Fabio Graner

Luiza Stievano

<p>A <a href="https://www.jota.info/tributos-e-empresas/https://www.jota.info/tributos-e-empresas/mercado/copom-sacramenta-cenario-majoritario-do-mercado-e-do-governo-apos-indicacao-de-galipolomercado/copom-sacramenta-cenario-majoritario-do-mercado-e-do-governo-apos-indicacao-de-galipolo">volta do ciclo de alta dos juros, com uma elevação de 0,25 ponto porcentual</a> na Taxa Selic pelo Copom na última quarta-feira (18/9), já era esperada e não surpreendeu, segundo Igor Rocha, economista-chefe da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp). Rocha defende que a taxa básica de juros é uma “variável resultado” de diversos fatores e que, mais importante do que a discussão sobre o que deveria acontecer com a Selic, é preciso entender os consensos que contribuem para o país ter uma taxa de juros real tão elevada.</p>
<p>A expectativa de Rocha para o crescimento econômico em 2024 é de 3%. Para 2025, entre 2% e 2,5%. Seus modelos na Fiesp, explica, sempre estiveram acima das projeções de mercado, mas admite que mesmo para quem estava no cenário mais otimista, houve algumas surpresas, em parte explicadas por fatores como o pagamento de precatórios, um fenômeno difícil de quantificar nos modelos. A expansão fiscal decorrente das eleições municipais é outro fator que considera ser difícil captar pelos modelos econômicos e, portanto, também contribui para surpresas no cenário de projeções.</p>
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<p>O economista-chefe da Fiesp ainda chama atenção para um possível novo ciclo de alta no preço de commodities, a partir da metade de 2025, refletindo o processo de corte dos juros nas economias desenvolvidas. Para ele, isso será um novo vetor importante que deve impactar positivamente tanto o crescimento econômico como o ajuste fiscal brasileiro. Esse é um dos fatores que contribuem para Rocha considerar possível o alcance da meta de déficit zero em 2025. Ele também avalia como possível sustentar o arcabouço fiscal até o fim do governo, com algum esforço para conter as despesas obrigatórias. “Eu acho que seria muito bom que tivesse melhor, mas não pactuo com os ‘catastrofistas da política fiscal’ porque eu não vejo ela numa trajetória explosiva”, disse.</p>
<p>Rocha é o sétimo entrevistado da série “cenário macroeconômico”, que o JOTA tem publicado em seu site semanalmente. Confira abaixo os principais pontos da entrevista:</p>
<h3>Taxa Selic: volta do ciclo de alta</h3>
<p>Já estava dado [a subida de 0,25 pp], não acho que surpreendeu. Quando você lê o comunicado, a despeito do 0,25, muitas vezes você precisa ler além do número em si, e o comunicado veio duro. Quando você lê o balanço assimétrico no sentido altista, estão muito claras as preocupações, sobretudo a questão da inflação e desvalorização cambial.</p>
<p>O BC colocou que no primeiro trimestre de 2026 a inflação estará em 3,5%. Eu estava trabalhando com esse ciclo chegando em um teto de 12%. A não ser que você tenha uma apreciação do real ou desvalorização do dólar, ou seja, se esse câmbio ceder, começo a achar difícil entregar esse 3,5% com um teto de 12% de Selic. Se você rodar o modelo, já começa a precisar de mais.</p>
<p>Além desses fatores, um ponto que não é culpa ou tampouco responsabilidade da autoridade monetária, é a definição da meta de 3%. O BC vai responder a essa meta que foi colocada para ele. Se não o fizer, pode ser interpretado de estar conduzindo a política monetária de forma irresponsável. Então imputar as responsabilidades aos competentes das questões que foram decididas e por isso geram os resultados que estamos vendo é importante. Quando foi definida a meta de 3%, a ideia era fazer uma ancoragem das expectativas, trabalhar com um enforcement que o BC estava agindo de forma bastante dura no combate à inflação, mas deixaram de considerar alguns porquês, como uma avaliação do quanto 3% de meta é razoável para países emergentes. É uma meta difícil de ser alcançada, mas mudá-la agora geraria um barulho tamanho que não avalio como razoável neste momento e poderia ser interpretado como incerteza adicional.</p>
<h3>Taxa Selic: o que deveria acontecer</h3>
