Opinião e Análise

Marcus Abraham

Proveniente do PLP 93/2023, a recém-saída do forno <a href="https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lcp/Lcp200.htm">Lei Complementar 200</a>, de 30 de agosto de 2023, ficou conhecida como novo <a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/arcabouco-fiscal">arcabouço fiscal</a>, tendo sido editada para substituir o regime de <a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/teto-de-gastos">teto de gastos</a> criado pela Emenda Constitucional 95/2016. Infelizmente, os efeitos fiscais pretendidos por essa emenda constitucional não foram alcançados, além de ter sido objeto de críticas quanto à sua abrangência e excessiva rigidez, inclusive por restringir o real crescimento dos gastos com direitos fundamentais e sociais.
Enquanto o teto de gastos limitava o crescimento das despesas anuais do governo federal apenas com base no índice oficial de variação da inflação do ano anterior (não havendo crescimento real das despesas públicas), as regras do novo arcabouço fiscal estabelecem que as despesas podem crescer acima da inflação, desde que haja efetivo aumento na arrecadação, sendo que o seu montante deverá estar sempre abaixo do valor de receitas efetivamente recebidas, garantindo um resultado fiscal anual positivo (superávit fiscal), necessário para obter a almejada sustentabilidade financeira e, consequentemente, reduzir paulatinamente o montante da dívida pública.  
Sua origem normativa está no texto do artigo 6º da EC 126/2023, o qual dispõe que “o Presidente da República deverá encaminhar ao Congresso Nacional, até 31 de agosto de 2023, projeto de lei complementar com o objetivo de instituir regime fiscal sustentável para garantir a estabilidade macroeconômica do País e criar as condições adequadas ao crescimento socioeconômico, inclusive quanto à regra estabelecida no <a href="https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/Constituicao.htm#art167iii">inciso III do caput do art. 167</a> da <a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/constituicao-federal">Constituição Federal</a>”.
A exposição de motivos do referido projeto de lei consignava que:
<blockquote class="jota-article__quote jota-article__citation">"Propõe-se um novo regime fiscal que garante a sustentabilidade fiscal de médio e longo prazo (despesas crescendo menos que a receita), mas com flexibilidade para se adequar a diferentes ciclos econômicos e políticos e voltada à indução de condutas, buscando absorver o que há de fronteira nas discussões sobre regras fiscais no mundo".</blockquote>
Adicionalmente, o PLP atendeu ao comando expresso no artigo 163, VIII da Constituição, que determinava que uma lei complementar dispusesse sobre o então novo princípio financeiro-orçamentário, incluído pela Emenda Constitucional 109/2021 – a sustentabilidade da dívida, devendo especificar: a) indicadores de sua apuração; b) níveis de compatibilidade dos resultados fiscais com a trajetória da dívida; c) trajetória de convergência do montante da dívida com os limites definidos em legislação; d) medidas de ajuste, suspensões e vedações; e) planejamento de alienação de ativos com vistas à redução do montante da dívida.
A LC 200/2023 inicia o texto esclarecendo o seu objeto: aplica-se às receitas primárias e às despesas primárias dos orçamentos fiscal e da seguridade social da União, ou seja, não se aplicando às receitas e despesas financeiras (por exemplo, juros da dívida pública).
O mesmo artigo 1º traz a observação de que a lei deve ser conjugada com as limitações e condicionantes para a geração de despesas e de desonerações fiscais previstas na Lei de Responsabilidade Fiscal. Portanto, é importante compreender que ambas – LC 101/2000 e LC 200/2023 – devem ser aplicadas conjuntamente, o que, inequivocamente, potencializa o efeito de uma gestão fiscal responsável.
Merece também destaque o comando da nova lei que, além de impor limites ao crescimento da despesa e buscar uma adequada gestão das receitas, estabelece a necessidade de se conduzir a política fiscal com a adoção de medidas preventivas e corretivas para evitar a insustentabilidade intertemporal das contas públicas. Ou seja, afora tratar-se de uma regra que atingirá e influenciará a gestão de vários anos à frente (e governos subsequentes), talvez este seja o primeiro passo para ir ao encontro da almejada equidade intergeracional fiscal.
