Está na pauta do Grupo Especial da Seção do Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJSP) desta quarta-feira (12/4) um processo envolvendo a disputa bilionária entre a J&F Investimentos e a multinacional Paper Excellence pelo controle da Eldorado Brasil Celulose.
A partir das 10h, nove desembargadores do Grupo especial irão decidir, em um agravo interno, se homologam ou não a desistência de um recurso ajuizado pela Paper Excellence. O julgamento tem o potencial de destravar a transferência da Eldorado Brasil Celulose para a Paper Excellence, mas não deve ser o capítulo final desta batalha jurídica.
Entenda a disputa jurídica entre Paper Excellence e J&F
A J&F Investimentos busca anular no Judiciário uma sentença arbitral favorável à Paper Excellence na disputa sobre o controle acionário da Eldorado Brasil.
O tribunal arbitral, conduzido entre 2020 e 2021 pela Câmara de Comércio Internacional (ICC), deu ganho de causa à Paper Excellence e reconheceu, por 3 votos a 0, o direito da empresa de assumir o controle da Eldorado. Na ocasião, o negócio de R$ 15 bilhões não foi finalizado, já que a J&F não aceitou o resultado e decidiu pedir a anulação da arbitragem na Justiça.
Em julho do ano passado, a juíza Renata Maciel, da 2ª Vara Empresarial e Conflitos de Arbitragem, proferiu sentença que negou o pedido da J&F para anular a arbitragem.
Entre os argumentos para o pedido de anulação da arbitragem está o de quebra do dever de revelação de conflito de um dos árbitros e o de que a J&F teria sido vítima de um ataque hacker perpetrado pela Paper Excellence.
Na ocasião, a juíza considerou que o acesso indevido aos emails corporativos de fato parece ter ocorrido, mas entendeu que não haveria como determinar quem foi o mandante da espionagem, e que isso não teria ligações com a arbitragem.
Depois dessa decisão de mérito, em outubro, o desembargador Franco de Godoi revogou uma decisão anterior que impedia a transferência da Eldorado Celulose para a Paper Excellence. Proferida a “sentença de improcedência da ação, julgamento de cognição plena, resta afastado um dos requisitos para a concessão da tutela antecipada, qual seja o ‘fumus boni iuris’. E mais, a jurisdição de caráter provisório não poderá suplantar aquela de cunho exauriente realizada pela MMa. Juiza ao julgar o mérito da ação”, afirmou na ocasião.
Dias depois, o desembargador José Carlos Costa Netto, do Grupo Especial da Seção do Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJSP), concedeu efeito suspensivo a embargos de declaração em um conflito de competência, que, na prática, travou a transferência da Eldorado Brasil Celulose para a Paper Excellence.
No dia 19 de agosto, por maioria, os desembargadores do Grupo Especial haviam decidido que a competência para processar e julgar a questão é da 1ª Câmara Reservada de Direito Empresarial, integrada por Franco de Godoi. Mas, ao conceder efeito suspensivo ao recurso, Costa Netto considerou que há possibilidade de alteração do julgado e que seria relevante aguardar o julgamento dos embargos de declaração para a tomada de decisões, a fim de evitar riscos de danos de difícil reparação. Os embargos de declaração foram opostos pela Paper Excellence enquanto o efeito suspensivo foi pedido pela J&F.
Em dezembro do ano passado, então, a Paper desistiu dos embargos de declaração que ela mesmo havia apresentado no conflito de competência, mas Costa Netto não oficializou a desistência e pediu que a J&F e a Eldorado se manifestassem sobre a renúncia ao embargo, o que não está previsto no Código de Processo Civil. Logo após, enviou o processo para o Grupo Especial da Seção do Direito Privado, que decidirá a questão nesta quarta-feira (11/4). Alguns dias depois, Costa Netto negou um pedido de revisão da decisão que foi feito pela Paper Excellence.
No mês passado, em apenas uma semana, dois desembargadores tomaram 3 decisões monocráticas divergentes. No dia 20 de março, o desembargador José Benedito Franco de Godoi, da 1ª Câmara Reservada de Direito Empresarial, autorizou a retomada da transferência do controle da Eldorado Brasil para a Paper Excellence.
Dois dias depois, na quarta-feira (22/3), foi a vez do desembargador Costa Netto, do Grupo Especial da Seção do Direito Privado, reafirmar a suspensão da transferência, em detrimento da decisão do colega. Novamente dois depois, na sexta-feira (24/3), Franco de Godoi reiterou sua decisão para que a transferência do controle da empresa fosse retomada. Ele subiu o tom nas críticas a Costa Netto, que, segundo ele, teria tomado decisões que “extrapolaram as regras do processo civil, sem correspondência em nenhuma legislação processual civil de países civilizados”.
Ao determinar mais uma vez a suspensão da transferência da Eldorado Celulose, na quarta-feira (22/3), Costa Netto afirmara que como a homologação da desistência de um recurso pela Paper Excellence foi objeto de um agravo interno, ficou pendente a fixação do entendimento definitivo, pelo Grupo Especial, sobre a pertinência da homologação da desistência e a apreciação de questões de ordem pública. Também escreveu que não é a primeira vez que “são tomadas decisões, por órgãos inferiores ou de mesma hierarquia” “no sentido de desafiar e contrariar as competências legais e regimentais deste órgão”.
“Tais comportamentos são contraprodutivos, por provocarem exatamente o que o conflito de competência visa evitar o proferimento de decisões conflitantes e desconexas , além de atrasarem ainda mais a solução final do conflito de competência, em prejuízo a todos os envolvidos”, escreveu Costa Netto.
Dois dias depois foi a vez de Franco de Godoi rebater e elevar o tom. Segundo ele, Costa Netto se esqueceu que “naquele simples Conflito de Competência a sucessão de atos que extravasaram os limites de sua processual e legal atuação afetaram os alicerces dos fundamentos abraçados pelo Colendo Grupo para dirimir conflitos de competência”.
De acordo com Franco de Godoi, Costa Netto também ignorou que lhe falta a “competência para reanalisar as decisões prolatadas por integrantes de Câmaras Comuns de Direito Privado” e que ele não poderia “arvorar-se em órgão revisor, como fê-lo”. Desta forma, ficaria “esfacelada por todo o processado a conduta” de Costa Netto “faltando-lhe competência para determinar ao Colendo Tribunal Arbitral o não cumprimento de decisões”.
Na ocasião, Franco de Godoi determinou que o Ministério Público fosse oficiado para providências cabíveis, além de encaminhar cópia da decisão para o presidente do TJSP, aos desembargadores do Grupo Especial da Seção de Direito Privado e ao Tribunal Arbitral.