<p>A gente fica discutindo a Selic, mas no final do dia ela é uma variável resultado. Se você ver o que afeta a economia é a marcação na curva, ou seja, juros ao longo da curva. Quando o mercado financeiro ou privado vai emprestar, um dos balizadores do custo de oportunidade é essa marcação na curva, o prêmio de risco mínimo dele. A Selic, portanto, tem um papel de poder alimentar isso. Trata-se então da habilidade de fazer a coordenação das expectativas. Você pode tanto piorar isso, abrindo mais essa curva e o crédito vai ficar mais caro, como o contrário – se algumas premissas não estão colocadas na curva, dependendo do que você faz com a Selic, você sobe o tatu, colocando-o no toco. A arte de conseguir manejar isso é muito sensível.</p>
<p>Por que o Brasil tem uma taxa de juros real tão alta? Muitos economistas falam que é o fiscal. Eu não tenho dúvida que nosso fiscal não está bom. Claro que há uma questão fiscal, ninguém está negando isso. Outros economistas, mais arrojados, que estudam um pouco mais essa questão estrutural vão levantar outras questões, como insegurança jurídica, insegurança institucional, o fato de a gente ter algum resquício de inércia inflacionária, vão levantar um conjunto de fatores e até mesmo a inflação, que está puxada, na banda superior da meta.</p>
<p>Independentemente dos argumentos, é fato que eles existem, e deveríamos discutir a proporção destes. No Brasil se normalizou colocar a magnitude desses problemas em um patamar que parecem explicar pouco os juros. Eu não acho que temos uma das piores inseguranças jurídicas e fiscais do mundo. Nós temos sim esse problema, mas falar que somos líderes [nesses problemas], não concordo.</p>
<p>Estar com uma inflação na banda superior da meta é o que me parece no momento ser o fator explicativo maior. O que está sendo posto na Selic é uma variável resultado desses consensos que se formaram. Não tem como o BC ir contra o consenso, a não ser que ele atue ao longo da curva de juros.</p>
<p>Muitas vezes escuto o setor produtivo criticar a taxa de juros, mas endossar as razões sem perceber que são vasos comunicantes diretos. Escuto criticarem a taxa de juros, mas achar que o Brasil tem um dos piores fiscais do mundo, tem insegurança jurídica, insegurança institucional, etc. Então, se você acha tudo isso, está aí o resultado. As coisas não são dissociadas. As pessoas precisam resolver o que elas pensam. Não dá para achar que o Brasil está ruim em todos esses quesitos e achar que vamos ter um juros baixo, não tem como. Se os setores acham que existem esses problemas mas não discutem a magnitude deles, não adianta depois vir reclamar da Selic, não dá para você colocar tanto peso nessas variáveis e reclamar dos juros. Quando eu digo problemas, não me refiro ao ponto de vista quantitativos, eu falo do ponto de vista expectacional. Quando você pede e colabora com esse discurso de que o Brasil está com um fiscal horrível, insegurança jurídica horrível, estabilidade institucional horrível, se tudo está horrível, obviamente o Brasil é um país com riscos e vai se cobrar um juros maior para financiá-lo. Todos esses fatores explicativos estão sobrevalorizados. Tenho dificuldade de explicar.</p>
<h3>Banco Central a partir de 2025</h3>
<p>Gabriel Galípolo é uma pessoa extremamente pragmática, sempre foi, o histórico profissional dele mostra isso. Não sei em que momento o mercado achou algo diferente e porquê. Conforme o mercado for notando essa obviedade do pragmatismo, essas tensões e eventuais elementos de risco na curva vão se dissipar. A sinergia que ele tem com os setores da economia, Congresso e Executivo, será muito boa para fazer a harmonização da política monetária, algo fundamental. Muitas vezes a gente fala muito que a política monetária tem que andar junto com o fiscal, mas quando você tem um presidente do BC que se propõe a fazer isso, criticam. Tem que ser uma via de mão dupla, os compromissos fiscais do Executivo e os reflexos da política monetária por parte do BC.</p>
<h3>Política fiscal</h3>
<p>Acho que é possível cumprir a meta de déficit zero em 2025, ainda mais se ele pegar uma melhora no preço de commodities no segundo semestre. Não estou vendo os economistas falarem muito disso e acho que vai ajudar no ajuste fiscal.<br />
