efeitos dissuasórios de todas essas condenações?
Por um lado, parece razoável afirmar que o risco de ser punido pelo TCU é, hoje, uma variável bastante presente nos processos decisórios do setor público. Para ficar em um único exemplo: no mês passado, integrantes do Ministério da Economia pediram demissão porque, entre outros motivos, não queriam ser alvo do TCU por irregularidades na revisão do teto de gastos.
Casos como esse refletem o espírito de um tempo e projetam, no imaginário público, o TCU como um órgão que exerce sua função com considerável independência e expertise, capaz inclusive de desagradar altas autoridades do governo federal. O risco de punição pelo TCU tende, sim, a ser levado a sério e a moldar comportamentos.
Por outro lado, os dados geram dúvidas. Se eventual punição do TCU é uma variável que costuma ser considerada, por que, ano após ano, continuamos vendo quantidade significativa de gestores condenados?
Várias são as hipóteses. Uma delas: agentes públicos não aprendem com seus erros ou são desonestos. Nesse contexto, o poder dissuasório do TCU não ganharia tração. Trata-se de hipótese plausível para análise de casos pontuais; pouco provável para explicação do comportamento de agentes públicos em geral.
Outra hipótese: os instrumentos de responsabilização à disposição do TCU são insuficientes. Também soa frágil. Em 2011, por exemplo, cada pessoa condenada pelo TCU em processos de contas ficou obrigada a pagar, em média, um valor de R$ 890 mil. Desde então, esse valor vem aumentando. Há, ainda, inabilitações, bloqueios de bens e declarações de inidoneidade. É um bom arsenal.
Terceira hipótese, mais razoável: embora enxergue e receie o risco de punição, boa parte dos gestores públicos tem dificuldade em identificar a conduta que o TCU espera deles, sobretudo naquelas situações em que as normas aplicáveis são vagas ou ambíguas. Por sua vez, o TCU não consegue, por meio de sua jurisprudência, demarcar com precisão os limites desse espaço de discricionariedade do gestor, por inúmeros motivos (ausência de amplo poder normativo; limitações operacionais para julgar uma quantidade brutal de processos; vagueza e complexidade da legislação; inércia do Judiciário na fixação de testes de deferência, entre outros).
Nesse cenário de incertezas, gestores e entes públicos não conseguem se planejar para obedecer os parâmetros de legalidade e economicidade que serão usados pelo TCU em fiscalizações futuras. Como consequência, gestores serão punidos ainda que estivessem dispostos, na origem, a seguir as orientações do TCU, quaisquer que elas fossem.
Tudo isso não significa que a atuação do TCU não possua o poder de inibir ilícitos futuros. Significa apenas que esse poder é menor do que poderia ser e, muitas vezes, aponta para o vazio.

Fachada da sede do TCU, em Brasília

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JOTA

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