Para atingir tal objetivo, a fixação de metas fiscais superavitárias é, segundo a LC 200/2023, a chave mestra para se garantir a sustentabilidade financeira. 
Assim, o que a lei intitula como “metas fiscais compatíveis com a sustentabilidade da dívida” encontra previsão no § 1º do seu artigo 2º, ao expressamente esclarecer que se considera compatível com a sustentabilidade da dívida pública o estabelecimento de metas de resultados primários, nos termos das leis de diretrizes orçamentárias, até a estabilização da relação entre a Dívida Bruta do Governo Geral (DBGG) e o Produto Interno Bruto (PIB).
E, na mesma linha do que já era em parte previsto na Constituição (art. 165, <a href="https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm#art165%C2%A72.0">§</a> 2º) e na LRF (art. 4º), a <a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/lei-de-diretrizes-orcamentarias">Lei de Diretrizes Orçamentárias</a> (LDO) deverá anualmente estabelecer as diretrizes de política fiscal e as respectivas metas anuais de resultado primário do governo central, para o exercício a que se referir e para os três seguintes, devendo ser compatíveis com a trajetória sustentável da dívida pública. Por sua vez, a trajetória de convergência do montante da dívida, os indicadores de sua apuração e os níveis de compatibilidade dos resultados fiscais com a sustentabilidade da dívida deverão constar do Anexo de Metas Fiscais da LDO. 
Outro importante mecanismo adotado pela LC 200/2023 é a limitação de despesas por órgão e poder. Neste aspecto, a lei impõe aos Poderes Executivo, Judiciário e Legislativo federais, ao Ministério Público da União e à Defensoria da União, limites individualizados para o montante global das dotações orçamentárias relativas às respectivas despesas primárias, tendo como base as dotações previstas na Lei Orçamentária Anual de 2023 (Lei 14.535/2023), incluindo-se créditos especiais e suplementares vigentes no exercício.
Tais dotações deverão ser corrigidas a cada exercício pela variação acumulada do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), ou de outro índice que vier a substituí-lo, acrescidos da variação real da despesa, calculada conforme a disciplina estabelecida na própria LC nº 200/2023. E este mesmo dispositivo (art. 3º) elencou uma série de despesas que foram excluídas da respectiva base de cálculo.
O ponto central da lei – crescimento real das despesas – está contido no artigo 5º, ao estabelecer que a variação real dos limites de despesa primária será cumulativa e ficará limitada, em relação à variação real da receita primária, nas seguintes proporções: I - 70%, caso a meta de resultado primário apurada no exercício anterior ao da elaboração da lei orçamentária anual tenha sido cumprida; ou II - 50%, caso a meta de resultado primário apurada no exercício anterior ao da elaboração da lei orçamentária anual não tenha sido cumprida. Outrossim, o crescimento real dos limites da despesa primária não será inferior a 0,6% ao ano e nem superior a 2,5% ao ano.
Noutras palavras, as despesas públicas poderão crescer acima da variação oficial da inflação, mas dentro de uma faixa que vai de 0,6% a 2,5% de crescimento real ao ano. Assim, se as contas públicas estiverem dentro da meta fiscal estabelecida, o aumento do montante dos gastos públicos terá um limite de 70% do crescimento das receitas primárias, ao passo que, se o resultado primário ficar abaixo da meta estipulada, o limite para os gastos cai para 50% do crescimento da receita pública.
A grande virtude da LC 200/2023 – a garantia da sustentabilidade fiscal – está justamente em vincular a possibilidade de crescimento das despesas públicas ao incremento das receitas públicas, desde que haja cumprimento das metas fiscais.
Esperemos que desse mais recente esforço do constituinte derivado com a EC 126/2023, conjugado com o do legislador que gestou a LC 200/2023, possam brotar frutos que, sem descuidar dos gastos sociais, afiancem a tão desejada sustentabilidade financeira como um dos pilares para o desenvolvimento nacional.

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JOTA

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