Não tenho esse cenário que o arcabouço não vai se sustentar, acho que o governo consegue preservá-lo. O que pode acontecer é eventualmente entrar a discussão da flexibilização das [despesas] obrigatórias o que, na minha opinião, faz todo sentido. Tem lugar que sobra e tem lugar que falta. Não se trata de não ter comprometimento com os setores onde estão vinculadas as obrigatórias, se trata de fazer uma política mais eficiente, mais racional.</p>
<p>Hoje tem uma dificuldade na gestão do orçamento que é o fato dele estar em parte com o Executivo e parte não. Não tem mais aquela facilidade do manejo da política fiscal pela forma como se dá hoje as relações entre Executivo, Congresso etc. Isso por si só já cria uma complexidade maior. Vejo a política fiscal hoje em uma situação desconfortável. Eu acho que seria muito bom que tivesse melhor, mas eu não pactuo com os “catastrofistas da política fiscal” porque eu não vejo ela numa trajetória explosiva.</p>
<h3>Atividade e crescimento econômico</h3>
<p>Eu nunca consegui entender projeção de crescimento abaixo de 1% do mercado. O economista brasileiro pegou uma mania ruim de ficar muito enviesado pela leitura do absoluto. Quando você conversava com o estrangeiro, ele vê o Brasil em termos relativos. Então ele tinha uma clareza para ver o Brasil de forma muito menos apaixonada. Obviamente que em alguns dados há uma dificuldade de projeção de alguns economistas porque eles são seres humanos, e eles estão dentro dessa polarização política no Brasil.</p>
<p>Basta você ver, por exemplo, os fundos multimercados. Em 2023 erraram tudo, bolsa, câmbio, tudo, enquanto os multimercados lá de fora foram bem em termos relativos porque conseguiram olhar a coisa de uma forma mais em termos relativos, muito menos apaixonada e muito mais técnica.</p>
<p>Os modelos que eu lidero na Fiesp sempre estiveram acima das projeções de mercado, mas é um fato que este ano houve surpresas mesmo no cenário mais otimista. Isso foi causado por um conjunto de fatores que são difíceis de quantificar. Consumo, investimento, como os setores estão puxando, isso os modelos dão conta, mas o efeito de precatórios, por exemplo, não. Nós tivemos cerca de R$ 130 bilhões que provocaram um impulso difícil de quantificar o efeito na economia real. A própria variação cambial, ninguém esperava que o câmbio ia chegar onde chegou e isso acaba ajudando a economia brasileira também.</p>
<p>Estávamos com um crescimento de 2,2% e hoje mudamos para 3% com investimento crescendo cerca de 5,1% ou 5,2%. Então é um crescimento que está ocorrendo também com expansão dos investimentos. A tendência é clara, aquecimento do mercado de trabalho, formalização aumentando. Quando você pega medidas do setor industrial que servem inclusive de proxy da atividade econômica, como caminhões, ônibus, isso está muito forte. Caminhões crescendo mais de 30% quando você compara o 1º semestre deste ano com o mesmo período em 2023.</p>
<p>Mas estamos em ano eleitoral e uma das coisas difícil de captar no modelo era exatamente o impacto da expansão fiscal considerando as eleições municipais. O que sempre falei que poderia surpreender: câmbio, precatórios e a questão das eleições municipais, sobre elas você não consegue detalhar e colocar no modelo para entender a real expansão disso. Você pega construção civil crescendo 3,5% no 2º trimestre, isso é muito relevante.</p>
<p>Para 2025, meu cenário é entre 2% e 2,5% de crescimento.</p>
<h3>Ciclo de commodities</h3>
<p>Quando olhamos o ciclo de commodities, elas estão bastante pressionadas. Não está um preço muito bom, então o que está puxando a economia brasileira é a economia doméstica. Tem vetores que têm feito a economia brasileira dinamizar: o mercado doméstico, que está acontecendo agora, mercado de trabalho, poder de compra, etc, massa salarial muito alta e commodities. Este último vetor não está ligado ainda e, com o mundo baixando juros, no final de 2025 e 2026, podemos pegar um ciclo interessante.</p>
<p>A gente vai perder um pouco dessa tração da economia doméstica pelos fatores que se esgotam – a linha branca, por exemplo, está muito bem e as pessoas não trocam de fogão e geladeira todo ano, é um vetor que se esgota. Então o que vai entrar para o jogo e começar a ser interessante será o vetor das commodities, em especial em 2025 e 2026. E esse é um vetor que é muito importante para o Brasil porque ele não só dinamiza crescimento como ajuda no fiscal. Tanto no governo Bolsonaro como no governo Lula, o A e B acham que fizeram ajuste fiscal, na verdade eles não fizeram, foi o preço das commodities que ajudou. Se você olhar nosso superávit primário e o preço de commodities é uma [correlação] brutal, as curvas andam juntas. É muito ruim fazer o manejo da política econômica com essa dependência, mas é o que temos.</p>
<h3>Reforma tributária</h3>
<p>A reforma ajuda, mas infelizmente setores com excessivo poder de lobby prejudicaram sua eficiência. O certo da reforma tributária é [ser] como um condomínio, todo mundo paga e todo mundo paga menos, é simples assim. Alguns setores por razões até então injustificáveis acham que merecem pagar menos e passam a conta para outros. E o Brasil normalizou o sujeito levantar da mesa, passar a conta para o colega e achar que não merece pagar. Isso traz uma ineficiência brutal para a economia brasileira.</p>
<p>Vamos lembrar os dados do Ministério da Fazenda, poderíamos ter uma alíquota de 21%, mantendo Simples e Zona Franca de Manaus (ZFM). A gente está em uma alíquota de talvez 28%, até porque o teto de 26,5% não tem nenhum enforcement, é um desejo. É muito ruim ser o país conhecido como o maior IVA do mundo. E existem os culpados.</p>
<p>Acho que a reforma é melhor e, a despeito desses problemas graves, ela traz transparência e vai mostrar de forma muito clara no Brasil quem são esses privilegiados que o regime cumulativo mascarava. Agora o Brasil vai saber quem o país está subsidiando tributariamente. Do jeito que ela está [texto aprovado na Câmara e em tramitação no Senado], ainda vale a pena para a indústria, sim.<br />
A tônica é igualdade de oportunidade para os setores, deixar todo mundo com as mesmas ferramentas e que performe aquele que for mais eficiente.</p>
<h3>Política industrial</h3>
<p>Acho que os vetores, a ideia, descarbonização, sustentabilidade, transição ecológica, são vetores que acho que o norte está correto. Claro que o diabo sempre mora nos detalhes, mas muitas coisas interessantes estão surgindo. Você tem um plano produção que pode vir a ser um plano safra no futuro. Ou você dá para todos os setores da economia as mesmas ferramentas ou você tira de todo mundo. Me desculpa, mas a indústria não vai mais pagar a conta dos outros, já deu. Você não vai pagar um crédito mais caro porque o outro tem um custo de crédito muito barato subsidiado. Não vai pagar uma alíquota mais cara porque o outro paga uma alíquota mais baixa. Vamos pleitear as mesmas coisas para todo mundo. Esse é um direcionamento claro que temos.</p>
<p>Não queremos que se tire nada de ninguém, mas então você vai dar pra mim também. Temos empresários que atuam em diversos setores, é a mesma pessoa, mesmo empreendedor, com a mesma visão, não é possível que alguns economistas achem que quando ele vai para o setor A ele é um incompetente e quando ele vai para o setor B ele é um gênio. É meramente porque o que ele tem em um, ele não tem no outro. Essas coisas precisam ser postas. A igualdade de oportunidades social, regional e setorial. Tem que parar com essa disfuncionalidade. O plano de “mais produção” é muito bom, o BNDES está tendo uma atuação bastante importante, sobretudo na parte de inovação. Não tem subsídio, exceto a parte de inovação que sempre teve e isso transcende a indústria.</p>
<p>Zona Franca de Manaus não é uma agenda da indústria. Se acabar com a ZFM, os outros estados vão soltar fogos. Você acha que alguém acha legal continuar pagando IPI fora? Isso não é uma bandeira. Mesmo os gastos tributários são para algumas empresas específicas. E se mudar, o setor industrial não vai falar nada por causa de uma empresa A, B ou C. Cria-se esses espantalhos que interdita o debate. A tônica é igualdade de oportunidade para os setores, deixar todo mundo com as mesmas ferramentas e performe aquele que for mais eficiente.</p>


Igor Rocha

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JOTA

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